Voltar a todos os posts

Ninfa e Ramiro, uma vida dedicada à família

17 de Novembro de 2016, por Rosalvo Pinto

(A coluna “causos & cousas” vai apresentar, a partir desta edição, alguns textos referentes a famílias resende-costenses que se migraram da cidade para outras cidades. Aguardem! O primeiro será apresentado pelos parentes do casal Ramiro/Ninfa).

João Bosco Fonseca Lara e Marília das Dores de Resende

Ninfa Lara Resende nasceu na Fazenda da Laje em 1914, filha de Antonino Pinto de Resende e Ana Josefa de Resende. Fez seus estudos iniciais em Santos, junto a seu tio, o Bispo Dom José Maria Parreira Lara, que à época era o titular da Diocese que tinha por sede essa cidade, sendo mais tarde transferido para a Diocese de Caratinga, onde faleceu, em 1936, durante uma viagem de cunho pastoral.    

É oportuno fazer um pequeno parêntesis para apresentar alguns traços pessoais desse ilustre filho da terra:

Dom Lara nasceu em Resende Costa, em 1885, sendo ordenado sacerdote em 1911, sagrado bispo em 1925; até 1934 foi o primeiro Bispo de Santos e depois, a pedido, por questões de saúde, foi transferido para Caratinga.

Em Santos, criou creches para cuidar dos filhos dos operários e empregadas domésticas, bem como internato para meninas até 18 anos e uma escola profissional. Mantinha ambulatório, farmácia e dispensário abertos aos doentes e idosos necessitados. Pela dedicação aos pobres era chamado o “Bispo da Caridade”.

Ninfa foi, posteriormente, aluna interna do Colégio Nossa Senhora das Dores, em São João del-Rei, pertencente às Irmãs de Caridade, discípulas de São Vicente de Paulo, onde cursou o Normal. Antigamente era assim que se chamava o atual Curso de Magistério de Ensino Médio. Não existia a Pedagogia como curso de nível superior. As Professoras formadas no “Nossa Senhora das Dores” ostentavam com muita convicção e devoção o título de Professoras e com ele, a Medalha Milagrosa, de Nossa Senhora das Graças, cunhada em prata.  Representa a Virgem Maria em sua aparição (1830) a Santa Catarina Labouré, na Rue du Bac, em Paris,  durante um período conturbado da história da França.

Enfim, Ninfa Lara foi nomeada para trabalhar em Resende Costa, no Grupo Escolar Assis Resende. Para os tempos de hoje, a viagem a partir de São João del-Rei era aventurosa. Algo que corresponderia a um ecoturismo, digamos, radical. Não havia nem carros super potentes, nem asfalto. Para se avaliar a dificuldade veja-se o que escreveu Dulce Mendes na Revista Comemorativa - 100 anos da cidade/2012. Em síntese, viagem de trem até César de Pina e depois era preciso montar a cavalo... (Não se pode deixar de mencionar o aparecimento, alguns anos depois, da Jardineira, um ônibus que sacolejava durante todo o trajeto de uma estrada empoeirada na seca e com tanta lama na estação das chuvas que era preciso reforçar os pneus com correntes de ferro para vencer as ladeiras sem derrapar. A gasolina tinha um cheiro insuportável e enjoativo! O bagageiro ficava em cima, sobre o teto. Descer as malas no meio da viagem constituía  operação complicada... )

Uma passagem interessante com respeito à chegada da Ninfa à antiga Vila da Laje: fazia parte do comitê de recepção da novel professora, o Ramiro, rapaz muito bonito e elegante, muito alto, com uma grande pinta bem do lado direito da testa. Foi amor à primeira troca de olhares. O casamento aconteceu como consequência natural!

