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Novas manifestações de rua à vista

08 de Abril de 2015, por José Venâncio de Resende

Foi um Março literalmente infernal, para a presidente Dilma Rousseff. Mês em que cerca de dois milhões de pessoas foram às ruas contra a corrupção, o governo e o PT (nas maiores manifestações desde as “Diretas Já”); a popularidade da presidente “recém-reeleita” caiu ao fundo do poço; o governo teve de levar o PMDB de volta ao centro do poder, depois de tentar alijá-lo; o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, “demitiu”, antes de Dilma, o ministro da “pátria educadora” Cid Gomes após bate boca no plenário; a presidente, em raro momento de humildade, reconheceu que a crise econômica decorre de erros do seu governo; vazou para a imprensa documento sigiloso, que admite uma comunicação "errática" desde a reeleição da presidente Dilma e maior rejeição ao PT; o PMDB abriu guerra contra o governo por este ter favorecido a criação de novo partido (PL) pelo ministro das Cidades, Gilberto Kassab...

Para piorar, o cenário de pessimismo decorrente da crise econômica. Indicadores negativos (inflação, impostos, gastos públicos e dólar em alta; produção, emprego e renda em queda; contas externas em deterioração; nível de confiança de empresários e consumidores em baixa; denúncias de corrupção que não acabam mais etc.) têm contribuído para que o “presidencialismo de coalizão” tenha seus alicerces abalados.

Esse é o pior momento desde o impeachment de Collor, com a conjunção das crises de governabilidade, econômica, hídrica, de energia e do sistema partidário, diz o professor de filosofia da Unicamp, Marcos Nobre. Situação esta que se pode agravar (O Estado de S. Paulo, 22/03/2015).

Só não foi pior porque a agência de avaliação de risco Standard & Poor’s deu fôlego ao governo, ao manter a nota que dá ao Brasil o grau de investimento; ou seja, o país continua a ser considerado bom pagador. Pesou na decisão a presença de Joaquim Levy no governo como avalista da austeridade. Em outras palavras, a S&P espera que o ajuste fiscal seja efetivamente executado.

O desafio de Dilma, neste segundo mandado, é evitar que o “vem pra rua” e a má vontade da sua base parlamentar não prejudiquem seus planos de correção de rumos na economia. A presidente ainda não reconquistou a cumplicidade do PMDB que quer dividir de fato o poder com ela para garantir a tal governabilidade. O partido já defende até corte de ministérios e vota independente no Congresso, para desespero do PT.

Os atritos entre o governo e seus aliados no Congresso podem dificultar o ajuste fiscal, como disse Jaime Ferreira, superintendente de câmbio da corretora Intercam. "O custo político de fazer o ajuste (fiscal) está cada vez mais alto e o mercado não gosta disso" (Reuters, 19/03/2015). E o PT questiona a política “neoliberal” de cortes de despesas, para atender seu público interno (sindicalistas, MST etc), a “onda vermelha” que promove manifestações “chapa-branca”.

A onda “verde-amarela” de 15 de Março – cujas lideranças se dizem não vinculadas a partidos - embute uma grande contradição e uma aparente omissão. Estariam os cartazes e faixas contra o governo Dilma condenando o estelionato eleitoral ou o ajuste das contas públicas? Seriam as faixas e cartazes contra a corrupção, implicitamente, um protesto a favor da reforma política para baixar os custos de campanhas eleitorais, além de leis mais duras contra políticos corruptos?

O ajuste fiscal é extremamente necessário por causa do fracasso das experimentações do primeiro mandato de Dilma (a tal “nova matriz macroeconômica”) e da “herança maldita” de seu antecessor e padrinho político, que desorganizaram completamente a economia e levaram à estagnação e à inflação. Eleitores ou não de Dilma, todos pagarão a conta; sem a certeza da “mercadoria” entregue.

Já a reforma política que se discute no Congresso Nacional neste momento, capitaneada pelo PMDB, está longe de atacar o cerne da questão: a deficiência de representatividade dos partidos e os custos das campanhas eleitorais, que geram corrupção. Foca basicamente questões como financiamento de campanhas eleitorais (preferência pelo privado), coincidência de data de realização das eleições em todos os níveis (um retrocesso), fim da reeleição (falso dilema), redução de mandato de senadores e abolição dos suplentes. Nem uma palavra sobre propostas vitais como voto distrital, redução do número de partidos e substituição do horário eleitoral dito “gratuito” por debates em rede nacional de rádio e TV.

Mas é ilusão acreditar que as manifestações de rua vão parar. Tudo indica que devem continuar, talvez até engrossadas por mais gente. O desfecho, só Deus sabe!

Digno de nota. No final do mês, a presidente Dilma indicou o professor de filosofia e ética Renato Janine Ribeiro para o Ministério da Educação. Bola dentro! E entregou a Secretaria de Comunicação Social para o tesoureiro do PT, Edinho Silva. Bola fora! (data de fechamento deste texto: 30/03/2015)

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