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ROTA LISBOA (8): Pandemia, confinamento e vacinas

25 de Outubro de 2020, por José Venâncio de Resende

Autódromo Internacional do Algarve em dia de treino (foto: facebook de Rui Moreira).

Se a infantilidade política (ou politicagem?) não atrapalhar, os brasileiros poderão ter acesso à vacina contra a covid-19 antes dos europeus. 

Segundo a imprensa portuguesa, a Comissão Europeia (CE) contratou a compra de 300 milhões de doses da potencial vacina da AstraZeneca, que está em fase avançada de ensaios clínicos. O acordo foi assinado em nome dos 27 Estados-membros da UE. 

A CE também terá concluído negociações com a francesa Sanofi-GSK para a compra de 300 milhões de doses de uma vacina contra a covid-19, em nome dos Estados-membros, tão logo seja desenvolvida e aprovada.

Bruxelas ainda discute acordos semelhantes com outras fabricantes de vacinas, como a Johnson & Johnson (EUA), a GlaxoSmithKline (Reino Unido), a Moderna (EUA) e a CureVac (Alemanha). A vacina da norte-americana Moderna, chamada RNA-1273, está em fase bastante adiantada de ensaios clínicos.

Porém os mais otimistas acreditam que a disponibilização de vacinas para imunização dos europeus, independente de qual venha a ser a fabricante bem-sucedida, dificilmente ocorrerá antes da primavera (entre março e junho de 2021). 

Infecções disparam 

Enquanto a vacina não chega, os europeus preparam-se para um outono/inverno penoso. Espanha e França, por exemplo, ultrapassaram um milhão de contágios de covid-19, mas os próprios governos admitem que este número pode ser bem maior. Em toda a Europa, o número de infecções diárias bate recordes a cada dia. 

O primeiro-ministro espanhol, Pedro Sánchez, admite o número real de casos de covid-19 no seu país acima de três milhões, e avisa que o cenário vai ficar ainda mais sombrio. Tanto que já tem sobre a mesa a proposta de estado de emergência nacional. Aliás, a França acaba de aprovar o estado de emergência até 16 de fevereiro, com probabilidade de prolongamento porque a pandemia tende a se estender pelo menos até o próximo verão, segundo adverte o presidente Emmanuel Macron. Outros países, inclusive Portugal, já admitem esta possibilidade. 

Evidente que o entendimento entre as forças políticas facilita a travessia deste clima tempestuoso. Na sua última edição (24/10), a revista britânica The Economist observa que o caos político contribui para o agravamento da crise pandêmica na Espanha, que está entre os países mais duramente afetados pela segunda onda da pandemia. Isto é parcialmente porque o governo minoritário de esquerda e a oposição conservadora falham em acordar numa estratégia nacional. Somente algumas regiões estabeleceram efetivos sistemas de testagem-rastreamento-isolamento, e os índices de infecção variam descontroladamente.

Na Europa, o número de infecções diárias e de mortes aumenta dia a dia naquela que já é a segunda onda da pandemia. Com a diferença de que norte e leste europeus, bem comportados na primeira onda, estão sendo mais pressionados nesta nova fase.  Tanto que a Organização Mundial de Saúde (OMS) já alerta que muitas unidades de cuidados intensivos na Europa, inclusive no norte, vão chegar ao limite da sua capacidade nas próximas semanas.

O fato é que as medidas se tornam gradativamente mais restritivas, com redução de horário de funcionamento do comércio, recolhimento obrigatório à noite, obrigatoriedade do uso de máscaras nas ruas, restrição à circulação entre municípios (como a decretada para o período de finados em Portugal) e o temido confinamento, a partir do estado de emergência que respalda medidas medidas de exceção (restrições à circulação e a reuniões, por exemplo). Para quem esperava o fim dos estádios de futebol vazios, parece que as poucas experiências realizadas recentemente podem ser revertidas na medida em que a pandemia se agrava. 

