Investigações sobre as causas de mortes de três crianças em São João del-Rei geram debates, reuniões, suspensão de aulas e treinamentos de profissionais


Saúde

Vanuza Resende0

UPA de SJDR registrou aumento significativo no atendimento a crianças de 0 a 10 anos. Foto Susane Costa

No dia 24 de setembro, São João del- Rei se comoveu com a dor de uma família que sepultou uma criança de apenas 10 anos. O garoto, que estudava na rede municipal de ensino, teve em sua declaração de óbito, sepse causada pela bactéria Streptococcus pyogenes. No entanto, de acordo com a nota técnica emitida pela prefeitura de São João del-Rei, não houve coleta de material para exame laboratorial a fim de confirmar ser a bactéria a causadora da morte do garoto.

A morte de uma criança acendeu um alerta aos pais e responsáveis, que começaram a se preocupar com uma possível bactéria que poderia infectar as crianças. Com tamanha preocupação, a médica infectologista do município de São João del-Rei, Janaína Ferreira, gravou um vídeo com explicações do que seria essa bactéria, com o nome comprido e de pronúncia difícil, mas não desconhecida. “Tem sido relatado em alguns lugares um aumento no número de infecções. Ela pode causar desde infecções de pele, como erisipela, celulite, escarlatina e impetigo. E causa muito comumente infecção de gargantas, amidalites bacterianas, principalmente em crianças menores de 10 anos de idade. E, em algumas situações, ela pode causar infecções com uma gravidade um pouco maior, como pneumonia, meningite, mas não são infecções tão comuns pelo Streptococcus pyogenes. Porém, podem acontecer. Em algumas situações, ela também pode causar uma infecção invasiva grave, que é a síndrome do choque tóxico. Incomum, mas, quando acontece, infelizmente ocorre uma mortalidade mais alta”, explicou a médica.

No dia 08 de outubro, uma nova comoção na cidade. Uma garota de três anos, que viajava com a família para Maranhão, faleceu longe de casa. Para ajudar com o traslado do corpo, a família realizou uma vaquinha e arrecadou R$10.000,00 para o sepultamento da garotinha acontecer em São João del-Rei.

Os rumores de uma bactéria vitimando crianças aumentou. E no dia 10 de outubro, a Secretaria Municipal de Saúde emitiu a primeira nota oficial sobre o assunto, afirmando: “É mentira, não há surto de meningite no município e região”. “Tivemos, infelizmente, e sentimos muito por isso, dois óbitos infantis, cujas causas estão sendo investigadas pela Secretaria Municipal de Saúde e Secretaria de Estado de Saúde”. A nota informou ainda que havia crianças apresentando sintomas de amigdalite, febre, vômito, manchas ou erupções na pele, que passaram, em sua maioria, por avaliação médica nas redes pública ou privada e que estão sendo monitoradas pela equipe da Secretaria Municipal de Saúde. E orientava que, em casos de sintomas ou dúvidas, procurar a Unidade de Saúde de referência ou a mais próxima de sua residência e à UPA nos feriados e finais de semana.

No dia 23 de outubro, aconteceu o terceiro óbito em São João del-Rei: uma criança em idade escolar. A partir daquela segunda-feira, a cidade ganhou destaque estadual e nacional. Com a terceira morte de criança, os pais começaram a se movimentar e a cobrar explicações às autoridades competentes. Em meio a muitas especulações, um comunicado interno da Secretaria Municipal de Saúde vazou e começou a circular nas redes sociais. Datado em 16 de outubro, o documento trazia informações de que os laboratórios municipais estavam realizando pesquisa sobre a bactéria Streptococos do grupo A. Mais um temor para os responsáveis.

Ainda na segunda-feira (23), foi realizada uma reunião entre as pastas responsáveis pela saúde no município, com a Gerência Regional de Saúde, para investigar as causas das mortes das crianças. Com muitas especulações, além de mães e responsáveis relatando que crianças estavam com os mesmos sintomas, como febre, tosse, manchas no corpo, uma manifestação foi realizada na manhã de terça-feira (24), na Câmara Municipal.

Durante a terça-feira, os protestos ganharam força e o setor de epidemiologia do município compareceu à Câmara Municipal. Em meio a cobranças, a primeira confirmação de uma criança infectada pela bactéria Streptococcus no município. Uma criança que estava internada na Santa Casa de Misericórdia, que viria a ganhar alta no dia 24.

