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Soltando estrelas...

17 de Marco de 2016, por Rosalvo Pinto

Perambulando por estes dias nas “Lajes de Cima”, eu me via décadas atrás, com saudades, soltando estrelas. Sim, isso mesmo, “soltando estrelas”. Não eram arraias nem papagaios. Aqui em Resende Costa a gente soltava mesmo era estrelas. E via por ali também meus coleguinhas de vida de moleques. Olhando para atrás, na escada lateral da igreja de Nossa Senhora da Penha, eu via o padre Adelmo e seus coroinhas sendo fotografados. Tudo coisas bonitas e saudosas. Exceto a famigerada caixa d’água da Copasa.

As “lajes de cima” e as “lajes de baixo” eram o nosso paraíso. Ali era o ponto exato para soltar estrelas, escorregar nas folhas das piteiras e ir aprendendo as coisas da vida. Havia também as “Lajes da Cadeia”, mas nessa a gente não se arriscava muito a perambular por lá.

Soltar estrelas era coisa de meninos e de marmanjos. Em tardes ainda ensolaradas, quando o horizonte começava a se esconder. As lajes ficavam cheias de soltadores de estrelas e também de uma geringonça chamada “balaio”. Esse era coisa dos rapazes do Chico Canela, se não me falha a memória. Não era bem um balaio, era um objeto de quatro faces, retangular, como um caixote vazio aberto dos dois lados.

Nós meninos, com 9 ou mais anos, já sabíamos fazer nossas estrelas. Havia de todos os tamanhos e cores. Os ingredientes para fazer estrelas eram simples. Comprava-se tudo no “negócio” do Zé Augusto: papel de seda, linha para montar a estrela e fazê-la aprumar. O resto era o bambu (trabalhado) e o grude para colar, feito em casa. O mais difícil era fazer o “tem-tem” (acho que o nome era esse...), o dispositivo para ajeitar a conexão da linha com estrela. Se não ficasse perfeita, a estrela não funcionava. Para soltar a linha na hora de subir, bastava um pedaço de madeira para ir soltando a linha. Quem tinha a sorte de ter um pai caprichoso e engenhoso, como era o meu, fazia uma manivela de madeira. Ah!, já ia me esquecendo de um ingrediente fundamental: o “rabo”, sempre o rabo, coitado. Bastava um pedaço de barbante e as fitas de papel para amarrar no barbante, porém tinha que ser calibrado, tamanho e peso, senão a estrela não funciona direito.

Bem, a estrela já está pronta. É só subir para as lajes. Dependendo do dia, havia muita gente nas duas lajes. Logo, costumava dar alguma brigadinha para pegar o melhor lugar. Daí, com o tempo, alguns espertinhos inventavam um produto caseiro e bravo (um preparado com alho, pimenta e vidro, chamado “cerol”), algo parecido com o visgo de prender passarinho, de cujo nome não me lembro mais. O sujeito chegava-se perto do outro, com o produto escondido na ponta do dedo, puxava a linha, fingindo que está experimentando a força do vento e... adeus estrela. Havia na época o costume de pular nas hortas dos outros para salvar sua estrela, caso ela não estivesse danificada.

 

Soltando estrelas, coisa bonita. Mais bonita, porém, é a lembrança dos soltadores de estrelas do meu tempo. Naqueles tempos todo menino gostava das estrelas. Alguns deles já se ligaram delas e subiram para sempre: o João Bosco Lara, o Laurinho (padre) do Tio Alfredo, o Inácio do Sílvio e outros continuam soltando suas estrelas por aí: o “Tunico” do Tio Geraldo, o Roberto do Zé do Nico, o Gonçalo (irmão da dona Teresinha)... Vejo-os todos na fotografia dos “Cruzados” do padre Nélson e do padre Adelmo (1951/2) do livro-álbum “Retratos da Centenária Resende Costa”, livro recém lançado pela amiRCo.

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