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“Rejeições 2018”: vote no ruim para evitar o pior

17 de Outubro de 2018, por Fernando Chaves

Disputa eleitoral fica polarizada entre o petismo e o antipetismo

A nova direita e o seu fenômeno eleitoral: Jair Bolsonaro

O pleito nacional de 2018 revela nova conjuntura de forças partidárias no Congresso e a ascensão de uma nova direita brasileira, que conseguiu pautar o debate eleitoral durante quase todo o primeiro turno, mantendo o presidenciável Jair Bolsonaro (PSL) no centro da visibilidade midiática. Com um discurso simples, direto e controverso, o candidato não sentiu o peso do tempo escasso de propaganda televisiva. Suas mensagens circulam com muita força pelas novas mídias digitais e sua base de eleitores mostrou-se resiliente, chegando a 46% dos votos válidos no primeiro turno.  A estratégia eleitoral de Bolsonaro e seu programa de governo mesclam forte tom moralista, com apelo religioso e conservador no campo dos costumes, combinando propostas como a legalização do porte de armas de fogo, a redução da maior idade penal, além de maior liberalização da economia, enxugamento da máquina púbica com redução de ministérios e com privatizações, combate ao que chama de “ideologia de gênero” e endurecimento de políticas repressivas no combate à criminalidade e à corrupção. Candidato por um partido considerado até então nanico, o militar da reserva Jair Bolsonaro conseguiu vender a imagem de um outsider da política, mesmo estando há 28 anos na Câmara Federal, exercendo mandato pelo Rio de Janeiro.

Se Bolsonaro conseguiu atrair para si os holofotes e pautou as discussões políticas durante o primeiro turno, é porque ele também puxou para si todo o antipetismo e a revolta contra o sistema político vigente, sentimentos que se consolidaram nos últimos anos em razão de mais de uma década do partido de Lula no poder e dos escândalos de corrupção envolvendo o PT e outros partidos tradicionais, com forte componente de espetacularização midiática.

O candidato do PSL impulsiona uma onda de opinião conservadora no campo dos costumes e liberalizante na economia. Com essas bandeiras aglutinadas a partir do sentimento antilulista, Jair Bolsonaro esteve muito perto de vencer o pleito no primeiro turno e ainda conseguiu impulsionar a eleição de uma vasta bancada federal para o PSL, que passa de um partido nanico para a segunda maior legenda na Câmara de deputados (52 cadeiras), atrás apenas do PT (56 cadeiras).  Os candidatos que colaram sua imagem a Bolsonaro pelo Brasil afora tiveram resultados positivos nas urnas. Na disputa pelo Governo de Minas, Romeu Zema (NOVO), por exemplo, ascendeu nas pesquisas e alçou ao primeiro lugar após sua manifestação de apoio a Bolsonaro em debate televisivo nas vésperas da votação.   Zema vai disputar o segundo turno com Anastasia (PSDB).

As manifestações contra Bolsonaro, que ficaram conhecidas como #ELENÃO, demonstram o tom polarizado da eleição 2018. Também evidenciam o fato de que o presidenciável da nova direita acabou pautando grande parte da campanha e do discurso da própria esquerda brasileira durante o primeiro turno eleitoral. Curioso que logo após as manifestações do #ELENÃO, Bolsonaro cresceu.O movimento acabou servindo de reforço ao seu nome.

 

PT se propõe como alternativa ao neoliberalismo

O PT, que chega com o candidato Fernando Haddad para o segundo turno com 29,2% dos votos válidos, representa um projeto social-democrata brasileiro e não um projeto comunista/socialista como conjecturam alguns dos adversários do partido.  O Petismo sustenta a tese de que há partidarização em parte da justiça brasileira e que Lula é um preso político, impedido de se candidatar porque venceria as eleições. Nesse tom de defesa do seu líder, o PT oficializou a candidatura de Haddad apenas no dia 11 de setembro, após esgotados todos os recursos do PT na tentativa de lançar Lula como candidato.

O discurso petista se posiciona como defensor do incipiente estado social brasileiro, dos diretos sociais expressos na Constituinte de 1988 e do aprofundamento das políticas sociais. O partido é crítico à política de privatizações e preconiza um mercado mais regulado e com participação mais estratégica do Estado. O projeto petista pretende colocar freios e oferecer uma alternativa à tendência neoliberal contemporânea, propondo um Estado mais presente na economia e reparador das desigualdades sociais, com mais investimentos em serviços públicos, em programas sociais e políticas afirmativas voltadas para minorias étnicas, religiosas, sexuais, etc.  Embora o partido acumule grande rejeição junto à opinião pública (próxima de 40%) e tenha sofrido derrotas eleitorais sensíveis em 2018 (Governo de Minas e disputas para o senado em vários estados), o PT ainda vertebra o sistema político brasileiro.  Desde 1989, está sempre em primeiro ou segundo lugar nas eleições presidenciais e preserva-se como maior bancada na Câmara Federal.

