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Aleijadinho, uma ópera mineira para o mundo

22 de Junho de 2022, por Edésio Lara

Sobre ópera, é comum ouvirmos, “não gosto”. É certo, também, que muitos afirmam não ter gosto para ela sem nunca ter assistido a um espetáculo sequer. Às vezes, nossa relação com uma ópera se dá ouvindo uma ária isolada ou uma abertura tocada pela orquestra ou um coro. Quem não conhece Va Pensiero, da ópera “Nabucco”, de Giuseppe Verdi? Ou a ária da personagem Rainha da Noite, de Wolfgang Amadeus Mozart, da ópera “A Flauta Mágica”? Ou a protofonia da ópera Il Guarany (“O Guarani”), do brasileiro Antônio Carlos Gomes, peça que a orquestra sinfônica toca na abertura do espetáculo? Inclusive, essa última os brasileiros a conhecem na abertura do programa de rádio “A Hora do Brasil, até pouco tempo sempre transmitido pelas estações de rádio às 19h. Não é possível estarmos tão distantes da ópera.

Ópera, “obra” em italiano, reúne quantidade enorme de artistas na sua produção. Tudo começa quando um compositor, de posse de um texto (libreto), se empenha em compor uma ópera. A música, ainda em partitura, começa então a ser preparada por artistas para ser apresentada em teatro, principalmente. São cantores, instrumentistas, regentes (maestros), bailarinos, cenógrafos, diretores de cena (régisseurs), figurinistas e iluminadores. Além desse grupo de artistas, há um número enorme de pessoas que não aparecem no palco, mas que atuam nos bastidores para darem suporte aos artistas para que o espetáculo aconteça. São os maquiadores, fotógrafos, costureiros, contrarregras ou outros que são chamados para oferecerem serviços específicos a determinadas situações.

No Brasil, óperas são encenadas desde meados do século XVIII. Quem conhece Ouro Preto (MG) sabe da existência da Casa da Ópera, a mais antiga casa de espetáculos do Brasil em atividade. O edifício, construído em 1770, ofereceu naquele ano ao público quatro óperas. E as temporadas, desde então, foram organizadas com obras de autores italianos, espanhóis, portugueses e brasileiros.

A tradição de obras encenadas no Brasil no século XVIII, ao gosto português, fez com que companhias de ópera europeias se apresentassem no país ao longo do século XIX. A construção de teatros enormes nas principais capitais do país fez do Brasil um centro qualificado tanto para receber quanto para produzir espetáculos para um público apaixonado por óperas. Minas Gerais tem um desses centros artísticos dos mais importantes: o Palácio das Artes, onde trabalhei como músico entre 1979 e 2004 e pude participar de inúmeras produções operísticas de grande sucesso junto ao público.

Este centro cultural de destaque tem tido uma ação importantíssima. De maneira ousada, em vez de se dedicar a reapresentar óperas famosas do repertório internacional, optou por propor a composição de uma que tivesse como foco a figura de um dos maiores artistas do nosso país: Antônio Francisco Lisboa, o Aleijadinho. O escultor genial, que nasceu e morreu em Vila Rica, tornou-se personagem da ópera encomendada a dois professores do Curso de Música da UFRJ. André Cardoso cuidou do libreto e Ernani Aguiar da composição musical. Segundo Ernani Aguiar, foram dois anos de muito trabalho sobre papel pautado, mais lápis e borracha.

O resultado foi um grande espetáculo, cuja estreia aconteceu em Ouro Preto no último dia 29 de abril, no adro da Igreja de São Francisco de Assis. Outras quatro récitas aconteceram no Grande Teatro do Palácio das Artes, que encantaram o público. No palco vimos, diante de um cenário leve e encantador, o desenrolar de cenas em que se misturavam ficção e realidade. Foi uma aula de história que nos fez lembrar pessoas e o movimento que teve como resultado a Inconfidência Mineira. Destacou-se o barítono que interpretou o papel de um homem que se agigantava com o trabalho artístico que realizava, enquanto seu corpo, comprometido pela doença, seguia em sentido contrário, em direção à finitude.

Minas Gerais merecia mesmo oferecer ao mundo um trabalho grandioso, maiúsculo, condizente com a absoluta grandeza de um artista que continua presente entre nós através da sua obra. As 64 imagens esculpidas em cedro e expostas nos Passos da Paixão, além dos 12 profetas esculpidos em pedra-sabão, já no fim de sua vida, e que estão no largo da Basílica do Senhor Bom Jesus em Congonhas, testemunham sua genialidade.

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