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Se meu fusca falasse...

17 de Dezembro de 2014, por Rosalvo Pinto

Indubitavelmente, Resende Costa é a cidade dos fuscas. Posso até estar equivocado, mas por onde andei não vi coisa igual. Há fuscas de todos os anos de fabricação, de todas as cores, na cidade e nas roças, mais ou menos conservados, originais e adaptados, mais ou menos barulhentos e por aí vai. Há fuscas de estimação, nos trinques, como o “Azeitona” do Tataca, enquanto outros rodam por aí caindo aos pedaços. É nos dias de festa que eles costumam aparecer mais, pois muitos vêm da zona rural. Basta dar um giro pela cidade para confirmar a presença colorida e barulhenta deles.

Assim, Resende Costa poderia ser apelidada de “fuscolândia” ou de “fuscópolis”.  Fuscolândia, para quem gosta das raízes linguísticas anglo-germânicas: land (terra, no inglês e no alemão) e para quem prefere raízes mais clássicas: pólis (cidade, do grego). Mas, e o fusco? É claro que vem do termo “fusca”.

E é aí que vem a historinha ou a curiosidade. Para chegar ao “fusca” é preciso conhecer um pouco da origem dele, o carro, e/ou, posteriormente, do vocábulo.

O pai do fusca foi o alemão Ferdinand Porsche (1875/1951). Aos 18 anos começou a exibir sua grande habilidade mecânica. Entre outros tantos projetos, participou da criação de um dos mais famosos carros, até os dias de hoje, o Mercedes. Em meados da década de 30 o caminho desse mecânico famoso cruzou com o caminho do também famoso ditador Adolf Hitler. Em 1934, assumindo o poder na Alemanha, Hitler propôs a Porsche desenvolver o projeto de um carro popular. Esse carro seria um Volkswagen, ou seja, um carro (wagen) do povo (volks – o “v” em alemão corresponde ao nosso “f”). Mal sabia Porsche que ele estava criando o carro mais famoso do mundo em todos os tempos, superando inclusive os carros da americana Ford. Hitler impôs várias exigências ao projeto do volkswagen, como, por exemplo, o preço baixo (daí o “popular”) e a refrigeração do motor a ar, uma novidade, por causa do congelamento da água no período do inverno. Há quem diga também que ele se tornou útil na 2ª. Grande Guerra, sobretudo na África, pela escassez de água no deserto.

E o volkswagen alemão chegou ao Brasil em 1950 e, sete anos depois, veio a sua fábrica, inaugurada em setembro de 1957 em São Bernardo do Campo (SP). Curiosamente, o primeiro produto da, agora, “Volkswagen do Brasil”, foi a Kombi (nome derivado do alemão, que tem a mesma raiz do termo do português: “combinação”, carro que combina passeio e carga). O primeiro fusca só chegou em janeiro de 1959.

E assim o carrinho caiu nas graças do povo brasileiro. Logo apareceu no cinema, com o filme americano The Love Bug, em 1968 (no Brasil, “Se meu fusca falasse”). Tempos depois veio o “fuscão”, logo homenageado com a canção popular Fuscão Preto, de Atílio Versutti & Jeca Mineiro. E para quem tinha dificuldades financeiras, apareceu o também o fusca “pé-de-boi”, o mais despojado de todos. Quando a montadora resolveu aumentar o tamanho das duas lanternas traseiras, época em que estava na crista da onda a cantora paraense possuidora de dois volumosos seios, a Fafá de Belém, apareceu o “fusca Fafá”. Mais barato em relação aos outros sedans, o fusca continuou sendo modificado, aumentando sua potência e oferecendo mais conforto.

E a historinha vai chegando ao fim. Para tristeza dos seus fãs, sua fabricação foi suspensa no Brasil em 1986. Porém, ao assumir a presidência da República, Itamar Franco forçou a montadora a reabrir a produção do fusca, alegando que era para manter um carro popular e mais barato. E o fusca voltou em 1993. Agora com um novo nome: “O fusca do Itamar”. Porém, o projeto não deu certo e o fusquinha saiu de cena em 1996.

Tempos depois, 1998/99 a Volkswagen-mãe resolveu fazer um fusca modernizado e estilizado. Deu-lhe o nome de Beetle (besouro). Além de muito caro, já não era mais “aquele” fusca. Não colou. Talvez para atrair compradores, trocou recentemente o nome beetle para Fusca. Perguntem ao presidente da República do Uruguai, o José Mujica, 79, se ele comprou esse novo fusca. Nem Nunca! Todo mundo sabe que ele, mesmo sendo presidente, só anda no seu velho fusquinha azul claro.

E o nome “fusca? Inicialmente os brasileiros falavam “folkswagen”, nome meio complicado para falar e escrever. A criação de palavras nas línguas é algo misterioso. Um dia um brasileiro qualquer, para facilitar, começou a falar o nome “fusca”, obedecendo inconscientemente ao mecanismo linguístico chamado de “menor esforço”. E o nome pegou. Posteriormente, num gesto de carinho pelo carro, apareceu o termo “fusquinha”.

E Resende Costa continua sendo uma verdadeira fuscolândia ou uma fuscópolis. Muitas pessoas que têm carros modernos e caros não abandonam seu humilde fusquinha. É simples e puramente uma questão de amor.

 

A propósito, quem aí na cidade um dia não organizaria um encontro e uma carreata de fuscas? Eu estarei lá, com certeza.

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