Foi de craque no ofício o discurso do ex-governador mineiro Aécio Neves por ocasião do lançamento da candidatura de José Serra à presidência da República. Batalhador de primeira hora pelo “pós-lulismo”, aceitou em seu discurso o desafio de comparar os governos FHC e Lula, que os tucanos sempre relutaram em (ou não tiveram competência para) fazê-lo. Aécio nem mesmo se furtou a defender as privatizações, condenadas por Lula (candidato à reeleição) e rejeitadas por Alckmin (candidato da oposição) nas eleições passadas. É assustador como o sr. Lula, no alto da sua popularidade, vende aos brasileiros uma idéia ultrapassada (e enganadora) de papel do Estado que só interessa a aliados e companheiros oportunistas (o que o ex-presidente FHC chama de “capitalismo de Estado sem competição”). Exemplos? 1) A proposta do governo em substituir a partilha pela concessão na produção do petróleo da camada do pré-sal, com a retomada do monópolis da Petrobras (desvio de dinheiro público de funções nobres como educação e saúde para investimento em produção que poderia ser feito pelo setor privado). 2) A concessão de rodovias federais pelo menor preço do pedágio (as concessionárias não cumpriram o combinado e ainda fazem pressão para a revisão do valor, o que mantém em estado lastimável as rodovias federais). 3) A tentativa megalomaníaca de criar um plano nacional de banda larga para a internet controlado inteiramente pelo Estado (inclusive com a ressurreição da antiga Telebrás ou criação de outra estatal), projeto este emperrado por absoluta irracionalidade. 4. O plano de concessão de aeroportos continua engavetado pela Infraero, porque o governo tem medo de ser acusado de privatista, e enquanto isso o sistema aeroportuário nacional continua um caos com ameaça inclusive à segurança dos passageiros.
Sinuca de bico - O governo brasileiro está numa sinuca de bico. Para enfrentar a crise mundial em 2009, obrigou os bancos oficiais a abrir as comportas do crédito a juros menores e promoveu redução de impostos para setores como veículos e eletrodomésticos, tudo para estimular o consumo interno. A tal “política anticíclica” contribuiu para que o país ultrapassasse com relativa tranquilidade a fase mais aguda da crise. Só que o governo não teve o mesmo sucesso na política industrial de aumentar investimentos no setor produtivo. Com isso, o país está com a economia aquecida (o consumo crescendo a todo vapor), mas não tem capacidade instalada suficiente para atender à demanda. Assim, espera-se aumento desproporcional de importações e inflação acima da meta, obrigando o Banco Central a cumprir o seu dever, independente das pressões políticas pré-eleitorais. Os aumentos previstos este ano na taxa de juros para segurar a inflação devem desaquecer o crescimento da economia (produção e consumo) em 2011. A ironia é que, ao fazer a sua parte, o Banco Central acabará por beneficiar eleitoralmente o sr. Lula e sua candidata, dona Dilma, uma vez que a economia brasileira deve crescer cerca de 6% este ano, na visão da maioria dos especialistas. No campo econômico, este é um ciclo vicioso já presenciado outras vezes.
A ficção dos Bric – A sigla “Bric”, criada pelo economista britânico Jim O´Neill para os países promissores do século XXI (Brasil, Rússia, Índia e China), não tem qualquer significado pois estes países nada tem em comum, a não ser o futuro promissor. Falou-se muito nos Bric nos últimos dias, por conta da presença dos seus dirigentes no Brasil. O problema é que o governo do sr. Lula dá muito mais importância aos Bric do que eles de fato tem e os demais países do grupo admitem. A China, por exemplo, faz jogo duplo na medida em que seus interesses são múltiplos e estão ligados inclusive aos dos Estados Unidos e demais países desenvolvidos. Nas relações com o Brasil, a China está de olho no mercado para seus produtos industrializados e em assegurar o fornecimento de matérias-primas, como o petróleo, minério e soja para o seu parque industrial. Já a Rússia poderia servir de exemplo para o Brasil do que não se deve fazer. Ou seja, o país optou pela combinação entre economia arcaicamente estatizada e excessiva dependência da exportação de petróleo e minérios. Com isso, o país ficou vulnerável a crises financeiras globais como a última e tem um futuro não muito animador.
Diplomacia de alto risco - O Brasil caminha para um confronto com os Estados Unidos por uma causa no mínimo questionável. O presidente Barack Obama lidera uma campanha para enquadrar o Irã, do sr. Ahmadinejad, antes que o país embarque nas armas nucleares. Já o Brasil defende o direito do Irã de desenvolver o seu programa nuclear para fins pacíficos, como se fosse possível acreditar nas boas intenções de um regime ditatorial. No fundo, a diplomacia do sr. Lula busca uma liderança internacional a qualquer custo, aliando-se com governos ditatoriais e defendendo pretensos oprimidos. O que está por trás dessa diplomacia agressiva do sr. Lula? Interesse em algum cargo internacional como o de secretária geral da ONU? Sonho em conquistar o prêmio nobel da paz? O risco é o país pagar um preço alto (do isolacionismo ou da pilhéria) por uma diplomacia no mínimo irresponsável, quaisquer que sejam as intenções.
