Por ocasião do lançamento do livro “Política em Municípios das Vertentes” (Coleção Lageana), dia 9 de abril em Resende Costa, fiz uma breve reflexão sobre o sistema político-partidário municipal e nacional, que gostaria de retomar neste espaço. Nos 16 municípios visitados para este trabalho, constatei a existência de um quadro partidário “enxuto”.
No período entre a ditadura Vargas e o golpe militar de 1964, prevalecia no cenário municipal o bipartidarismo (PSD e UDN), com o PTB às vezes compondo o cenário político. O regime militar trocou estes partidos por MDB e ARENA, divididos em sublegendas para acomodar diferentes grupos políticos locais e regionais. Posteriormente, foram substituídos por PMDB e PDS (depois PFL). E assim caminhava a vida política nos municípios, não muito diferente do que ocorria no cenário nacional.
O multipartidarismo que surgiu na transição da ditadura militar para a Nova República pouco alterou a disputa eleitoral nos municípios. Dois ou três partidos mais representativos (PMDB, PSDB e eventualmente PT) dominam a cena, com outras legendas – três, quatro no máximo - atuando complementarmente em um ou outro município, tais como PSD, Democratas, PP, PDT e PSB.
Essa situação dos municípios da nossa região – acredito que da maioria do País - contrasta gritantemente com o cenário nacional, onde figuram mais de 30 partidos – que poderão passar da centena, se todos os pedidos forem aceitos. Uma das aberrações deste sistema é o chamado “governo de coalizão” que resultou na criação de quase 40 ministérios para acomodar os interesses de todo mundo. O desfecho nós já sabemos.
O atual sistema político-partidário tornou o Brasil um país ingovernável. Combinado com o modelo de gestão centralizado, em grande parte favorecido pela Constituição de 1988, e temos um quadro explosivo que nos levou a um presente caótico e um futuro incerto. Qualquer que seja o resultado final do impeachment, o Brasil não sairá tão fácil desta balbúrdia encalacrada.
Sair desta situação significa construir bases sólidas para pavimentar o caminho da estabilidade política e do crescimento econômico sustentável. No campo político, com a adoção de um sistema mais representativo e aderente às aspirações e exigências dos cidadãos.
Nas áreas administrativa e econômica, a atualização da Constituição de 1988, de maneira a tornar o setor público minimamente governável e a abrir espaço para uma agenda de reformas que levem ao aumento da produtividade e redução da desigualdade, como democratização da inovação tecnológica, mais investimentos na qualificação de mão-de-obra (para atender às novas necessidades do mercado) e na geração de empregos de qualidade e melhor remunerados, bem como a eliminação de gargalos que travam a eficiência produtiva e a manutenção da inflação em níveis civilizados.
Cabe às elites deste País – no sentido mais amplo – entenderem que é preciso começar pela racionalização do sistema político, a fim de colocar um paradeiro nesta pulverização de partidos e de milhares de candidatos, o que dificulta a vida dos eleitores.
Em artigo recente, os professores Alexandre Schneider, Carlos Melo e Rubens Glezer* defenderam que “É hora de construir a transição. É hora de pensar no dia seguinte, depois de amanhã, quando continuaremos a existir como um só país, com ou sem Dilma”.
Neste artigo, eles defendem que – primeiro passo – “a Operação Lava Jato vá até o fim: que se varra tudo o que houver de podre, que não seja abrupta e cinicamente interrompida”. E – segundo passo – que se reestruture “a casa que hoje parece ruir. Uma reforma política, sobretudo da Política, é urgente”.
E prosseguem: “Pelos vícios do atual sistema, não há como fazer essa reforma com o Congresso que temos hoje e tende a se favorecer de novas regras que ele mesmo vier a estabelecer”.
Por isso, esses professores defendem que “A constituinte exclusiva para a reforma política, por mais polêmica que seja, faz-se necessária. Para esse fim, seus membros devem ser novos e exclusivos; candidatos avulsos – desvinculados dos atuais partidos -, impedidos de disputar novos mandatos, teriam maiores condições de reorganizar o jogo sem advogar em causa própria”.
Concordo plenamente com os autores do artigo. E vou além. Acredito que está mais do que na hora de implantar o voto distrital, que traria inúmeras vantagens. Trata-se do tipo de votação em que cada Estado seria dividido em vários distritos, e cada distrito elegeria um deputado (de um partido) por maioria simples (50% dos votos mais um) – venceria o candidato mais votado.
O sistema de voto distrital aproximaria o quadro partidário nacional da realidade municipal – principalmente das pequenas e médias cidades -, na medida em que reduziria de imediato o número de partidos políticos, colocando certa ordem na casa. Além disso, reduziria os custos das campanhas eleitorais, que estão na raiz do sistema corrupto e podre desnudado pela Operação Lava Jato, e melhoraria a qualidade dos representantes no Congresso Nacional. Mas, principalmente, tornaria os parlamentares (federais e estaduais) atados aos seus eleitores - como aliás já acontece com prefeitos e vereadores – e devolveria parte do poder central para os municípios.
Quem sabe esta seria uma oportunidade de ouro para reconstruir o Brasil, a partir dos municípios, de baixo para cima! Afinal, chega de Brasília ditar as regras a partir do seu pedestal. A um custo exorbitante, diga-se de passagem, que é transferido aos cidadãos que moram nos municípios.
*O dia depois de amanhã, jornal O Estado de S. Paulo, 24/03/2016.