O aprofundamento da crise política e econômica não deixa muitas alternativas ao governo da presidente Dilma Rousseff. A salvação está em ampliar e diversificar a presença no mercado internacional. A porta de saída é o porto!
Nos últimos meses, dona Dilma resolveu correr atrás do prejuízo, ou das oportunidades, depois de vários anos de equívocos ideológicos. E decidiu procurar justamente países e regiões que os governos petistas sempre desdenharam. Fato é que a presidente Dilma só se interessou pela agenda internacional agora que a água chegou ao nariz.
A primeira visita foi ao México, para incrementar o comércio e assinar acordos de investimentos. Na sequência, participou da reunião de cúpula, em Bruxelas, entre União Europeia (UE) e Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos (CELAC), quando tratou de pendências relativas ao Mercosul.
Nos Estados Unidos, dona Dilma reuniu-se com empresários e com o presidente Barack Obama, com o intuito de atrair investimentos e assinar acordos de cooperação em áreas como educação, tecnologia/inovação, energia e mudanças climáticas.
Entre as duas últimas viagens, dona Dilma lançou um plano nacional de exportações, para aumentar produtividade, buscar novos mercados e fazer acordos internacionais, que valeu mais pelo discurso da presidente com ênfase em negócios “sem preconceitos" e “sem discriminar regiões”.
Se for além da solene troca de drinks entre seus presidentes (tequila por caipirinha), México e Brasil podem ampliar seu modesto acordo comercial, de 800 para 6000 itens, abrangendo, além de veículos, agricultura, serviços e contratos públicos.
Na Europa, prometeu que os países do Mercosul entregarão uma oferta de acordo de livre comércio com a União Europeia, ainda este ano. O governo brasileiro estaria disposto a avançar mesmo sem os intransigentes argentinos, de acordo com a ministra da Agricultura Katia Abreu.
Na reaproximação com os Estados Unidos, a prioridade de curto prazo é para medidas de facilitação do comércio, segundo o ministro do Desenvolvimento, Armando Monteiro. Mas a grande expectativa do empresariado é que tenha sido dada a partida para um acordo de livre comércio entre os dois países, que faça deslanchar os negócios bilaterais cujo montante é bem inferior aos valores, por exemplo, de EUA com China e México.
Parece pouco, mas é uma mudança e tanto em relação à política de comércio exterior conduzida até aqui por governos petistas. Resta saber se dona Dilma terá condições para ir além das intenções, num momento turbulento de crise econômica aguda e crise política de governabilidade contaminando-se.
Desde que o ex-presidente Lula abortou a iniciativa de formação da ALCA (Acordo de Livre Comércio das Américas), o Brasil tem navegado por águas incertas da chamada “diplomacia comercial sul-sul”. A posição brasileira tem sido um tiro no pé na medida em que prejudica a sua indústria, incapacitada de ganhar novos mercados e em consequência melhorar sua eficiência. A recente aproximação entre Estados Unidos e Cuba vai fazer muito mais bem para o Brasil, do que o emaranhado de siglas (Mercosul, Unasul, Foro de São Paulo etc.), eivado de ideologia e preconceitos anti-americanos, em que o País se enroscou.
O Brasil e seus vizinhos latino-americanos não conseguem avançar em dois pontos-chave: 1) instalação de modernas indústrias de amplitude regional, com a implantação de cadeias de suprimento (peças e componentes produzidos em diferentes países da região); e 2) formalização de acordos de livre comércio para ampliar e diversificar negócios com outros países e regiões.
No primeiro caso, apenas 30% do “valor agregado estrangeiro” em exportações da América Latina – Brasil incluso – origina-se de outros países latino-americanos, ou seja, não há indústrias regionais com alta incorporação de tecnologia e inovação, segundo o Banco Mundial*. Apenas o México entre os latinos – integrado com os Estados Unidos – está “plugado” nestas cadeias de valor. Já 72% do valor agregado estrangeiro nas exportações de países europeus são intra-regionais. O equivalente para o Leste Asiático é 56%.
Em relação ao segundo ponto, o governo Lula apostou tudo nas negociações da “rodada Doha” (acordo multilateral que visa diminuir barreiras comerciais em todo o mundo, com foco no livre comércio) da OMC (Organização Mundial do Comércio), que, tudo indica, fracassou, apesar do esforço do seu atual diretor-geral - o brasileiro Roberto Azevêdo - para chegar a algum resultado positivo.
Nesse meio tempo, o governo brasileiro priorizou o Mercosul (que não é uma área de livre comércio mas um mercado imperfeito e protecionista); países africanos (para onde exporta principalmente serviços e obras das grandes empreiteiras que têm o ex-presidente Lula como “garoto propaganda”) e o mercado chinês (onde sacia a fome chinesa por matérias-primas em troca de importar bens industrializados), além de mercados pontuais como o russo.
Mesmo a tão “badalada” sigla BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) não chega a representar um ambiente de livre comércio – está mais para um clube de países emergentes, assim como o G-7 dos países desenvolvidos. Para além disso, contribui para reforçar as posições atuais dos seus membros, quer como exportadores de commodities (matérias-primas ou produtos básicos), quer como fornecedores de produtos industrializados, passando por políticas de crescimento com ampliação do setor industrial e modernização da infraestrutura (casos de Índia e China).
O Brasil até hoje não conseguiu assinar qualquer acordo de livre comércio que tenha alguma expressão, em termos de novas oportunidades (produtos de maior valor agregado, serviços, compras governamentais, investimentos, tecnologias). Enquanto isso, vão se estabelecendo, mundo afora, acordos comerciais como a Aliança do Pacífico (Colômbia, Chile, Peru e México), o Acordo Norte-Americano de Livre Comércio (Nafta, reunindo EUA, Canadá e México), a Associação de Nações do Sudeste Asiático (ASEAN) e a TPP (Parceria Transpacífica reunindo 12 países da Ásia e das Américas) - o presidente Barack Obama acaba de receber autorização do Congresso para negociar a adesão norte-americana ao TPP, o chamado “fast track”.
Está mais do que na hora de o governo libertar o Ministério das Relações Exteriores da perniciosa influência político-partidária. É preciso deixar que o Itamaraty conduza estas negociações com autonomia, de acordo com sua tradição e experiência. Estudos de universidades e organizações internacionais como a OMC mostram que mais comércio entre países e regiões gera mais riqueza. E não o contrário.
*Latin America´s economies Learning the lessons of stagnation. The Economist, 27 de Junho a 3 de Julho