Qualquer que seja o resultado do primeiro turno das eleições – os partidos da base de apoio do governo devem aumentar sua fatia no Congresso -, as oposições terão de repensar sua estratégia, fracassada nos últimos oito anos. A complacência das diversas classes sociais, inclusive das elites, com a corrupção e o uso abusivo da máquina pública em nome de uma pujança econômica, sustentada no consumismo, fornece combustível ao novo governo, quase certamente liderado por dona Dilma, para ousar ainda mais. Já se fala abertamente em criar uma rede política semelhante à Aliança Ampla no Uruguai, que seria liderada pelo sr. Lula e reuniria PT, PSB, PcdoB e PDT. O objetivo dos líderes desse bloco de esquerda é claro: controlar politicamente o governo de dona Dilma e fazer reformas em geral polêmicas e antidemocráticas, como o controle (ou censura mesmo) da imprensa. Uma das propostas tornadas públicas é usar o rolo compressor da base governista para oficializar o troca-troca partidário e assim promover um “assalto” aos candidatos eleitos pelos partidos de oposição, destroçando assim os opositores. Esta movimentação deverá ser beneficiada pela mediocridade do futuro Congresso, a se confirmar a perspectiva de eleição de palhaços, artistas e jogadores de futebol e do controle do Senado pelos aliados do Sr. Lula. Resta saber como o PMDB, principal aliado de dona Dilma, reagirá a este bloco político de esquerda que deverá sair fortalecido das eleições, sentindo-se capaz de quaisquer aventuras.
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Diante dessa ameaça à democracia brasileira, resta à oposição ou manter a postura frouxa dos últimos oito anos, perdendo o pouco de ar que ainda lhe resta para respirar, ou se unir num bloco democrático monolítico, capaz de mobilizar a sociedade consciente em torno de um projeto político alternativo. A saída que resta aos derrotados será a de juntar os cacos, criar um único partido de oposição (fusão de PSDB, PPS, Democratas e a parte sadia do PMDB entre outros desgarrados ) e se aliar ao Movimento de Combate à Corrupção (rede de 46 ONGS que apresentou a Lei da Ficha Limpa) e a outras entidades da sociedade civil. Caberá a este partido de oposição promover uma massiva campanha de filiações aos seus quadros em todo o Brasil e co-liderar um movimento para forçar o Congresso Nacional a promover reformas de verdade, tais como uma reforma política moderna. Tal reforma deveria considerar a adoção do parlamentarismo com voto distrital misto e facultativo e da fidelidade partidária; a definição de regras transparentes que oficializem doações individuais para candidatos e partidos; e o fim de excrecências como horário eleitoral gratuito e Hora do Brasil, que seriam substituídos por debates políticos livres na TV e no rádio. Também está mais do que na hora de a oposição adotar a prática das primárias na escolha de seus candidatos, rompendo assim com a péssima tradição de decisão pelas cúpulas.
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O aumento da renda dos brasileiros e o uso intensivo de celulares e mesmo de internet banda larga entre os mais pobres convive, às vezes no mesmo domicílio, com precárias condições de saneamento básico. A Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) de 2009, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), mostra que o número de residências com telefones aumentou mais de 300% entre 1992 e 2009, graças à privatização das telecomunicações. Em compensação, o número de casas com acesso a tratamento de esgoto, de responsabilidade exclusiva dos governos, aumentou apenas 30% no mesmo período. Hoje, 85% das casas tem serviço de telefonia e apenas 60% tem saneamento básico.
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A descoberta de tentativa de desvio de dinheiro, envolvendo a Aguatins (autarquia de saneamento básico do Estado do Tocantins, criada em março deste ano), é um retrato da situação caótica do sistema de saneamento básico no Brasil. Acrescente-se a isso a demagogia que impera no setor. O governador de Tocantins, o sr. Carlos Henrique Gaguim que tenta reeleição, declarou por exemplo que a Aguatins surgiu para fazer parcerias com o governo federal para criar a “bolsa água”, que vai subsidiar em até 100% a conta de água das famílias carnetes. Quer dizer, o contribuinte paga duas vezes: pela corrupção que cedo ou tarde vai imperar na autarquia e pela demagogia dos políticos que fazem caridade com o dinheiro dos contribuites.
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A situação não é muito diferente em São João del-Rei, cuja autarquia municipal de água e esgoto (DAMAE) é mal gerenciada e não atende às necessidades da população. Não existe sequer usina de tratamento de esgoto, que é simplesmente jogado em rios e córregos. Apesar disso, muitos políticos locais são contrários à substituição do DAMAE pela COPASA, sob a alegação de que os pobres não vão poder pagar a conta. O problema do saneamento básico no Brasil é basicamente a reserva de mercado, criada pelos políticos para tomar de assalto empresas e autarquias estaduais e eventualmente municipais. Seria mais saudável que os recursos destinados aos saneamento básico fossem disputados em concorrência pública transparente, com base no melhor projeto e no menor preço. Assim, nada impediria que Sabesp, Copasa e mesmo empresas do setor privado pudessem participar dessas concorrências em qualquer parte do Brasil. Tal medida simplesmente inviabilizaria a existência de empresas ou autarquias estaduais ineficientes, bancadas com o dinheiro de impostos, e custaria menos aos cofres públicos.
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