Mês passado, refleti um pouco sobre o PAI AMOROSO, aquele da parábola do Filho Pródigo. Hoje, reflito um pouco sobre as figuras contrastantes dos filhos.
Um dia, faz tempo, um grande jesuíta, que adorava ler nas entrelinhas, escreveu página memorável a respeito dos dois irmãos daquela parábola. Algo do que escreveu segue aqui.
Referindo-se ao mais velho, dizia: “O filho ‘ficante’ mostrou-se desastradamente insignificante, mesquinho, contador do que fizera pelo pai. Ele estragou tudo, traiu, meteu a nu sua alma. Lembrou ao pai que não saíra, não pecara, que não destruíra o nome da família, nem manchara a ‘fama’ veneranda do ancião”.
Esse filho, o “ficante”, na hora em que experimentara a alma de seu pai, com todo o “calado do seu amor”, deixou-se tomar de ciúme, com argumentos arrancados de inveja, gemidos de amor-próprio alfinetado. “Será que o pai era mesmo amado pelo moço? Será que, ficando em casa, distraindo-se com seus amigos, indo em casa para comer e dormir, será que era mesmo filho do querido pai ou... pai dos seus queridos caprichos de moço?”, indaga o jesuíta.
Bem indagava o autor dessas palavras, pois há certas “fidelidades” que nascem mais do medo que de qualquer outro sentimento.
E o filho mais moço? “Mais moço... mais filho”, começa dizendo o padre jesuíta. “Mal rompido, coberto de toda a poeira dos caminhos, faminto e enterrado debaixo da sua vergonha, o menino arrependido decorava seu coitado ato de contrição. Vinha que vinha caindo, não tanto de fadiga, mas de mal corrido medo da reação do pai, tão justa, tão ‘necessária’”.
Ponderava, então, o padre jesuíta: “Detestemos o ‘amor’ que vem cobrando, vem lembrando direitos, exigindo prêmios, reclamando festas para seus amigos. Detestemos o afeto que guarda memória, a fidelidade que tem diário, conta os anos, sabe o que falta para as bodas, anda com calendário no bolso...”
Posso me enganar, mas a figura do filho mais moço aparece quase sempre mais simpática para a maioria das pessoas. A gente se identifica mais facilmente com o erro do que com a virtude. E virtude foi o que o filho mais moço apresentou: a absoluta pureza do arrependimento, a real tomada de consciência da própria falta. Por isso, “Salvos estaremos enquanto soubermos o nome do pecado; enquanto nos sentirmos mal, no mal. Então encontraremos a salvação para nossa angústia, como a encontrou o filho mais moço: “O que nos salva foi o que salvou o menino ingrato, que fugiu com o dinheiro de seu pai, pedido antes da hora... o rosto do Pai. O rosto que emparaísa a maioria dos eleitos é o rosto encontrado pelo filho que saiu de casa”, rosto de pai misericordioso.
Não sei o que meu leitor acha dessas considerações do Padre Vasconcelos, que esse é o nome do jesuíta. Mas, que coragem, que absoluta convicção e fé na bondade infinita do Pai, igualmente amoroso para com os dois filhos tão diferenciados.