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Esforço econômico contra a pandemia do vírus covid-19

29 de Marco de 2020, por José Venâncio de Resende

Aluízio Barros: as contas do esforço de Estados Unidos e Brasil.

Em longa reportagem publicada na sua última edição, a revista britânica “The Economist” considera que as intervenções dos governos, como resposta econômica à pandemia do vírus covid-19, são muito maiores e mais radicais do que as da crise financeira de 2007-09 que já foram enormes.

Os bancos centrais, ao redor do mundo, estão cortando taxas de juros em mais de 0,5 ponto percentual desde janeiro e estão lançando um profundo esquema de “quantiative easing” (afrouxamento monetário ou criação de quantidades significativas de dinheiro novo). Os políticos estão abrindo as torneiras fiscais para apoiar a economia. O Congresso norte-americano aprovou proposta do governo de gastar duas vezes mais do que o pacote de 2009 do presidente Barack Obama.

Reino Unido, França e outros países estão garantindo créditos de até 15% do PIB (a soma em dólares de tudo o que é produzido na economia), procurando evitar inadimplências em cascata. Uma das medidas mais conservadoras, os estímulos das despesas governamentais vão exceder este ano 2% do PIB global, muito acima do que foi visto em 2007-09. Mesmo a Alemanha, cuja retitude fiscal é motivo de piada para os economistas, está gastando mais.

O resultado é o aumento do tamanho do Estado. No último ano, a despesa governamental geral girou em torno de 38% do PIB nos países mais ricos. O esforço de estímulo, combinado com a queda no PIB nominal nos próximos meses, vai empurrar esta relação bem acima dos 40%, talvez o seu mais alto nível já visto.

Ainda segundo “The Economist”, os bancos centrais tem prometido imprimir tanto dinheiro quanto for necessário para manter baixos os custos dos empréstimos governamentais. O Banco Central Europeu está prometendo comprar tudo o que os governos emitirem; isto deve reduzir a distância nos custos dos empréstimos entre os mais fracos e os mais fortes membros da euro-zona, que se tem ampliado nos primeiros dias da pandemia.

Recentemente, o Federal Reserve ou Fed (Banco Central norte-americano) prometeu comprar ilimitadas quantidades de títulos governamentais, se necessário. É como se fosse imprimir moeda para financiar débitos, ou aumento dos empréstimos causados pelos estímulos do governo. O banco central anunciou ainda novos programas de apoio ao crédito para empresas e consumidores. O Fed é agora um emprestador direto de último recurso para a economia real, não apenas para o sistema financeiro.

Os políticos também estão agindo. Os governantes esperam impedir totalmente que empresas interrompam operações e trabalhadores percam o emprego. Enfim, os governos nos países mais ricos estão canalizando vastas somas para empresas, provendo-as com subsídios e empréstimos baratos numa tentativa de preservar empregos e impedí-las parar. Em alguns casos, o governo está pagando salários de pessoas que não podem trabalhar em segurança. A União Europeia, em particular, tem encampado esta política, enquanto o governo do Reino Unido vai pagar até 80% dos salários de trabalhadores licenciados. O pacote norte-americano inclui empréstimos a pequenos negócios que serão perdoados se trabalhadores não forem despedidos. Famílias estão recebendo alívio temporário em hipotecas, outros débitos, aluguel e contas em geral. Norte-americanos também vão receber cheques no valor de até 1.600 dólares.

America Latina

Em outra reportagem, a revista “The Economist” aborda o impacto do covid-19 nas economias já enfraquecidas da América Latina. A Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe, que prevê queda de 1,8% na economia da região, acredita que o número de pessoas pobres vai subir de 185 milhões para 220 milhões (numa população total de 650 milhões).

Em reação a esta situação, os bancos centrais de Chile, Brasil, México e Peru fizeram cortes emergenciais de taxa de juros. Vários estão disponibilizando linhas de crédito para empresas (o Banco Central do Brasil, por exemplo, anunciou que vai injetar 230 bilhões de dólares no sistema financeiro, cerca de 11% do PIB) e auxílio para os serviços de saúde e para trabalhadores.

A dificuldade é que a maioria dos latino-americanos trabalham em pequenos negócios e estão na economia informal (sem registro). Pagamentos emergenciais podem alcançar trabalhadores formais e, através de programas de transferência de dinheiro, os mais pobres. Isto deixa de fora um amplo segmento da baixa classe média e de classes trabalhadoras. O governo do Peru, por exemplo, decidiu pagar 108 dólares por família, mas está difícil de distribuir o dinheiro.

