Zezinho do Célio: de “louco catador de lixo” a referência ambiental em Resende Costa

O catador estima que desde 2001 já recolheu mil e trezentas toneladas de plástico e papelões


Perfil

Vanuza Resende0

Há 17 anos Zezinho percorre todo o centro de Resende Costa com sua carrocinha para recolher materiais recicláveis. (Foto Vanuza Resende)

José Teodoro Ramos, popularmente conhecido como Zezinho do Célio, faz parte das figuras populares de Resende Costa. Nascido em São João del-Rei, mudou-se para a cidade ainda criança. Durante a sua adolescência, ajudava o pai em uma oficina mecânica. Zezinho já foi narrador de futebol em jogos locais e por mais de 50 anos transformou-se no palhacinho que comandava o Bloco das Crianças no Carnaval.  Durante 30 anos foi alcoólatra. Segundo ele, teve dias em que consumiu três litros de pinga. Hoje, orgulha-se de não ser viciado em bebidas alcoólicas. Figura extremamente simples, carrega uma experiência vasta do mundo. Já viajou por vários lugares e usa as experiências adquiridas para melhorar o ambiente em que vive.

Quem passa pela Rua Moreira da Rocha, no centro de Resende Costa, pode observar a garagem do Zezinho repleta de papelões e plásticos. Além disso, uma placa anuncia a venda de húmus produzido na horta e na cozinha da sua casa.

A ligação com a sustentabilidade vem de anos, mas a inspiração para se tornar catador de materiais veio depois que voltou de uma viagem, há 16 anos. “Eu fiz uns passeios para fora, um lugar chamado Pantanal. Eu fiquei três meses e notei que o meio ambiente lá acabou. É garrafa para todo lado, é plástico espalhado para tudo quanto é canto. Eu vim para Resende Costa e notei que aqui já estava indo para o mesmo caminho. Aí eu arrumei uma carrocinha de pedreiro e comecei a fazer a limpeza da cidade.” Zezinho conta que no início a população ficou receosa com o seu trabalho. “Quando você vem com uma novidade dessa, você é considerado louco. ‘Olha lá o catador de lixo, olha o porco catador de lixo!’Mas eu não estou nem aí. Mas isso foi há 16 anos”, recorda-se o resende-costense.

Atualmente, Zezinho se considera um “microempresário sustentável”. “Eu já tirei aqui em Resende Costa aproximadamente 1.300 toneladas de recicláveis. Agora imagina: e se essas toneladas fossem para o lençol freático? Isso eu já falei várias vezes, a água iria acabar”, afirma Zezinho.

A renda certamente não é o principal objetivo de Zezinho. O catador recebe em média R$600,00 mensais. “E dinheiro?! Dinheiro, não tem dinheiro não, gente. Eu vendo uma tonelada de papelão por cem reais. Se você pensar pelo trabalho que a gente tem, não vale. Porque o dinheiro é porcaria, mas o homem sem dinheiro é pior ainda. Então, o que acontece é um mal necessário. Porque sem dinheiro não se sobrevive.”  

Com a prática adquirida, Zezinho consegue identificar os materiais e faz a separação nos locais onde os recolhe. “São quatro tipos de materiais que a gente recolhe. Tem o marrom, que é o papelão das caixas; tem o papelão miúdo, o plástico branquinho - que é o pior para a natureza -, e o plástico colorido. Eu já deixo tudo separado, o comprador quando leva já está tudo separado. Pelo meu modo de entender, o papelão vai virar papelão outra vez e isso vai evitar que a gente corte as florestas, igual eles estão querendo fazer lá na Amazônia.”

O material recolhido é vendido bimestralmente para uma empresa de São João del-Rei. Para não acumular pragas no lixo acumulado, Zezinho usa técnicas. “Eu tenho um combate. Por exemplo, a praga do papel é o rato, eu combato. No princípio, eu estava dando bobeira e eles (pragas) começaram a querer invadir. Mas eu espaventei e eles não voltaram mais”, garante o catador.

 

Apoio da população

De 2001 para cá, essa história de doido catador de lixo se tornou uma referência para Resende Costa. No comércio do centro da cidade, as caixas são reservadas para a carrocinha do Zezinho, que não falha em sua missão de deixar a cidade limpa. Pelo serviço prestado, Zezinho já foi convidado, inclusive, para palestrar durante duas missas na igreja em 2017 sobre o tema da Campanha da Fraternidade: “Biomas Brasileiros e a Defesa da Vida”.

O catador fica satisfeito em saber que a preocupação e os cuidados com os resíduos produzidos na cidade são bem maiores que há 17 anos. “Todo mundo está ciente de que, se não cuidar e catar o material, não dá. Olha o trabalho: o povo produz e a gente cata, a gente limpa. Se não fizer isso, vai virar uma bagunça. Hoje já tem os companheiros do caminhão da reciclagem que fazem um trabalho brilhante. Tem o caminhão do lixo que leva os materiais para a usina em Sabará (usina de compostagem). Esse é o conjunto, né?”

Com 66 anos, Zezinho não pensa em parar. Pelo contrário, ele gostaria de expandir seu trabalho para toda a cidade, utilizando, porém, uma carrocinha mais elaborada. “Tem dia que são seis carrocinhas dessa de geladeira e eu não dou conta, uai! Eu pego o serviço às 6h e 30min e tem dia que eu vou parar às 20h. Eu não aguento fazer mais do que isso. Eu penso em fazer uma (carrocinha) motorizada, porque com uma carroceria eu conseguiria rodar os bairros todos.”  

No fim da nossa conversa, Zezinho mencionou sua inspiração política, Fidel Castro, para dizer que vai continuar sendo o catador de materiais recicláveis de Resende Costa. “Eu não entrego não. Porque lá na Ilha (de Cuba) ele só entregou depois de morto. A história me absolverá”, afirma Zezinho do Célio. Ele conclui agradecendo: “Eu agradeço e parabenizo todos os meus companheiros da reciclagem, da limpeza da cidade e os meus fornecedores”.

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