O Ramiro tinha ido a Juiz de Fora procurar um mestre de ofício de alfaiataria, dando continuidade aos ensinamentos recebidos do João Pinto. Por lá se afeiçoou a uns livros de corte e costura em italiano e em espanhol. Tanto se esforçou e se aplicou a seu estudo que se tornou exímio na arte. Veio a ser também mestre na confecção de batina para seminaristas, padres e bispos. Até dom Helvécio, arcebispo de Mariana, figurava entre seus clientes. As batinas eram encomendadas por correspondência, para os que moravam longe e já tinham com ele as medidas. Confeccionava-as e as enviava por correio sem nem mesmo prová-las. E o reconhecimento vinha sempre no mesmo tom: “Caiu como luva”, ou seja, a batina estava perfeita, ao reverendo gosto do freguês!

Exerceu ainda, as funções de Delegado e foi um dos fundadores do PTB na Comarca. Em São João del-Rei, para onde se mudou em 1944, foi proprietário do Café Java, junto com seu tio Orosimbo, um artista e músico consumado, compositor afamado em Ouro Preto em seu tempo de estudante de Farmácia. Tio Orosimbo teve farmácia em Resende Costa. O Café Java era muito frequentado pelos políticos, inclusive o Tancredo Neves, ainda iniciante nos meandros da Política, exercendo as funções de Vereador.  Ninfa não conseguiu permuta com alguma outra professora para ocupar sua vaga em Resende Costa, Ramiro por sua vez, não estava bem de saúde, resolveram então retornar.

No exercício do magistério, ela era muito dedicada, apesar da filharada. Criou onze! Causa emoção quando algum deles se encontra com antigos alunos e alunas de sua mãe, pois todos são pródigos em elogios.  Simples, amável, disponível, discreta, guardava no silêncio e num meio sorriso, muita vida interior.

Em 1952, a família mudou-se de vez para São João del-Rei. Naquela época era muito difícil estudar. Poucas as cidades que tinham o privilégio de manterem ensino além do Primário, diferentemente dos tempos atuais. Urgia, pois, dar oportunidade aos filhos para progredir. Com efeito, constituía um grande legado, os pais darem estudo para os filhos.

Ninfa continuou seu trabalho de Professora, no Grupo Escolar Tomé Portes Del Rei, denominação dada em homenagem ao ilustre bandeirante fundador da cidade. Moravam no Centro, e a escola estava localizada em Matozinhos, um bairro afastado. O acesso era por trem e quando perdia o trem, tinha que ir a pé!...  A mobilidade urbana era verdadeiramente precária.  

Em São João Del Rei, os salesianos mantinham o Colégio São João, que, aliás, exerceu um papel fundamental para o desenvolvimento de toda a região, como educandário. Dele saíram filhos ilustres de muitas cidades vizinhas. Lá, estudaram internos, os irmãos mais velhos. Houve quem fosse para o não menos benemérito Colégio Santo Antônio, dos Frades Franciscanos, mais tarde transferido para Belo Horizonte, sob a mesma denominação. As meninas estudaram no Colégio Nossa Senhora das Dores e no Colégio Nossa Senhora Auxiliadora, das Irmãs Salesianas. Cumpre também mencionar a contribuição valiosa dessas duas escolas na formação e educação de várias gerações.    

Para seguirem curso de ensino superior, os mais velhos mudaram-se para Belo Horizonte. Não pensem as novas gerações que tudo era fácil como hoje, com ônibus direto para a Capital, em diversos horários e em estrada asfaltada com excelente manutenção efetuada por empresa concessionária... Um tapete! Ia-se de São João até Barbacena de trem de bitola estreita, à noite, e se esperava pelo trem de bitola larga que voltava do Rio de Janeiro em direção a Belo Horizonte. Lá, se chegava pela manhã, caso não houvesse atrasos ou queda de barreira, em época de chuva. Visita aos pais? Só no fim do ano por ocasião das festas natalinas...

Em 1967, para dar oportunidade aos filhos menores, a família sai de São João del- Rei e ruma para Belo Horizonte. O resultado de todo esse esforço e sacrifício são os frutos colhidos no sucesso e na formação profissional de todos eles.

Ninfa e Ramiro souberam trazer para a grande cidade, os valores preciosos de família e da cultura resende-costense, para transmiti-los aos filhos e como bênção de Deus, viram brotar, como vinha fecunda, os filhos de seus filhos, ao redor de sua mesa!  

Deixe um comentário

Faça o login e deixe seu comentário