Outra dificuldade é como esses governos vão pagar por tudo isso. Governos podem imprimir dinheiro, mas historicamente isto está associado à hiperinflação. Apesar de que, atualmente, a deflação parece maior do que o fantasma da inflação. Países que podem ainda ter acesso ao mercado financeiro devem deixar claro que seus gastos são temporários e que não implicam em perder o controle sobre as finanças públicas. Outros podem procurar o Fundo Monetário Internacional (FMI) que está preparando medidas de emergência financeira.

Brasil

O governo brasileiro decidiu assumir um papel ativo e indutor frente à pandemia do covid-19, de maneira a aumentar a circulação de dinheiro. O ministro da Economia, Paulo Guedes, anunciou a liberação de R$ 200 bilhões de compulsórios, pelo Banco Central; R$ 150 bilhões de caixa do BNDES e mais R$ 150 bilhões de antecipação de benefícios e diferimentos de recolhimento de impostos e FGTS.

Outra medida foi a criação do plano de auxílio emergencial aos informais, para os próximos meses, pelo qual vão ter acesso a R$ 600 por mês. O custo total será de quase R$ 50 bilhões. E, além de assumir o pagamento de parte dos salários das empresas, o governo pretende gastar mais R$ 50 bilhões para ajudar o empresário a pagar a folha. A ideia é o governo pagar parte do salário e o empresário financiar a outra parte, segundo Guedes.

O governo ainda pretende anunciar a rolagem da dívida dos municípios, estendendo um benefício dado aos estados, de acordo com o ministro. Com estas iniciativas, Guedes estima o incentivo direto e indireto em mais de R$ 750 bilhões.

O economista Aluizio Barros, professor aposentado da UFSJ, fez alguns cálculos para comparar o tamanho do esforço no Brasil e nos EUA para ajudar empresas, famílias e hospitais no enfrentamento da crise. “O pacote brasileiro mobiliza 700 bilhões de reais - cerca de 10% do PIB de 7,3 trilhões. O norte-americano 2.2 trilhões - ou seja, 10 % do PIB de 21.4 trilhões de dólares. O maior da história do país.”

Estes 10% do PIB dão uma ideia aproximada do esforço governamental dos dois países, resume Barros. “A meu ver, o esforço brasileiro é maior porque os EUA vem de um longo período de expansão econômica. Ao passo que o Brasil vem de um período da maior recessão da sua história produzida pelo PT.”

A maioria dos economistas apoiam estas medidas, diz a revista “The Economist”. Acreditam que elas sejam temporárias, destinadas a manter a economia num coma induzido até que a pandemia passe.

O economista Affonso Celso Pastore, ex-professor da FEA-USP e ex-presidente do Banco Central, considerou, em artigo publicado no jornal “O Estado de S. Paulo” (29/03/2020): “Esta não é uma crise que possa ser eliminada usando só o arsenal dos bancos centrais, como em 2008/09. É preciso salvar vidas e ajudar a recuperação dos mais atingidos. Primeiro, porque a recessão que já está em curso derrubará a receita tributária bem mais do que a queda do PIB. Segundo, porque diante da pobreza da população e da cessação de sua renda é impossível não desenvolver o que Armínio Fraga chamou de rede de solidariedade social”.

Pastore ainda lamentou a falta de um estadista na Presidência da República “capaz de formular um diagnóstico coerente sobre como enfrentar uma epidemia”. Para ele, o presidente deveria encampar as medidas, “com total apoio do Congresso, com ambos ficando plenamente conscientes de que esta conta terá de ser paga por todos nós, aumentando nos próximos anos o esforço necessário para o equilíbrio fiscal”. E disse mais: “As medidas até aqui anunciadas para minimizar as consequências econômicas da crise são claramente insuficientes. É preciso muito mais.”

Tanto é verdade que o economista e ex-professor da FEA-USP Eduardo Gianetti da Fonseca, em entrevista ao programa “De volta pra casa da Rádio Cultura FM, defendeu a implantação temporária da renda mínima no país, mesmo que haja necessidade de emissão de moeda. No entanto, ele admitiu que é uma proposta “perigosa” por causa do risco da volta da inflação e também do seu uso político. 

 

 

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