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Mau dia, Minas, mau dia Brasil

13 de Novembro de 2012, por Rosalvo Pinto

Sexta feira, nove de novembro, 06h30. Ligo a TV Globo. Roda diante dos meus olhos a imagem do “Bom dia, Minas”, com sua desgastada música de abertura. Inicialmente, as manchetes do dia: três assassinatos na madrugada da grande BH; carreta desgovernada  tomba no Anel Rodoviário, bate em seis carros, duas mortes e 5 feridos; quadrilha explode agência bancária, troca tiros com a polícia, morre um policial e bandidos fogem; estudantes de 22 anos, embriagados, fazem pega de madrugada, atingem carro, matando seu motorista e fugindo sem prestar socorro; na “rodovia da morte” (BR 381, trecho BH/Ipatinga), colisão de uma carreta com um Pálio, dois mortos e três feridos; em Brasília, STF retoma o julgamento do mensalão; Atlético e Cruzeiro se preparam para os jogos do fim de semana.

Às 07h30 sai da tela o Bom dia, Minas e entra o Bom dia, Brasil. A cantilena é ainda pior: 11 mortos na madrugada paulistana; em uma semana, 45 assassinatos, 600 de maio a outubro;
recolhidos mais de mil celulares em presídio paulista; dois ônibus incendiados na zona leste de São Paulo e motoristas se recusam a sair das garagens; cenas de horror na Cracolândia da Avenida Brasil, no Rio; envolvidos no mensalão são condenados a até 40 anos de prisão; Palmeiras, quase rebaixado, pega o Fluminense, o provável campeão...

E eu me pergunto, assustado: “que país é este?”. (Perdoem-me a ousadia de roubar a frase que consagrou os escritores Affonso Romano de Sant’Anna e Millor Fernandes, o músico Renato Russo e sua Legião Urbana e, ironicamente, o ex-governador de Minas Francelino Pereira, nomeado pela ditadura, sem sequer ser mineiro...). Estaríamos, por acaso, no Iraque, ou no Afeganistão, ou em uma sangrenta guerra civil como a da Síria? Vivemos dias de carnificinas humanas e de números estarrecedores.

Infelizmente, estamos no Brasil mesmo. Cenas como as da manhã do dia nove se repetem todos os dias pelo país afora. Estamos dizimando nossa população, nossa polícia, nossos idosos, estuprando nossas meninas de 10 anos. E ainda nos ufanamos de dizer que “somos a sexta economia do mundo!”. Talvez o problema esteja justamente aí: a sexta economia existe, sim, mas está nos bolsos dos 10% dos brasileiros que são os donos dela. Os outros 90%, coitados, que se matem entre si, arrombem e façam explodir os bancos, entulhem as prisões (temos a quarta maior população carcerária do mundo), que fiquem sem ônibus para trabalhar, que aumentem os sequestros e os latrocínios.

Ah, o latrocínio. Está na ordem do dia. Matar para roubar ou roubar para matar, não faz diferença. Foi outro dia mesmo, o casal de namoradinhos no bairro Higienópolis, São Paulo. A Caroline, 15, após entregar a mochila, ganhou dois tiros na nuca. Morreu na hora. Eram três os assaltantes, dois tinham 18 anos e o que atirou, 19. Acabaram presos. Na delegacia, o atirador simplesmente justificou, rindo: “Matei sim. Ela reagiu, problema e azar dela”. Os outros dois também debocharam da moça. O namorado e testemunhas informaram que a moça não havia reagido, simplesmente entregara a mochila. Não é preciso ir a São Paulo, ou a outras cidades grandes para ver essas cenas cotidianas. Ainda nos lembramos com tristeza e saudade do Geraldinho do Presépio e do Tio Adair, da Boa Vista, aqui na nossa ainda pacata cidade. Covardia das covardias: matar para roubar míseros reais.

A bandidagem que assola o país compete com um poderoso rival, este vindo dos nossos próprios governantes e representantes: as nossas rodovias, em péssimo estado e o trânsito louco das nossas cidades, que estão ceifando vidas a cada minuto. É difícil saber quem é mais eficiente.

O pior de toda essa história é que vamos nos acostumando com tudo isso. Nossa consciência vai se esvaindo, os valores éticos vão se evaporando, tudo vira apenas uma simples rotina.

Diante desse quadro tétrico, que diariamente invade nossas casas todas as manhãs, seria mais adequado ajustar os nomes dos dois programas televisivos à verdadeira realidade: “Mau dia, Minas” e “Mau dia, Brasil”. São duas horas de sofrimento, nas quais predominam a violência (roubos e assassinatos), os acidentes, a corrupção enraizada da nossa república democrática e o futebol. Ainda bem que o último traz um pouco de consolo para tanta miséria: o futebol, que é a parte do “circo”, como diziam os romanos, que nos faz esquecer as outras três desgraças. Pelo menos nossos atletas têm seus gordos minutos de entrevista e de glória, todos os dias, eles merecem...

Então, todo mundo vai trabalhar e volta para casa à noitinha. A televisão já nos espera com o cardápio perfeito: as más notícias (violência e corrupção) e o antídoto: as novelas. E todo mundo as acompanha, ri e se deleita com o imaginário ... de quê? Da violência (as brigas) e da corrupção. Mas vamos dormir, porque amanhã tem mais “Mau dia, Minas”, seguido do “Mau dia, Brasil”. Até quando?

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