Suspensão de aulas

 Com pedidos exaltados por explicação, a prefeitura de São João del-Rei decidiu suspender as aulas até, pelo menos, o dia 05 de novembro. O Secretário Municipal de Educação, Delço José de Oliveira, falou sobre a decisão. “Nós tivemos uma reunião contando com a presença da Superintendência, do Secretário de Saúde e outras pessoas. Acordamos a possibilidade de fazer a suspensão das aulas a partir do dia 24 de outubro até o dia 5 novembro, com o retorno definido para o dia 6”.

A decisão foi seguida pela prefeitura de Santa Cruz de Minas, que suspendeu as aulas por tempo indeterminado. Tiradentes também suspendeu as aulas por dois dias. Outras cidades da região seguiram a mesma medida: Conceição da Barra de Minas e Ritápolis. Ambas as cidades realizaram trabalho de desinfecção nas escolas municipais.

O estado, no entanto, não entendeu a necessidade de suspensão de aulas e emitiu uma nota informando que acompanhava junto à Unidade Regional de Saúde e à Prefeitura Municipal de São João del-Rei os casos de óbitos registrados na cidade. A Pasta não via critérios que comprovem surto ou risco à saúde da população são-joanense, bem como nenhuma evidência epidemiológica que justificasse a alteração na rotina das atividades da população. Mas, como ação, o estado ministrou um treinamento, na quarta-feira, dia 25, direcionado aos profissionais de saúde, instruindo-os sobre como detectar casos de amigdalite bacteriana.

Compra de testes rápidos e plantão pediátrico

 Para tentar identificar de forma mais rápida doenças causadas pelas bactérias, a Secretaria de Saúde de São João del-Rei comprou 3.700 testes rápidos para serem usados em crianças com sintomas da doença. Os teste começaram a ser aplicados apenas no dia 06 de novembro.

Diante da situação, a prefeitura realizou tentativas de contratações de mais um médico para atender na UPA (Unidade de Pronto Atendimento) do município, que naquela altura já atendia a um grande número de crianças. Cerca de 150 crianças foram atendidas entre sábado e quarta-feira. Todas elas com sintomas parecidos: dor de garganta, febre, tosse, erupções pelo corpo. O alto número de atendimentos foi destacado pelo diretor geral da UPA, José Luiz Resende, ex-secretário de saúde de Resende Costa. “Desde sábado (21), temos observado esse aumento.” De acordo com o diretor, em uma semana foram mais de 200 atendimentos, com um média diária de 30 atendimentos.

Com a morte de três crianças, ainda sem causas definidas, a necessidade de um plantão pediátrico ganhou forças no município. E protestos foram realizados. O prefeito municipal de São João del-Rei, Nivaldo José de Andrade, se pronunciou, pela segunda vez durante a semana, para falar sobre o plantão pediátrico. “Eu estive em Brasília e o dinheiro já está na conta, nós conseguimos um milhão de reais para o plantão pediátrico, mas acontece que não há médicos. A gente está precisando de pediatra para os nossos filhos e não consegue. No plantão, a gente paga R$2.500.00 e ainda assim não acha profissionais”, destacou o prefeito.

Secretaria Estadual se pronuncia e descarta morte pela bactéria Streptococcus pyogenes

 Em meio às investigações, o Secretário Estadual de Saúde, Fábio Bacheretti, descartou a causa da morte da 3º criança são-joanense pela bactéria Streptococcus pyogenes. “A análise bacteriana dentro da FUNED (Fundação Ezequiel Dias) para saber qual a bactéri, gera algum tempo, alguns dias. Na análise, colocamos numa placa a amostra e vemos nessa análise qual é a bactéria ou o patógeno correspondente. Fazemos alguns testes relacionados a isso. Por enquanto, nesse prazo que nós já temos, não foi identificada nenhuma bactéria. Já foram excluídas algumas, como, por exemplo, a Streptococcus pneumoniae, que é uma bactéria que pode causar doenças da orofaringe e também do pulmão. Nós estamos analisando hemófilos também, que são bactérias para as quais há vacina. Quanto à meningite, avaliamos outros vírus que podem causar sintomas parecidos. Por enquanto, não houve nenhum crescimento de nenhuma dessas bactérias. Estamos acompanhando, mas o que é importante dizer é que a relação do Streptococcus, por causa de uma paciente que internou e já teve alta, ou seja, o antibiótico matou a bactéria, não tem como a gente achar que (o Streptococcus) foi a causa do outros óbitos”.

Até o fechamento desta edição, as investigações sobre as causas das mortes de três crianças em São João del-Rei, entre 24 de setembro e 23 de outubro, continuavam sendo realizadas pela Prefeitura Municipal de São João del-Rei e acompanhadas pela Secretaria Estadual de Saúde.

*Entrevistas realizadas pela Rádio Emboabas + Informação – 92,7.

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