A volta do confinamento (lockdown), regional ou nacionalmente, tende a agravar a situação econômica com a ampliação das falências no pequeno e médio comércios, aumento do número de desempregados, queda na receita dos governos e estresse do tecido social. Daí o crescente pipocar de manifestações de rua contra as medidas coercitivas, o que ironicamente contribui para agravar ainda mais o problema na medida em que promovem ajuntamentos de pessoas sem distanciamento físico e sem uso de máscaras. 

Na contra-mão, para além de festas sociais (como casamentos com dezenas de convidados flagrados aqui e ali), eventos de grande público como o prêmio de Fórmula 1 em Portugal são autorizados pelas autoridades de saúde. O treino deste sábado (24), na definição da primeira pole position do Autódromo Internacional do Algarve (AIA), já mereceu críticas como a do presidente da Câmara Municipal do Porto (equivalente a prefeito), Rui Moreira, em seu facebook. 

Para além da “falta de respeito” àqueles que estão a salvar vidas, diz Moreria, “o pior e o mais crítico é que muitas das pessoas que ali estão - e muitas sem máscara - vão ser elas próprias a agravar a sobrecarga (dos hospitais). A DGS (Direção Geral de Saúde) devia, por isso, ter cuidado. Não deixa mais de 1.500 pessoas estarem num estádio ao ar livre a ver futebol, não permite pequenos eventos organizados com todos os cuidados pelas autarquias, mas deixa que 27.500 pessoas estejam em cima umas das outras a ver F1. Estes paradoxos fazem com que os portugueses percam a confiança nas instituições. Numa altura em que essa confiança é crucial para que todos se sintam motivados e se empenhem.” 

Grávida de um morto

O Parlamento português acaba de aprovar a inseminação pós-morte, depois de uma iniciativa legislativa de cidadãos (ILC). Esta decisão foi motivada pela série de reportagens denominada “Amor sem fim”, da TVI, que foi ao ar há cerca de um ano. 

Foram quatro reportagens que mostraram a luta de uma mulher, Ângela Ferreira, para se engravidar do marido Hugo, já morto; e fizeram com que a procriação medicamente assistida (PMA) voltasse a debate na Assembleia da República. Pela nova lei, a mulher pode engravidar-se recorrendo ao material colhido e criopreservado num processo de PMA, interrompido pela morte do marido. 

Galiza e Atlântico 

Aquilo que seria curso natural e histórico acaba de ser confirmado pelo governo. A prioridade portuguesa para a rede ibérica de comboio (trem) de alta velocidade é a ligação atlântica Lisboa-Porto-Vigo, de acordo com a ministra da Coesão Territorial, Ana Abrunhosa, segundo o Jornal Econômico (23/10/2020). “A nossa prioridade não é a ligação entre Madrid e Lisboa porque de Madrid para Lisboa vamos de avião.” 

Ana Abrunhosa falou durante as II Jornadas Amizade, promovidas pela eurocidade Cerveira (Portugal)-Tomiño (Galiza). Ela disse que a prioridade portuguesa ficou “clara” quando o governo apresentou o Programa Nacional de Investimentos (PNI) 2030.

“A ligação de alta velocidade será a Norte, por Vilar Formoso, muito provavelmente. O que o Governo português não quer é que a solução seja imposta. Foi isso que transmitimos na cimeira ibérica, e isso é muito importante”, afirmou Ana Abrunhosa no painel intitulado “Europa Sem Fronteiras: o papel da cooperação transfronteiriça na consolidação do projeto europeu”.

O presidente da Junta da Galiza, Alberto Feijóo, reforçou que para a alta velocidade “o importante para Portugal e para a eurorregião é o Atlântico”. “Somos lugares atlânticos, somos lugares fundamentais para o Arco Atlântico. Temos de apostar, como europeus, no Atlântico. Compreendo que outra parte dos espanhóis tenha de apostar no Mediterrâneo, mas nós apostamos no Atlântico de forma clara”, reforçou.

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