Se, por um lado, a campanha de Bolsonaro pautou as discussões no primeiro turno das eleições 2018, por outro lado, o que mais define a resiliência de seu eleitorado é o antipetismo, o que revela mais um aspecto da presença do PT como elemento que ainda vertebra o sistema partidário brasileiro desde 1989.

Nesse caldo de petismo e antipetismo, Bolsonaro e Haddad se assemelham no nível de rejeição popular e irão protagonizar um segundo turno altamente polarizado e agressivo. Muito longe da tendência centrípeta da política verificada nas décadas de 1990 e 2000, o desenho da disputa eleitoral revela a demarcação clara das distinções ideológicas entre os candidatos. Com a exacerbação de posições, muitos eleitores tendem a definir seu voto pelo candidato que menos rejeitam.

 

Ciro não vira e os tucanos são os maiores derrotados

Em meio à polarização entre petismo e antipetismo, o terceiro colocado na disputa presidencial, Ciro Gomes (PDT), tentou se consolidar no primeiro turno da eleição como uma terceira via, uma alternativa entre as duas candidaturas do PT e do PSL. Mas a resiliência dos eleitores bolsonaristas e petistas não permitiu que Ciro passasse dos 12,5% dos votos válidos. Apesar de crítico ao PT, Ciro guarda afinidades ideológicas com o projeto petista. Isso dificultou que sua campanha tirasse votos do espectro político de direita e mais conservador, praticamente todo capturado por Bolsonaro. No espectro progressista, a máquina partidária do PT, com mais recursos, maior coligação e tempo televisivo, manteve-se hegemônica e não permitiu o crescimento de Ciro. 

Os demais candidatos considerados competitivos no início do período eleitoral, sobretudo Marina Silva (REDE) e Geraldo Alckmim (PSDB), sofreram forte esvaziamento das intenções de voto diante da polarização entre PT e PSL. Os tucanos, principalmente, saem como os maiores derrotados das eleições 2018. Além de estar ausente do segundo turno presidencial pela primeira vez desde 1994, o PSDB viu sua representação na Câmara Federal diminuir sensivelmente. O mesmo ocorreu com o MDB. Esses dois partidos da centro-direita institucional (que não é tão institucional assim) foram os grupos políticos mais esvaziados com o crescimento da nova direita. De grandes bancadas na Câmara, passam a ser legendas medianas. 

 

Fragmentação das forças congressistas: desafio à governabilidade

A renovação de mais de 50% das cadeiras na Câmara trouxe consigo o aumento da fragmentação partidária. O país passa de 25 para 30 partidos representados no Congresso.  Houve também uma redistribuição de forças, com o crescimento de outras legendas pequenas, além do PSL. É o caso do PDT, que foi impulsionado pela campanha de Ciro Gomes e passou de 19 para 28 deputados federais, peso equivalente ao do PSDB.

Com o parlamento mais fragmentado, grandes desafios de governabilidade se apresentarão ao próximo presidente. Dada a composição mais conservadora dos deputados, independente das siglas partidárias, o Candidato Jair Bolsonaro (PSL) tende a ter mais facilidade para aprovar suas pautas, caso eleito.

O contexto político, institucional e de opinião no Brasil atual aponta para muitas dificuldades no avanço de pautas de centro-esquerda. Se assumir novamente o poder executivo, o PT precisará fazer um governo moderado, com foco na preservação de direitos sociais, no resgate da credibilidade das instituições e no bloqueio ao avanço indiscriminado das pautas liberalizantes. Neste cenário de vitória petista, a imprevisibilidade política é grande, em razão da continuidade da instabilidade na relação do Poder Executivo com o parlamento e com outras instituições.

Da mesma forma, tendo Jair Bolsonaro como presidente eleito, a imprevisibilidade do sistema permanece alta. Teremos pela frente um clima político e de opinião que facilitará a implementação da agenda do candidato. Mas, por esse caminho, o Brasil poderá experimentar uma guinada à direita, com liberalização da economia e um forte componente conservador quanto aos costumes. Nessa hipótese, a imprevisibilidade decorre não da falta de consenso entre as instituições, mas da possibilidade de medidas radicais e arrojadas sobretudo no campo econômico.

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