Francisco: papa, humanista, homem de Deus


Editorial

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Papa Francisco denunciou a violência e as desigualdades; pregou a paz e abriu caminhos para o diálogo (foto Vatican News)

Às 7h15min da manhã do dia 21 de abril, feriado de Tiradentes e segunda-feira da Oitava da Páscoa, os sinos da igreja matriz de Nossa Senhora da Penha de França, de Resende Costa, soaram em dissonância ao festivo dia que há décadas marca o encerramento da Semana Santa na cidade, com a bela e tocante procissão do Triunfo de Nossa Senhora. O toque dos sinos era, porém, fúnebre, informando o falecimento do santo padre o Papa Francisco. O Vaticano acabara de anunciar que o pontífice, de 88 anos, “havia retornado para a casa do Pai”.

As primeiras manifestações, em todos os cantos do planeta, desde o mais simples fiel às proeminentes lideranças políticas globais, revelaram que o mundo acordara, naquela manhã, órfão de um pai, de um líder espiritual e humanista que pregou incansavelmente a paz, a inclusão e o diálogo.

Muito já se falou e escreveu sobre Jorge Mario Bergoglio, ex-arcebispo de Buenos Aires, primeiro jesuíta e sul-americano a se tornar papa. Porém, sua vida e morte ainda despertarão e inspirarão muitas reflexões que transcenderão o discurso religioso. A missão de Francisco - discípulo do santo pobrezinho de Assis, em quem se inspirou pelo exemplo, testemunho e vivência radical do Evangelho - foi marcada pelo ardor pastoral e pela ação profética de aproximar a Igreja Católica dos mais necessitados, daqueles que vivem nas periferias de um mundo globalizado, em rápida transformação tecnológica, política, econômica, moral e social.

Vêm amedrontando a humanidade conflitos armados que assolam o Planeta. Somam-se a eles a destruição avassaladora da natureza e a situação caótica em que se encontram diversos países pobres, afundados em guerras civis ou inertes ante a impiedosa e não menos brutal violência da fome. Nações cujas soberanias se encontram à mercê do interesse das grandes potências globais ou de arroubos totalitários de líderes da estirpe de Putin, Trump e Netanyahu compõem o contexto social e político do mundo atual, onde imperam as armas e a violência.

Em meio a esse mundo louco, o Papa Francisco, em seus doze anos de pontificado, alçou-se em porta-voz essencial da paz. Sua voz lúcida sempre apontou caminhos diferentes dos alvos das bombas e das encruzilhadas da destruição. O seu testemunho foi exemplo de humildade e doação. A sua ternura inspirou uma humanidade que se esqueceu do significado de amor, gentileza, diálogo, tolerância e acolhida.

A morte de Francisco, o papa do sorriso largo, dos gestos espontâneos de acolhida e de carinho, em especial às crianças e aos mais pobres, deixa a humanidade órfã. Não será fácil para a Igreja Católica e para o mundo substituir Jorge Mario Bergoglio. Afinal, não é sempre que surgem lideranças capazes de ouvir e de se sensibilizarem com os problemas sociais que maculam a sociedade, como a pobreza e a violência. Francisco sentiu as dores do mundo, denunciou, sem medo, todas as formas de exclusão. Condenou as deportações de imigrantes, as guerras, a ambição desmedida pelo dinheiro e pelo poder. Intra muros, o papa não poupou a sua própria Igreja de contundentes críticas, necessárias para de fato implantar os ensinamentos do Concílio Vaticano II (1962-1965).

O pontificado de Francisco terá como legado o apelo incessante para uma “Igreja em saída”. Com esse conceito, o papa propôs uma mudança radical de paradigma, isto é, um modelo de Igreja “que se move para fora de suas estruturas e limites, buscando ir ao encontro das pessoas e das realidades do mundo, especialmente das periferias humanas e sociais.” 

Francisco foi um profeta dos tempos atuais, denunciou as mazelas de um mundo louco, “surdo” e excludente. Foi, acima de tudo, um mensageiro da paz, construindo pontes para o amor, para a promoção da fé e do diálogo entre povos, nações, etnias e religiões. Francisco foi e continuará sendo, para sempre, essencial.

 

André Eustáquio

Editor-chefe do Jornal das Lajes

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