Resende Costa faz parte de uma realidade brasileira: a “epidemia” de cesáreas


Saúde

Vanuza Resende0

O Brasil pode ser considerado um dos países que mais fazem cesáreas no mundo. Os dados do Governo Federal são alarmantes: na rede pública, 40% dos partos são cesáreas, enquanto na rede privada o número sobe para 84,6%. Porém, de acordo com informações do Ministério da Saúde, os partos normais voltaram a ganhar espaço no País. Os dados mais atualizados do órgão mostram que dos 3 milhões de partos em 2015, 55,5% foram cesáreas e 44,5% normais. Há alguns anos, campanhas do SUS têm conscientizado e incentivado as mães a optarem pelo parto normal.

O parto normal é por via vaginal e é um pouco mais demorado do que a cesariana. Na verdade, a cesariana foi  uma grande conquista da medicina e criada para salvar vidas. O que passou a ocorrer, no entanto, foi que o procedimento começou a ser usado não somente em momentos delicados em que necessitasse de fato de uma intervenção cirúrgica. O procedimento começou a ser agendado e se tornou desejo das mulheres que pensam que dessa forma não vão sentir dor. Agendar pode significar bebês nascidos antes da hora e com problemas associados à prematuridade. A cesariana, que seria algo para facilitar, se torna, nesses casos, uma frustração para as mães.

Muitas vezes, o parto normal  é mais complexo de administrar e, portanto, menos interessante de atender. Por isso, para os hospitais é mais viável fazer uma cesariana, que tem um tempo estimado para entrar e sair da sala de cirurgia. Assim, o médico pode prever a quantidade de partos a ser realizada no seu turno de expediente.

No entanto, o método não deve ser prioridade, como explica Luiz Antônio Pinto, médico no Hospital Nossa Senhora do Rosário, de Resende Costa, desde 1986, e que ao longo de três décadas é responsável, ao lado de Paulo César Fortuna Dias, pela grande maioria dos partos realizados no hospital. “A cesárea é droga que você injeta no líquido espinhal da paciente. Assim, há risco de acidente, de infecção, de drogas que vão para o bebê durante o parto. Então, cesárea é algo agressivo”.

Luiz acredita que a opção pelas cesarianas é cultural: “No passado não tinha cesáreas. Veja os exemplos de índios. Você acha que morre todo dia um índio no parto? Não morre. Eles desenvolveram técnicas de parto normal, uma coisa natural e cultural deles. As interferências do homem, da ciência e da modernidade acabam levando a uma cirurgia que é sempre uma agressão. Pode ser para o seu bem, necessária, mas é uma agressão”.

 

Resende Costa

Em Resende Costa, 51% dos nascimentos nos anos de 2008 a 2015 foram através de partos normais, segundo dados da Secretaria Municipal de Saúde. Como quase todos os partos são realizados pelo Sistema único de Saúde (SUS), a média da cidade está um pouco acima da média do país e longe do proposto pela Organização Mundial da Saúde (OMS), que estima que somente 15% dos partos sejam realizados por meio de intervenção cirúrgica. Em 2016, a cidade seguiu a média dos anos anteriores. Dos 131 partos, 63 foram cesarianas (48%) e 68 normais (52%).

Nos últimos anos, a decisão da paciente pela cesariana aumentou, como explica Luiz: “Nós temos quase que um assédio por fazer cesáreas em, até mesmo, casos que não haveria necessidade. O que eu acho até errado, porque a educação é no sentido do parto normal, que é o correto”.

Durante o pré-natal são feitos aconselhamentos para a paciente optar pelo parto normal, mas nem sempre as orientações dos profissionais são seguidas: “O parto normal é o que a medicina ensina e mostra como o mais natural. Uma série de fatores influencia no não cumprimento das metas de 10% a 15% de cesáreas e o restante de partos normais. Exemplos: se uma paciente já teve uma cesárea, obviamente o segundo, o terceiro vão ser cesáreas”, comenta o médico.

Luana Chaves Pinto, 23 anos, está no sétimo mês da sua primeira gestação e se prepara para ter um parto normal, influenciada por boas experiências na família: “A recuperação do parto normal é melhor. Minha mãe teve quatro partos normais e minha sogra também teve dois. Minha avó teve seis filhos e as cinco primeiras gestações foram parto normal. A última foi uma cesariana e ela fala que os partos normais foram muito melhores”. Luana está ciente de que no momento do parto, talvez, seja necessária uma cirurgia: “Se não tiver passagem, tiver que ser cirurgia, então será. Independente do parto, se for normal ou cesárea, tem que ter a recuperação depois. O resguardo é importante para que não se tenha complicações após o parto”.

Não é o mesmo pensamento de Liliane Resende, 21 anos, grávida de 3 meses, e traumatizada por uma gestação que não foi bem sucedida. Ela já decidiu qual tipo de parto escolher: “Cesariana, pois tive um aborto e tive que fazer duas curetagens e, pela dor que senti, não quero arriscar o normal não. Me disseram que é meio parecido, aí eu optei pela cesariana”.

 

Alternativas

Medidas para diminuírem o número de cesarianas desnecessárias estão sendo elaboradas. Em 2016, por exemplo, foi publicado um Protocolo Clínico de Diretrizes Terapêuticas para Cesariana, trazendo os parâmetros que devem ser seguidos pelos serviços de saúde e tentando derrubar o mito de que a cesariana é mais segura que o parto normal. No entanto, desmitificar algo que criou raízes culturais não é uma tarefa fácil.

Para Luiz Antônio Pinto, além de ser cultural, desde que o SUS autorizou o acompanhante durante o trabalho de parto, as cesarianas aumentaram: “O lado bom dessa medida é porque é um direito. O marido, a mãe ficam perto da gestante. O problema é que, como as pessoas são leigas, elas não conhecem o trabalho de parto. Ora, o trabalho de parto pressupõe dor. Contração é dor. Aí, os familiares fazem pressão para que o parto seja cesárea. A experiência mostra que, se o índice de cesárias tem aumentando, em parte muito significativa isso se deve à pressão familiar, em função de não querer que exista dor”.

Deixe um comentário

Faça o login e deixe seu comentário