SJDR: aumenta participação das vítimas de covid-19 no total de sepultamentos

Veja ainda os comentários sobre diferentes aspectos da pandemia do pesquisador Renato Mancini Astray, do Instituto Butantan de São Paulo.


Saúde

José Venâncio de Resende0

Cemitério Municipal de São João del-Rei (foto: José Antônio de Ávila).

Desde o início da pandemia, foram sepultados 482 corpos no Cemitério Municipal do Quicumbi, em São João del-Rei, dos quais 63 foram vítimas da Covid-19. Em pouco mais de um mês (até 2 de junho), foram 34 sepultamentos (14 por Covid-19). Até 29 de abril, foram registrados, respectivamente, 448 e 49 cadáveres. Isto significa que o percentual de sepultamentos por Covid-19 aumentou de 10,94% para 13,07% do total; as mortes por “causas naturais” caíram para 86,93%.

As informações constam do livro de registros da administração da Funerária Municipal e do Cemitério. Estes dados não incluem o Cemitério São José, pertencente à Irmandade de São José e responsável por parte de sepultamentos “de chão” da prefeitura, e seis ou sete cemitérios particulares.

Segundo a diretora da Funerária Municipal, Beth Silva, entre as chamadas “causas naturais” dos óbitos que chegam ao Cemitério, destacam-se “problemas relacionados com o aparelho respiratório – às vezes, agora por causa do inverno, pneumonia, insuficiência respiratória, mas que não é Covid; e, infelizmente, o infarto tem ocasionado bastante óbitos aqui no Cemitério Municipal”.

Dados subestimados?

Embora à primeira vista pareça que haja subestimação dos dados da Covid-19, Renato Mancini Astray, pesquisador do Instituto Butantan de São Paulo, alerta: “Isso é mais fácil de investigar através do número de casos.” Ele cita Wuhan (China) onde, no início, morriam 3% dos infectados. “Isso caiu para 0,5% com bom tratamento.” No caso do Brasil, a taxa de mortalidade está em 176/100.000 habitantes: em média 2,7% dos infectados morrem, acrescenta Renato Astray.

“Então, salvo casos catastróficos como o de Manaus, qualquer valor muito diferente desses acima, aplicados à população da cidade ou aos casos registrados, deve estar errado. Também devem considerar-se os relatos de que as mortes por várias causas aumentaram, porque as pessoas deixaram de ir aos serviços de saúde, que é um dos locais onde mais se contrai a doença.”

Segundo pesquisador do Butantan, algo parecido pode estar ocorrendo com os dados da Organização Mundial de Saúde (OMS). Relatório da agência das Nações Unidas, divulgado em 21 de maio em Genebra (Suíça), mostra que os números oficiais de mortes atribuídas direta ou indiretamente à pandemia de Covid-19 (cerca de 3,4 milhões de pessoas até maio) provavelmente estão significativamente subestimados. Este número na verdade seria de duas a três vezes maior, entre 6 milhões e 8 milhões de pessoas, disse Samira Asma, diretora-geral-assistente da OMS na divisão de dados e análises.

“Tendo a acreditar nisso, sim”, diz explica Renato Astray. “A OMS trabalha com dados e muita estatística. Então, quando coletam dados, vamos dizer de São Paulo, e estes estão muito diferentes do Rio de Janeiro, eles vão checar e normalmente é possível verificar se há probabilidade da informação estar errada com base em estatísticas de cidades semelhantes.”

“Excesso de mortes”

Já a revista britânica The Economist aponta 10 milhões de mortes em 2020 e 2021, além do que normalmente ocorria nos anos anteriores. Este total de “excesso de mortes” inclui as subnotificações das mortes por Covid-19. “Os estudos da OMS e da Economist nos fazem entender e dimensionar porque existe tanta imprecisão nas estatísticas de mortes causadas por epidemias”, diz o economista Aluizio Barros em comentário no facebook.

