Exposição mostra “fascínio” dos Painéis de São Vicente, obra-prima da pintura portuguesa

Os Painéis de São Vicente estão, atualmente, a ser alvo de um processo de estudo, conservação e restauro, no Museu Nacional de Arte Moderna, com duração estimada até 2022.


Cultura

José Venâncio de Resende0

Painéis de São Vicente: restauro pode ser acompanhado pelo público.

Em meio à pandemia, decorre até janeiro de 2021, no Museu Nacional de Arte Antiga de Lisboa, a exposição temporária «Almada Negreiros e os painéis. Um retábulo imaginado para o Mosteiro da Batalha». Com a escalada de casos na segunda onda do coronavírus, poucos terão a oportunidade de visitar esta exposição, que apresenta, pela primeira vez, a obra do artista que revolucionou a pintura portuguesa.

A exposição disponibiliza o retábulo Os quinze painéis na Capela do Fundador (1960), “obra nunca antes apresentada na sua forma completa”, dizem os comissários (curadores) Simão Palmeirim e Pedro Freitas. O retábulo foi imaginado com 15 painéis, conjunto este de pinturas que seria destinado ao Mosteiro da Batalha, próximo a Fátima e Leiria.

À semelhança da obra Estudo em fio dos painéis de São Vicente (1950), também presente na exposição, o retábulo terá sido trabalhado com fios sobrepostos. Esta obra de 1950 é um estudo geométrico dos Painéis de São Vicente. Almada Negreiros utiliza figuras como pentágonos e hexágonos para interpretar as pinturas.

“Encimando os painéis, há um frontão triangular que permitiu datar e associar a obra a vários desenhos preparatórios, com traçados geométricos semelhantes”, diz a sua descrição. “Estes permitiram recriar digitalmente as linhas que correspondem aos fios de algodão e apoiar o restauro (em laboratório especializado)”.

O restauro foi possível a partir de recente estudo por parte de investigadores (pesquisadores) das áreas da matemática e das belas-artes, interessados na compreensão dos traçados geométricos em causa, complementam os curadores Simão e Pedro.

Geometria

Foi na geometria que Almada Negreiros (1893-1970), figura maior do modernismo português, “encontrou uma ferramenta para estudar as manifestações artísticas de épocas passadas e, ao mesmo tempo, uma inspiração para o seu próprio trabalho”, dizem os curadores. Ao longo de décadas, o artista elaborou uma proposta de agregação de múltiplas pinturas do Museu Nacional de Arte Antiga, “imaginando-as num retábulo único, que incluía os Painéis de São Vicente, de Nuno Gonçalves”.

Assim, Almada definiu o posicionamento das obras, com base em pressupostos geométricos, “sugerindo que o seu destino original seria a Capela do Fundador, no Mosteiro da Batalha”, prosseguem Palmeirim e Freitas. Tanto que, a partir deste mês de novembro, o Mosteiro da Batalha deve embarcar num projeto gigantesco de reproduzir este retábulo no local inicialmente imaginado por Almada.

Mistérios

Almada Negreiros desvendou parte dos mistérios que envolvem os famosos Painéis de São Vicente, obra-prima da pintura portuguesa do século XV, de acordo com Simão Palmeirim, em reportagem da emissora TVI. “É uma obra que faz uma interpretação geométrica dos Painéis de São Vicente.”

A obra de Almada tem uma história fascinante, fruto de exaustiva investigação, conta Simão. O artista e um historiador da época – estamos falando de 1926 – repararam que todas as pinturas tinham azulejos comuns no chão. Concluíram que isto era um ponto de fuga comum e que havia um único conjunto de seis pinturas, e não dois conjuntos de três pinturas como se pensava.

A investigação de Almada prolongou-se durante décadas, segundo o curador da exposição. Muitas foram - e continuam sendo - as especulações: os painéis foram realmente pintados por Nuno Gonçalves, quem são as personagens retratadas e qual o local para onde a obra foi originalmente encomendada?

Almada tinha uma teoria de que o local não seria a Sé de Lisboa, mas sim o Mosteiro da Batalha, conta Simão. O retábulo foi imaginado com um total de 15 peças que incluiriam os Painéis de São Vicente.

Os seis painéis ficam na parte inferior do retábulo, observa Simão. “Nota-se que (na parte superior) faltam duas para completar as 15 (peças). São esses espaçamentos que Almada deixa”, nos quais segundo ele estariam D. João e Dona Felipa de Lencastre, que estão sepultados na Capela do Fundador no Mosteiro da Batalha.

Restauro

Os Painéis de São Vicente estão, atualmente, a ser alvo de um processo de estudo, conservação e restauro, no Piso 3 do Museu, com duração estimada até 2022. Numa iniciativa inédita, desde junho, o público tem a possibilidade de visitar o local onde decorre o processo de restauro dos painéis, devidamente vedado mas visível, permitindo o acompanhamento in loco dos trabalhos nas suas várias fases.

O projeto resulta de protocolo mecenático, firmado entre o Museu Nacional de Arte Antiga, o Grupo de Amigos do Museu, a Direção Geral do Patrimônio Cultural e a Fundação Millennium BCP. Além da participação de conservadores do próprio Museu, integram o projeto dois especialistas contratados especificamente para esta intervenção, contando-se com o apoio técnico dos laboratórios José de Figueiredo e Hércules da Universidade de Évora.

A equipe é reforçada por um grupo de consultores internacionais que inclui conservadores-restauradores e historiadores de arte da Universidade de Ghent e do Instituto Central de Restauro da Bélgica, da National Gallery de Londres (Reino Unido), do Metropolitan Museum of Art (EUA) e do Museo Nacional del Prado (Espanha).

Assim, espera-se que com o fim da pandemia os visitantes, tanto ao Museu Nacional de Arte Antiga quanto ao Mosteiro da Batalha, tenham a oportunidade de apreciar os famosos Painéis de São Vicente.

LINKS:

Almada Negreiros sobre Painéis de São Vicente no Museu Nacional de Arte Antiga - https://tvi24.iol.pt/videos/sociedade/inedito-de-almada-negreiros-sobre-paineis-de-sao-vicente-no-museu-nacional-de-arte-antiga/5f89a3530cf2649b904881e2~

Mais informações sobre a pintura atribuída a Nuno Gonçalves - http://www.matriznet.dgpc.pt/MatrizNet/Objectos/ObjectosConsultar.aspx?IdReg=252075&EntSep=3#gotoPosition

 

 

 

 

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