O último jogo da final da Copa do Brasil, realizado na Arena MRV, em Belo Horizonte, no último dia 10/11, tinha tudo para ser uma daquelas partidas épicas. Nos lados opostos do campo estavam dois dos maiores clubes do futebol brasileiro, donos das mais apaixonadas torcidas, Atlético-MG e Flamengo.
No primeiro confronto, no Maracanã, 3 de novembro, o Flamengo bateu o Galo por 3x1, garantindo o favoritismo na grande final. Após abrir 3x0 no placar, o rubro-negro carioca ensaiava garantir ali mesmo o cobiçado e milionário título. Porém, uma série de defesas milagrosas do goleiro Everson e um gol do atacante Alan Kardec, já no final do segundo tempo, colocaram novamente o Atlético no páreo. Tudo ficou para ser definido na Arena MRV, a “casa do Galo”.
A semana do clássico foi movimentada por declarações de ambos os lados e pela tentativa do Atlético de inflamar a sua fanática torcida, para fazer da arena um caldeirão escaldante. A torcida respondeu e lotou o estádio na tarde do domingo, 10 de novembro, com bandeiras tremulando, gritos de “eu acredito” e de apoio ao time, que entrou em campo determinado a reverter o resultado. Porém, dentro das quatro linhas o que se viu foi mais uma vez a superioridade do Flamengo, que soube conter os ímpetos do adversário, marcou um gol e, se não fosse novamente o goleiro Everson, o placar teria sido elástico.
O relato acima poderia ser a crônica do dia seguinte de mais um jogo histórico entre dois grandes rivais do futebol brasileiro. Atlético e Flamengo sempre protagonizam disputas sensacionais, fazendo valer a boa rivalidade esportiva. No entanto, após o gol de Gonzalo Plata, aos 37 minutos do segundo tempo, o que se viu foi um clima de terror em setores das arquibancadas da Arena MRV. Torcedores atiraram copos e bombas no gramado e nos jogadores. Uma das bombas quase acertou o goleiro Rossi, do Flamengo. Não teve a mesma sorte o fotógrafo Nuremberg José Maria, atingido no pé por uma bomba. Ele teve que passar por cirurgia para conter os ferimentos.
O clima de guerra na Arena MRV não deixou de impactar o brilho da final da Copa do Brasil 2024. O título do Flamengo foi ofuscado na imprensa pela repercussão da barbárie nas arquibancadas. O leitor pode questionar: afinal, os atos de violência no estádio do Galo são únicos? Não, não são. Infelizmente, a barbárie no futebol tem sido recorrente Brasil afora, e a violência das torcidas organizadas não se limita aos estádios e seus arredores. Dias antes da finalíssima da Copa do Brasil, uma emboscada de integrantes da torcida Mancha Alviverde do Palmeiras deixou um cruzeirense morto e feriu outros 17 torcedores da Máfia Azul do Cruzeiro, na Rodovia Fernão Dias, em Mairiporã, Grande São Paulo. Podemos citar tantos outros exemplos de violência que vêm maculando o futebol brasileiro, fazendo dos estádios ambientes hostis e perigosos para o torcedor de bem.
A violência na Arena MRV chama a atenção para a necessária mudança de atitude no futebol brasileiro. A sociedade e os verdadeiros amantes do futebol não podem mais ficar reféns de bandidos travestidos de torcedores tocando o terror nos estádios e prejudicando os clubes. O Atlético-MG já está sendo penalizado com o seu estádio interditado.
A barbárie nos estádios é também fruto da imagem negativa que vem sendo, há décadas, construída nos jogos de futebol, transformando rivalidade em inimizade e violência. A própria imprensa tem sua parcela de culpa ao apimentar o clima de “guerra” e de “batalha” nos confrontos entre equipes. É recente o bordão “agora é guerra”, criado por uma grande emissora de TV ao divulgar os jogos decisivos da Copa Libertadores. Os “gritos de guerra” nas arquibancadas induzem à truculência e, nos ouvidos de torcedores violentos, se transformam em atos como os que foram vistos no último dia 10 em Belo Horizonte.
O futebol, em todas as suas instâncias, precisa acordar para o grave problema da violência. A rivalidade faz parte do jogo, a violência e a atitude hostil, não! Enquanto não prosperar a mensagem de que futebol é somente ENTRETENIMENTO, a violência impulsionada pelo fanatismo prevalecerá nas arenas. Aliás, o nome ARENA nos remete às antigas arenas romanas onde gladiadores matavam e morriam para alimentar o gozo de uma plateia ávida por sangue e violência. Não será melhor voltarmos a usar o nome ESTÁDIO ao nos referirmos às praças esportivas?