A estimativa de “excesso de mortes” é um trabalho objetivo com números de mortes num país em determinado período, em relação ao número médio de ocorrências, alerta  Barros. “Esse excesso de mortes ocorre por causa das mortes da Covid confirmadas, das mortes pela Covid não confirmadas (apenas suspeitas) e das mortes por outras causas. Há países onde o excesso de mortes foi negativo. Isto é, o número total de mortes é menor que o registrado antes da pandemia. Explicação: com o isolamento das pessoas na pandemia, as outras doenças não se manifestaram. Por que isto aconteceu? Porque as medidas de distanciamento social para evitar a Covid-19 reduziram a ocorrência de mortes por outras causas (pneumonia, acidentes de trânsito, etc.).”

Depois da morte

Uma questão pouco abordada é a permanência do coronavírus nos cadáveres depois de serem sepultados, o que geralmente ocorre em áreas exclusivas. O vírus sobrevive à decomposição dos corpos? Em caso, por exemplo, de exumação de corpo, cuja causa mortis tenha sido a Covid-19, há algum perigo de contaminação? Há necessidade de procedimentos especiais?

Para o pesquisador Renato Astray, do Butantan, “a exumação feita após, digamos, uma semana não deve oferecer riscos. O vírus depende das células vivas para se propagar. Trata-se de uma estrutura frágil, facilmente inativada, contendo material genético lábil. Não vejo risco de contaminação na exumação”.

Falta coordenação

Uma das principais críticas ao governo federal, de um país continental como o Brasil, é pela falta um plano nacional, o que dificulta o combate à pandemia e facilita a propagação de variantes (britânica, indiana, sul-africana, de Manaus etc.). Na medida em que não se fecham fronteiras entre Estados, não há saída sem coordenação, acredita o pesquisador Renato Astray. “Mesmo os lockdowns são muito mais penosos, porque é como você varrer a sua calçada e o vizinho não. Aquelas folhas vão acabar vindo para a sua calçada também.”

Para o pesquisador do Butantan, “a coordenação central seria importantíssima pois estabelece a política de enfrentamento, os protocolos de prevenção e tratamento. As ações em um país qualquer, mas especialmente em um país grande, são dos agentes locais, pois o combate é no corpo a corpo, não é borrifando veneno de avião como se mata uma praga da lavoura. O problema é que a coordenação central do Brasil focou em algo totalmente tosco e fora do que o mundo estava fazendo. Então, obviamente que ninguém deu crédito e começou essa bagunça”.

“Descoberta impressionante”

Estudo coordenado pela Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz ), sobre a origem do coronavírus, acaba de ser divulgado. “Um vírus ancestral, que infecta seres humanos há milhares de anos, está sendo ativado pelo coronavírus, Sars-CoV-2, e aumentando o número de mortes por Covid-19 em pacientes graves.”

“É uma descoberta impressionante”, reconhece Renato Astray, do Butantan. “As evidências que eles apresentam são bem grandes. Creio que o estudo ainda está em revisão. Vale esclarecer que não é o outro vírus que é, digamos, revivido, ou ressuscitado, é uma parte dele, desse vírus ancestral. Essa enzima pode estar ligada a alguma função que o organismo humano incorporou, por ser uma vantagem evolutiva.”

Embora ainda não se tenha certeza sobre o papel dessa enzima, o estudo poderá trazer novos conhecimentos úteis à humanidade, acredita o pesquisador do Butantan. “O estudo pode servir para definir essa enzima como um novo alvo terapêutico ou para mapear as pessoas com altos níveis basais de expressão ou a localização do gene em determinado ponto do genoma que indiquem que essa pessoa tem maior chance de ter complicações, como uma comorbidade.”

LINKS RELACIONADOS:

https://www.jornaldaslajes.com.br/integra/sjdr-1094-dos-sepultamentos-no-cemiterio-municipal-sao-covid-19/3339

https://www.swissinfo.ch/por/n%C3%BAmero-global-de-mortes-por-covid-19-pode-estar-seriamente-subestimado--diz-oms/46638398?fbclid=IwAR2N8upstzHp7lkmHHUGJpjsWjwSqPxajXzEJRM2dxnu2kMHfEMtyWf6MHM

 

 

 

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