Capoeira Nossa Senhora da Penha: área verde no coração de Resende Costa


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André Eustáquio0

Horto Florestal produz mudas para arborização

Um presente da natureza aos resende-costenses ameaçado pela ação predadora do homem.

 

Um lugar prazeroso que poucos resende-costenses têm o privilégio de desfrutar localiza-se no coração da cidade. Ali encontra-se espremida entre casas e ruas a Capoeira Nossa Senhora da Penha, uma área verde de aproximadamente 13 hectares que circunda os bairros Santo Antônio, Nova Resende e Centro. Guiada pelo funcionário do Horto Florestal, Dimas José de Resende e pelo Técnico Ambiental do Instituto Estadual de Florestas (IEF), Murton Moreira, a equipe de reportagem do JL percorreu alguns trechos da mata para ver e sentir de perto a luta da natureza contra a ação predadora do homem.

Antes da instalação da COPASA em Resende Costa, no início dos anos 1980, fazia parte da rotina dos moradores da cidade buscar água na fonte. Aos olhos de hoje pode parecer poético, mas não para as pessoas que vivenciaram essa época, marcada por muitas privações. O tempo, porém, passou, a cidade se desenvolveu e hoje não é mais necessário buscar água na fonte. Basta abrir a torneira e já se tem em casa água tratada em abundância. As cenas das mulheres vindas das fontes com a lata d’ água na cabeça, apoiada nas “rodias” (rodilhas) de pano, hoje fazem parte apenas das lembranças de poucas pessoas que vivenciaram esta época ou da letra da famosa marchinha de carnaval, de Luís Antônio e Jota Jr.

É preciso ressaltar que o desenvolvimento da cidade não trouxe somente benefícios à população; trouxe também problemas, muitos deles oriundos da falta de planejamento. A Capoeira Nossa Senhora da Penha, antes intocada, ao longo dos anos tornou-se uma das principais vítimas do crescimento desordenado imposto à cidade. A Fonte João de Deus, localizada na capoeira, onde muita gente buscava água e lavava roupa até pouco tempo atrás, encontra-se assoreada e poluída pelo esgoto que cai na mata, vindo de bairros vizinhos. O trilho que dava acesso à fonte praticamente desapareceu. No local está se formando uma perigosa erosão. “Essa erosão está sendo formada pela água da chuva que cai com muita força na capoeira. A enxurrada traz também esgoto e lixo para dentro da mata”, explica Murton.

Entre arbustos e árvores de maior porte, vê-se claramente o caminho formado pelas águas que arrastam para dentro da mata latas de refrigerante e energéticos, sacos plásticos e objetos maiores, como pneus e tampas de vasilha. “Vocês podem ver que a erosão maior já está praticamente estabilizada por causa do desvio da água. A natureza já está fazendo a parte dela. As feridas estão sendo curadas espontaneamente através da própria regeneração da mata”, explica Murton, chegando à beira da grande erosão criada pelo acúmulo de água pluvial e esgoto. A pavimentação de ruas e avenidas da cidade colaborou para a modificação do curso natural da água da chuva, que cai na capoeira: “Enquanto não se resolver o problema da água pluvial e do esgoto no centro da cidade, a capoeira continuará correndo risco”, alerta Murton Moreira.

Outro problema que demanda medida enérgica por parte do poder público municipal, principal responsável pela preservação da capoeira, está relacionado com as divisas da mata. De acordo com Murton, ao longo do tempo, houve uma redução de aproximadamente 5% da área total devido à invasão dos moradores do entorno. “Infelizmente isso aconteceu e ainda há vizinhos que quando vão construir derrubam árvores da capoeira e estendem as cercas de limite”. A invasão indiscriminada, no entanto, não partiu somente da vizinhança. Em 1985, a abertura da rua que liga os bairros Nova Resende e Santo Antônio - em frente ao antigo Matadouro Municipal – abocanhou um pedaço considerável da mata. “Naquela época foi uma ação necessária”, reconhece Murton.

O desmatamento, no passado um problema crônico que assolava a capoeira, atualmente minimizou. De acordo com Murton, é raríssimo encontrar vestígios de corte de árvores na mata. O técnico do IEF atribui grande parte disso ao programa Auxílio Gás, chamado por muitos de Vale Gás, criado em 2001 pelo Governo Federal no intuito de atender às famílias com renda de até meio salário-mínimo. “Com a ajuda do Vale Gás, pouca gente tem hoje necessidade de buscar lenha no mato”. Mas ainda se veem algumas árvores com marcas de serrote. “Eles usam o serrote porque faz menos barulho”, disse Dimas Resende.

 

Revitalização

Caminhar no interior da capoeira respirando ar puro é uma atividade prazerosa. Sentir a natureza pulsar entre aroeiras, jacarés, óleos, canelas, veludo-branco, entre outras espécies nativas presentes na mata, não tem como descrever. “A gente entra na capoeira com a pressão arterial a 20 e sai com ela a 12 (risos)”, disse Murton, que não esconde o prazer de caminhar na mata mostrando as espécies de plantas nativas que formam a flora e o sub-bosque. Ele explica a importância da mata para a preservação das nascentes: “A capoeira é uma área de recarga, que absorve a água da chuva e com isso alimenta o lençol freático, preservando as nascentes”. A fauna local é composta por Mico-estrela, Jacu, Trinca-ferro, Sabiá, entre outras espécies de pássaros. “Já vi aqui cobras Coral, Cascavel e Urutu”, disse Dimas Resende, provocando o olhar espantado da repórter Emanuelle Ribeiro, que registrava com a câmera fotográfica cada detalhe da mata apresentada por Murton e Dimas.

A emoção de sentir a natureza lutar pela sua preservação e poder contemplar a beleza das árvores e a singeleza dos arbustos crescendo em meio às folhas, galhos e cipós nos leva a sonhar com a revitalização da capoeira e, consequentemente, com a criação de um parque ecológico, para deleite da população local e de turistas que visitam Resende Costa. “Poderiam ser criadas trilhas para caminhada dentro da mata, revitalizar a Fonte João de Deus, desenvolver um projeto de jardinagem no local, entre outras ações”, sugere Murton, chamando a atenção para a diversidade de samambaias.

“A beleza natural daqui é incontestável. Mas posso dizer que infelizmente 85% da população resende-costense ainda não conhecem a capoeira”, lamenta Murton, que defende a revitalização da mata como uma ação importante para se promover educação ambiental: “Se a população conhecesse de perto a capoeira, certamente veria que devemos preservar a natureza, não desmatando e poluindo as nascentes, não jogando lixo nas ruas, pois a chuva poderá arrastá-lo para os córregos, nascentes e matas. Com certeza teremos uma população mais educada e consciente da preservação da natureza”.

 

A implantação da rede de esgoto é essencial para Resende Costa em vários aspectos: melhorar a qualidade de vida da população e minimizar problemas ambientais, como os que colocam em risco a Capoeira Nossa Senhora da Penha. Resende Costa tem o privilégio de contar com uma mata nativa no centro da cidade. É, portanto, inaceitável que esgoto, lixo e entulhos sejam jogados na mata, que deveria estar preservada. Quem sabe o sonho de se ter no local um parque ecológico estruturado, com a Fonte João de Deus despoluída, se torne realidade a partir da concretização das obras da rede de esgoto, das cobranças e conscientização da população e da vontade do poder público.

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