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ROTA LISBOA (11): O que esperar de Joe Biden

08 de Novembro de 2020, por José Venâncio de Resende

O presidente eleito Joe Biden e sua vice Kamala Harris.

O governo português está animado com a vitória de Joe Biden. Afinal, o novo presidente dos Estados Unidos toma posse em janeiro, mês em que Portugal assume a presidência rotativa do Conselho da União Europeia.

O que muda com a eleição de Joe Biden? Duas frases do seu discurso de vitória resumem bem o que se espera do novo governo: restaurar a alma da América e voltar a ser o farol do mundo. Para resumir, a volta à normalidade. 

Internamente, Biden terá dificuldades para governar pois vai encontrar um país dividido. De um lado, Trump mesmo perdendo saiu fortalecido nestas eleições em relação há quatro anos, consolidando o chamado “trumpismo”. Ampliou o seu eleitorado, dos chamados “órfãos” da globalização, mesmo não cumprindo grande parte de suas promessas, a outros segmentos como o dos hispânicos. 

Por sua vez, Biden enfrentará dupla dificuldade: de um lado não terá maioria no Senado e, com o país polarizado, terá dificuldade de diálogo apesar da sua vasta experiência e de ter origem no próprio Senado. Outra dificuldade é que a Suprema Corte é majoritariamente conservadora. Também no interior do Partido Democrata a polarização dificultará as ações de Biden, na medida em que a esquerda mais radical manifeste certa impaciência com a sua moderação. 

No âmbito internacional, a palavra-chave de Biden será a restauração das alianças, como resume o comentarista global Paulo Portas da TVI. Ou como disseram o jornalista Fernando Gabeira e o prefeito de Londres, Sadiq Khan, é hora de retomar a construção de pontes, e não muros. A administração Biden deverá não só abandonar as decisões unilaterais do governo Trump, mas também deverá retomar os contatos com entidades supranacionais como Organização Mundial do Comércio (OMC) e Organização Mundial da Saúde (OMS).

Outras decisões serão o retorno ao Acordo de Paris, a reaproximação da União Europeia, a melhoria das relações no âmbito da NATO (Organização do Tratado do Atlântico Norte), a retomada da política de Obama para o Oriente Médio e das negociações do acordo comercial Ásia-Pacífico como forma de contrabalançar o peso da China. Aliás, a relação com a China não terá vida fácil, mas será menos crispada. O que será bom para países como o Brasil. 

“O desfecho da eleição nos Estados Unidos parece indicar algo mais do que a simples rejeição ao populismo nacionalista. Parece indicar que não há saída para a crise econômica e social dos nossos dias senão a cooperação, o diálogo, a negociação e a busca de saídas multilaterais” (Celso Ming, O Estado de S. Paulo, 07/11). 

Nesse sentido, pode-se dizer que entraremos numa nova fase na luta mundial para travar a pandemia. A tendência é que o governo Biden promova uma coordenação nacional com governos estaduais e instituições científicas e, no âmbito internacional, uma frente integrada com a OMS e indústria farmacêutica não apenas para atacar de imediato o coronavírus mas principalmente para adotar uma política de distribuição das eventuais novas vacinas de maneira a não deixar ninguém para trás. A visão trumpiana de “America first” parece superada. 

Pandemia, clima e economia

A perspectiva de uma nova visão nacional no combate à pandemia reforça, no ambiente doméstico, a importância da aprovação pelo Congresso dos Estados Unidos da proposta de novo pacote de alívio ao coronavírus (auxiliar os americanos atingidos pela pandemia), em valor superior a 2,2 trilhões de dólares, que enfrenta resistência dos republicanos. Será que agora, com a eleição definida, este pacote venha a ser aprovado?

O mesmo vale para a questão ambiental. No plano interno, o desafio é aprovar uma proposta de incentivos à substituição da energia fóssil pela energia renovável num Senado de maioria republicana. A volta ao Acordo de Paris significa que o país terá uma visão integrada das políticas de combate às mudanças climáticas, e não apenas ações isoladas de governos estaduais. Ao mesmo tempo, aumentará a pressão sobre o Brasil em relação às políticas voltadas para a Amazônia. Haverá boa vontade em contribuir com recursos financeiros para preservar a floresta desde que o governo brasileiro reverta a sua diretriz “de deixar passar a boiada”. 

No plano econômico, há uma visão de que travar o coronavírus – a proposta de Biden - não conflita com a retomada do crescimento econômico. As propostas de Biden basicamente prevêem aumento de impostos para empresas (de 21% para 28%), revertendo medida de Trump, taxação mínima sobre lucros estrangeiros (21%), acima dos atuais 10,5%, e incentivo fiscal (até 10%) para investimentos na produção nacional. Por outro lado, há um plano dos gastos públicos para recuperar a economia, a começar pelo pacote de estímulos que já se encontra no Congresso. O retorno ao crescimento da economia norte-americana beneficia todos os países, inclusive ao Brasil. 

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