Empacado - A segunda etapa do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC 2), também apelidado de “Programa de Aceleração da Campanha Eleitoral”, é mais uma forma de enganar o eleitor. O PAC 1, que poderia ser chamado de “Empacado 1”, teve apenas 11% das obras acabadas depois de três anos de lançamento. Mais da metade dos projetos nem saiu do papel. O primeiro PAC é uma fraude e o governo não tem dinheiro para o PAC 2. De duas, uma: ou o governo quebra as finanças públicas para arranjar recursos para estes investimentos ou é mais uma promessa de campanha eleitoral. Essa gente não tem compromisso com a verdade. Quer usar dinheiro do contribuinte para vitaminar as atuais estatais (Petrobrás, Eletrobrás, Banco do Brasil, BNDES e Caixa Econômica Federal) e criar futuras empresas como Telebrás, Petrossal e estatal de fertilizantes, fonte de empreguismo e de favores políticos. E agora lança o PAC 2, cuja maior parte é formada de investimentos da Petrobras que se sustentam independente da ação do governo. Para os demais penduricalhos do PAC 2, a pergunta é: de onde sairão os bilhões de reais para investimentos, se a máquina pública já está toda dominada e o setor privado foi colocado numa camisa de força?
Palanque proibido - Agora que os principais candidatos deixaram seus cargos para disputar a próxima eleição, seguir seus passos exige muito mais cuidado. Há um movimento exótico por aí para que os candidatos possam participar de inaugurações de obras públicas, principalmente nesse período de limbo em que viverão até a indicação de seus nomes em convenção. Aí é que mora o perigo. Imaginar candidato subir em palanque de inaugurações de obras e ficar calado, ou não ser citado ainda que por insinuação, é acreditar em Papai Noel. Da mesma forma que dizer que o sr. Lula vai fazer campanha fora do expediente, sem usar a máquina pública, é conversa pra boi dormir. Considerando a falta de escrúpulos de determinados políticos, inclusive no exercício do cargo, a vigilância deve ser redobrada para se evitar que a lei seja atropelada a todo o momento.
“Lei, ora lei” - As duas multas aplicadas ao presidente Lula pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), apesar dos valores simbólicos (R$ 5 mil e R$ 10 mil), confirmam as reclamações da oposição de que o grande líder usa o cargo público para fazer campanha deslavada em favor da sua candidata, dona Dilma. Novas (e talvez mais salgadas) multas podem vir por aí, porque o sr. Lula não apenas fez chacota da punição nos palanques e em frente às câmaras de TV como também continua desafiando a lei que proíbe campanha fora de época. Até a camisa vermelha do PT ele exibiu em palanque em pleno horário de trabalho, ao lado de sua candidata. Não é porque ele é o presidente da República e tem alta popularidade que está acima da lei, que pode sair por aí de maneira desafiadora usando cargo e dinheiro públicos para promover dona Dilma. Isso faz lembrar o ditador Getúlio Vargas, que desdenhava a lei com a famosa e triste frase: “lei, ora a lei”. Mas isso foi na primeira metade do século XX, e nós já estamos no século XXI.
Intolerância – Governantes e candidatos agora se acham no direito de pautar a imprensa. Deram para reclamar que a imprensa não publica suas inaugurações ou aquilo que eles consideram relevante. O problema é que os políticos, principalmente em época de eleição, na ânsia de aparecer na televisão ou nas páginas dos jornais lançam maquetes e pedras fundamentais ou inauguram obras inexpressivas e incompletas, quando não irregulares como aquelas sob suspeita do Tribunal de Contas da União (TCU). Tirante a falta de maturidade de governantes e políticos de países não-desenvolvidos em conviver com a liberdade de imprensa, inaugurar obras ou melhorar os serviços à população é obrigação de governantes, e não necessariamente notícia. Observem que políticos de países desenvolvidos, como Estados Unidos, Alemanha, França e Inglaterra, não reclamam da imprensa, porque nestes países a liberdade de imprensa é um valor consagrado.
Prende e arrebenta – Enquanto aqui os governantes fazem “chororô”, na Venezuela o ditador Hugo Chávez não precisa reclamar da imprensa porque lá ele simplesmente prende dono de TV, cassa concessão de emissoras, exige rede de rádio e TV para seus longos e chatos discursos e censura meios de comunicação em geral. Em outras palavras, segue a política do falecido general João Figueiredo, último presidente da ditadura militar brasileira, que era adepto do “prendo e arrebento”. Pobre Venezuela, cujos cidadãos viraram insetos sob as botas do sr. Chávez.
Desmascarado - A decisão da Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) de multar Furnas em R$ 54 milhões, por causa do apagão elétrico de 10 de novembro do ano passado que deixou 18 Estados sem luz, mostra duas coisas: o governo mentiu ao insistir que o apagão foi causado por chuvas, ventos e raios fortes na região de Itaberá, no interior de São Paulo; e fracassou a política do governo no setor de energia, pela qual o aparelhamento da Eletrobrás, o fortalecimento da estatização e a falta de estímulo aos investimentos privados agravaram a situação. Uma conseqüência disso é que aumentaram os riscos de abastecimento e distribuição de energia e o crescente uso das termoelétricas, mais caras e mais poluidoras. Imaginem então se as agências reguladoras, como Aneel e Anatel, tivessem livre do cabresto político do governo para cumprir o seu papel?
Banda estreita - Estudo feito pelas universidades de Oxford e de Oviedo coloca a banda larga brasileira entre as piores do mundo. Faltou dizer que é uma das mais caras do mundo, por causa principalmente da alta incidência de impostos. Também falta fiscalização da atuação das operadoras do setor, já que a Agência Nacional de Telecomunicações (ANATEL) foi esvaziada nas suas funções e aparelhada por companheiros e aliados do sr. Lula. E o pior é que governo tentou resolver o problema ressuscitando a velha e falida Telebrás ou criando nova estatal. Pelo visto, desistiu da aventura.
A jogada de craque de Aécio Neves
19 de Abril de 2010, por José Venâncio de Resende