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Crise econômica, credibilidade, expectativas…

05 de Marco de 2015, por José Venâncio de Resende

Professora Vera Rita, especialista em psicologia econômica

É sempre agradável e frutífero conversar com a professora Vera Rita de Mello Ferreira – primeira e maior especialista em psicologia econômica do Brasil – principalmente quando o local é o Parque da Água branca, na cidade de São Paulo. O momento também é oportuno, considerando que vivemos uma crise econômica (e política) que começa a bater recordes atrás de recordes negativos – uma espécie de herança maldita do petismo para o petismo.

Neste texto, procuro interpretar e sintetizar o papo que tive com a professora Vera Rita.

O quadro geral de pessimismo sobre o momento brasileiro é um mosaico que congrega fatos negativos como inflação, impostos e dólar em alta; produção, emprego e renda em queda; nível de confiança de empresários e consumidores em baixa; transações comerciais internacionais desfavoráveis ao País; denúncias de corrupção e aumentos abusivos de salários de políticos em todos os níveis da federação.

O que fazer diante desta situação? Aqui entra a opinião de Vera Rita, que trabalha com comportamento e expectativas. Tudo vai depender de como essas notícias negativas são apresentadas à população, assinala a especialista que é consultora independente, membro do NEC (Núcleo de Estudos Comportamentais da Comissão de Valores Mobiliários) e do Comitê de Pesquisa de Educação Financeira da OCDE (Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico), além de palestrante e professora da FIPECAFI (Fundação Instituto de Pesquisas Contábeis, Atuariais e Financeiras). Ela refere-se, evidentemente, à comunicação oficial, já que o governo não tem controle sobre a divulgação das informações pela imprensa.

Nesta “maneira” de como apresentar as informações à população, Vera Rita levanta uma questão muito importante que é a escolha inter-temporal. Se o governo for eficiente e convincente para mostrar que a austeridade proposta no ajuste econômico (corte de despesas e aumento de impostos) é parte de um movimento de curto prazo cujo resultado seria um cenário econômico futuro mais consistente, então talvez as medidas amargas desçam “menos quadradas”. Ou parafraseando a propaganda da Skol, desçam “mais redondas”.

As pessoas têm tendência – prossegue Vera Rita - a preferir no presente coisas boas, que não causem dor nem dissabor, “sem dar muita bola para o futuro”. Isto torna mais difícil convencê-las de que o sacrifício do presente se traduzirá em bem-estar no futuro. No caso da crise atual, a tarefa é ainda mais hercúlea pois mexe com comportamento e expectativas econômicos.

De qualquer forma, a margem de manobra é estreita. Daí porque, em primeiro lugar, é preciso crença e credibilidade por parte dos responsáveis maiores pela adoção das medidas de ajuste anunciadas pelo governo, a começar da presidente Dilma. Ou seja, é preciso que as medidas comunicadas pelo ministro Joaquim Levy saiam do papel e sejam de fato implementadas, apesar das resistências e das intrigas políticas nas próprias hostes governamentais.

Em segundo lugar, é preciso convencer a sociedade de que tais medidas, ao trazer limitações econômicas e de expectativas no curto - e talvez médio - prazo, venham a ter impacto favorável num prazo mais longo, em termos de retorno ao crescimento, de preferência de forma sustentável tanto ambiental, social e economicamente quanto de acordo com os parâmetros da realidade (não dar o passo maior do que a perna, pois a conta virá mais cedo ou mais tarde).

“Este é o desafio”, enfatiza Vera Rita. Ela espera que a experiência atual (de austeridade, ano difícil etc.) seja um aprendizado para todos, na medida em que possa estimular a criatividade, a resiliência e a percepção de que é possível superar as dificuldades. “Isso é o que traz um fortalecimento verdadeiro para a população e também para quem faz as formulações de políticas públicas.”

De acordo com Vera Rita, esta é uma oportunidade para lembrar as pessoas que os recursos são finitos. “A experiência do crédito (abundante e com prestações a perder de vista) pode ter deixado esta percepção camuflada.” Este é o momento de as pessoas reorganizarem o orçamento, as contas e os hábitos; de descobrirem novas fontes de satisfação que não sejam necessariamente ligadas ao consumo, acrescenta. “Isso pode ser uma experiência muito interessante porque a pessoa descobre que pode ter uma autonomia ao deixar de depender exclusivamente de dinheiro, de prazer atrelado ao consumo.”

De minha parte, não sou tão otimista por não acreditar que a presidente Dilma e o PT  estejam de fato empenhados em convencer a sociedade de que um ajuste econômico doloroso - mais do que uma medida neoliberal - seja realmente pré-condição para o Brasil ter um futuro promissor. Até porque venderam a ilusão do consumo sem limites, "financiado" pelos ventos favoráveis do crescimento mundial e desatrelado de medidas como estímulo à poupança interna e redução do custo Brasil para garantir investimentos na produção, bem como de educação de qualidade que prepare, além de profissionais qualificados, cidadãos conscientes inclusive na gestão financeira de suas vidas. Quaisquer mudanças favoráveis no cenário internacional são suficientes para que abandonem o barco da austeridade em nome do projeto de poder.

Ah, sim! E agora tem a "lista do Janot" (procurador-geral da República, Rodrigo Janot) enviada ao STF, que servirá de combustível para radicalizações políticas, comportamentos oportunistas e todo tipo de chantagens por parte dos políticos atingidos. O ajuste econômico tera de vencer mais esta barreira.

 

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