Quando alguém via a dona Margarida do sô Barbusinha (Barbosinha) apressada na rua, com uma toalha branca e uma bacia na mão, era sinal de que um novo resende-costense estava chegando. Dona Margarida, dona Edith do Veio [Véio] do Chora, dona Zica do Antônio Eduardo, Sá Cândida e dona Elzi Lara: heroínas de tantos anos. Eram as famosas parteiras, as profissionais mais importantes da cidade. Como prêmio, costumavam ganhar quitandas, frutas, frangos e ... muitos afilhados.
Antigamente era comum ver passar pelas ruas um homem conduzindo porcos. Nas mãos, uma varinha e cordas, amarradas nos pés de um ou mais porquinhos. Uns, coitados, para o sacrifício; outros, mais novos, alegrinhos, para o chiqueiro de outro dono. Era uma verdadeira profissão. Dos mais famosos, ficou na memória o “sô Cornilinho [Cornelinho] tocador de porco”.
Era menino e me lembro bem de um negro, forte e gordo, o “João Deitado”. Claro que ele não gostava do apelido. De nossa casa, acordava-se bem cedo pelos fortes golpes de machado, entremeados das batidas sobre as “cunhas” de ferro, para abrir e rachar a lenha. Era o João Deitado, na casa da madrinha Donana, do Nico de Souza, do outro lado da avenida. Era a sua profissão: rachador de lenha. Cada pancada era seguida de um grito rouquenho, como se aqueles grunhidos suavizassem o esforço na rachadura da lenha. Meu pai não podia pagar um rachador de lenha, mas também dava lá os seus grunhidos.
Profissão importante daquelas épocas era a o “foiero” [folheiro, de “folha”, lata). Tempos de falta de luz elétrica, o utensílio domiciliar mais importante era uma boa lamparina a querosene (ou “querosena’, como então se dizia). Eram feitas aproveitando as raras latinhas de alimentos da época, com o bico, o pavio e a asa, ou alça, para se pegar. Antes da existência de chuveiros, tomava-se banho em grandes bacias de metal, que acabavam nas mãos dos foieros para soldagem dos buracos que apareciam. Bules, canecas, e “chacolateiras”, eram outras peças fabricadas. Talvez o foiero mais famoso tenha sido o “Manezinho foiero”. Pessoa estimada, dizem que gostava de contar umas mentirinhas. Quando nasceu um de seus filhos, ele teria dito que o neném, completado um mês de vida, já era tão esperto que falava, apontando para a parede: “pepel, papai, bibide” (chapéu do papai no cabide)...
A água foi o grande problema da cidade até a década de 60. Vinha das cinco fontes que brotavam ao redor da grande laje. Profissão preciosa, sobretudo das mulheres: as “buscadeiras de água”. Para isso elas inventaram uma tosca, mas eficiente tecnologia para esse árduo trabalho: uma lata de 18 litros era colocada sobre uma “rodilha” de pano bem trabalhada e ajustada sobre a cabeça. Com as duas mãos firmes nas “cadeiras”, lá subiam elas morro acima. Era o tempo da modinha de carnaval que se espalhou pelo país afora: “Lata d’água na cabeça – Lá vai Maria, lá vai Maria...”.
Outras profissões importantes eram as dos ferreiros/bombeiros, dos oleiros (fabricantes de tijolos e telhas), dos seleiros (Álvaro de Melo, Orestes, senhor Tuniquinho...), dos carapinas (ou carpinteiros e marceneiros), dos pedreiros, que começavam a profissão como “pedreiro-meia-cuié”.
Profissões importantes das mulheres eram as quitandeiras, as lavadeiras, as cozinheiras (e “arrumadeiras” de porco) e as costureiras. Lembro-me bem – e a foto tirada pelo senhor Syla Reis o comprova - do meu terninho branco para a primeira comunhão, feito pela dona Sinhá do Lauro. Mas a mais famosa “florista” de todos os tempos (que fazia também arranjos de papel crepom para as cruzes das portas de casa – para o dia da Santa Cruz - e para os “pendentes” de luz) foi a dona Adélia, casada com o Tião do Chora e mãe do Galo.
Entretanto, talvez as duas profissões mais especializadas foram as dos alfaiates e sapateiros. Relembro abaixo os representantes dessas categorias, que exerceram tais atividades por longo tempo.
Alfaiates: Adenor Coelho (Lorinha) - Aquim do João Coelho (Ticureba) – Aquim do Lauro – Cadico – Chico da Florença – Chiquinho da Maricota - Iraci do Sobico – Lúcio Alves – Nhozinho da Marica - Ramiro Resende – Sebastião Nagib – Syla Reis – Zé Maria do Ziquinha de Lourdes - Zé do Josué – Zé Fussura – Zé Nicodemos – Zé Miranda – Zé Muranga.
Sapateiros: Adão do Quinzinho – Antônio “Damascena” – Bilico Reis – Jair do Zé Josué - João Tatá (João Tié) – Joãozinho Sapateiro (dos Óculos) - Joel Vale – Jorge Sapateiro – Miguel Sapateiro – Ninico Reis – Pedro Lelê – Quinzinho Lara – Sílvio da Adelaide – Simão Turco – Zé Reis da Donana – Zé Tiana (filho do João Tatá) – Zé Ticoco. Não se sabe bem se o apelido do senhor João Tatá era pelo fato de ele bater sapatos no pé-de-ferro ou pelo fato de ele tocar trompa na banda... O último sapateiro em atividade hoje é o nosso querido Jorge Sapateiro. Os dois últimos a nos deixar foram os dois irmãos, filhos do João Franquilim: o Antônio e o Miguel.
(Agradeço ao Jorge Sapateiro e à Lucinha, minha irmã, as informações, em gostosas conversas de volta ao passado...).
Profissionais da Resende Costa de antigamente
11 de Dezembro de 2012, por Rosalvo Pinto