A origem de Resende Costa: novas informações*

Um texto do jornal A Tribuna de São João del-Rei, publicado em 28/07/1919, sete anos após a instalação do município, diz que o inconfidente filho deu nome ao município.


Artigo

João Carlos Resende**1

Fazendeiros e autoridades no dia da instalação do município.

 

Em fevereiro de 2019 (dia 12 ou 19, não há consenso), completam-se 200 anos do falecimento de um dos principais delatores do movimento conspiratório que ficou conhecido como Inconfidência Mineira. Joaquim Silvério dos Reis, após enfrentar várias hostilidades na capitania mineira, terminou seus dias no Maranhão, tendo antes vivido em Lisboa. Sempre que o assunto vem à tona é impossível não se lembrar do conjurado José de Resende Costa e de seu filho homônimo, condenados ao exílio na África por terem participado, em fins do século XVIII, do movimento sedicioso. E quando se fala nestes dois inconfidentes logo vem à mente o município de Resende Costa. Mas, afinal, qual a origem e a razão do nome da localidade?

A Villa Rezende Costa, antigo distrito da Lage, foi criada pela Lei 556 de 30/8/1911, e instalada aos 2/6/1912. O pedido de criação do município foi entregue à Câmara dos Deputados de Minas Gerais pelos habitantes do lugar em uma carta de representação datada de 1/7/1911, com 289 assinaturas. No documento foram elencados 7 motivos que justificariam a reivindicação e se dizia que “o povo pede para o novo município a denominação de “Resende Costa”, perpetuando por essa forma a memória de um dos precursores da democracia brasileira e um dos mais conspícuos companheiros do imortal Tiradentes.”

Infelizmente a Lei 556 de 1911 não faz menção ao propositor do nome da Villa Rezende Costa. Deixemos de lado as revisões historiográficas acerca da Inconfidência, afinal não se pretende discutir as razões e os objetivos do movimento, tampouco a ressignificação que o mesmo ganhou com a República, no final do século XIX. A petição não deixa claro qual inconfidente daria seu nome ao recém-criado município, embora haja a impressão de que os lageanos estivessem se tratando do pai, já que o filho só havia se inteirado do movimento sedicioso posteriormente, não devendo ser um dos conjurados mais próximos de Tiradentes. Contudo, quando a representação foi encaminhada à Mesa da Assembleia Legislativa o deputado Francisco Alves Moreira da Rocha fez um discurso no qual disse: “os signatários da referida representação, em número aproximado de 300, justificam as vantagens da elevação do distrito à vila e pedem, ao mesmo tempo, que lhe seja dado o nome de “Resende Costa”, prestando, assim, uma homenagem àquele antigo conjurado mineiro, cujo nascimento se deu naquele lugar.”

Pelo discurso do deputado é possível inferir que o novo município teve seu nome herdado do inconfidente filho, pois o inconfidente pai nasceu na Fazenda Engenho Velho dos Cataguases, à época arraial de Prados, e só depois foi viver na Fazenda dos Campos Gerais, cuja carta de sesmaria obteve na década de 1750. Já o memorialista José Maria da Conceição Chaves afirmou: “a ideia dessa homenagem ao Conselheiro Resende Costa partiu do respeitável patriota e lageano major Joaquim Leonel de Resende Lara, descendente da família daquele conjurado mineiro.”

Pelo relato o nome do município foi escolhido em uma homenagem ao inconfidente filho, já que ele foi feito conselheiro do Império ao se aposentar, em 1825. Em sua pesquisa sobre os inconfidentes José de Resende Costa, Rosalvo Gonçalves Pinto, após se referir a parte dos documentos aqui apresentados, afirma que “está em pauta um problema a ser pesquisado”, ao se questionar sobre quem foi o verdadeiro homenageado com o nome do município criado em 1911. Uma fonte ainda não consultada para a resolução da questão pode agora ajudar a esclarecer a dúvida. Na edição de número 264 do jornal A Tribuna, de São João del-Rei, publicado aos 28/7/1919, ou seja, 7 anos após a instalação do município em questão, há um suplemento no qual é apresentada uma exposição sobre a Villa Rezende Costa. Em texto assinado por A.A. é dito: “e, emquanto, rebrilhando na luminosa constelação da Inconfidencia, o nome de Resende Costa Filho [sic], à antiga Lage, seu ditoso berço, exulta de prazer, Prados, patria pe [sic] Resende Costa, o velho, tambem conjurado e perseguido, não tem igualmente motivos mui sagrados de legitima infamia?“

No mesmo suplemento, em texto de A.P.A., fica claro qual o homenageado: “Lage era o nome conhecido do arraial, que foi até pouco a sede do districto de mesmo nome, pertencente ao historico e antigo municipio de S. José d’El-Rey. Na ultima divisão administrativa, aquelle arraial com o respectivo territorio foi desmembrado do então municipio de Tiradentes e elevado a Villa com a denominação de Villa Resende Costa, em homenagem à memoria de um patriota benemerito, filho do logar, conselheiro José de Resende Costa, membro do Instituto Historico e Geographico Brasileiro, veneravel nos fastos da liberdade nacional, da qual foi um dos primeiros martyres na Inconfidencia Mineira.”

Ao que parece, portanto, o nome da cidade foi escolhido em homenagem não ao inconfidente pai, mas ao filho. Havendo já evidências suficientes sobre qual foi o homenageado, fica a dúvida: quem foi o mentor da ideia? A Lei 556 de 1911, a carta de apresentação à Assembleia do pedido de criação do município, o discurso do deputado Moreira da Rocha e o já citado jornal de São João del-Rei não fazem qualquer menção ao idealizador da homenagem. Como já visto, José Maria da Conceição Chaves atribui a sugestão a Joaquim Leonel de Rezende Lara. Outro memorialista, José Augusto de Rezende, no entanto, afirma que foi ”o nome mudado para o de — “Rezende Costa”, — medida essa que era uma aspiração justa dos lageanos e que já vinha sendo estudada e preparada, antes de 1911, por um grupo de patriotas, entre os quaes se distinguiu o coronel João Evangelista de Souza Maia, chefe político local.”

Assim, é possível presumir, se há incerteza quanto ao mentor da escolha do nome, o registro na posteridade de diferentes idealizadores pode ter algo a dizer. Provavelmente a ideia não foi sustentada por longo tempo por uma única pessoa, mas abraçada por parte dos moradores locais, afinal José de Resende Costa, o filho, após voltar do exílio foi um grande benemérito do arraial da Lage, para o qual doou 5 apólices para benefício dos pobres, por exemplo, e se manteve no centro do cenário político do Brasil, chegando a ser eleito deputado para a primeira Assembleia Constituinte da história do país, logo após a Independência. Portanto, o nome do município de Resende Costa não foi escolhido apenas em função da Inconfidência Mineira, afinal ainda outros 2 conjurados (Pe. Toledo e Cel. Francisco Antônio de Oliveira Lopes) estavam ligados à Lage por suas posses e relações sociais e nem por isso tiveram suas memórias preservadas no lugar. Pesou a favor de José de Resende Costa, o filho, sua trajetória e suas ações após a volta do degredo, além de ter nascido no antigo arraial e, claro, seu envolvimento no movimento conspiratório.

* Extraído da dissertação de mestrado de João Carlos Resende. Projeto de pesquisa: Produção e fragmentação de riqueza em Minas Gerais (distrito da Lage, 1871-1912). Em desenvolvimento.

** Mestrando em História pela Universidade Federal de São João del-Rei.

 

Comentários

  • Author

    No centro da foto está o Coronel Francisco Mendes de Rezende (de terno escuro, camisa branca, cabelos grisalhos e bigode). Este que foi o primeiro Presidente da Câmara em Resende Costa, na década de 10 do Século XX. Coronel Francisco era padrinho do professor Antônio de Lara Rezende (pai do Otto Lara Rezende - autor do livro "Memórias do Caraça" - I e II ). O professor Antônio de Lara Rezende, estudou no Caraça graças a ajuda deste grande cidadão de Resende Costa, e, que foi beneficiado com as apólices deixadas pelo Inconfidente José de Rezende Costa (Filho). O Sr. Antônio de Lara Rezende menciona com muita estima o saudoso Coronel Francisco Mendes, em suas doces memórias. Parabéns João Carlos Resende pela excelente abordagem e dissertação.


Deixe um comentário

Faça o login e deixe seu comentário