Ninguém jamais conseguirá dar a conhecer um fato pelas palavras. Pelo menos não exatamente, fielmente. As palavras, por mais que o Aurélio e o Houaiss tenham procurado por elas, são limitadas. Já as possibilidades dos fatos e das circunstâncias são incalculáveis. Entretanto ninguém é tão capaz de contar um caso com tamanha verossimilhança e certeza quanto um mentiroso. O mentiroso acredita que o acontecimento que narra tem um único e irrefutável ponto de vista, o dele. Até porque, na maioria dos casos, ele, o mentiroso, é mesmo a única testemunha do fenômeno e, portanto, tem o benefício e a vantagem da dúvida. Quem vai contradizê-lo, senão ele próprio? Pois pode ficar tranquilo, ele não se denunciará nem sob tortura!
Sei de uns casos que me contaram, de ouvir dizer, faz muito tempo, do Toninho. Não sei se é mentira ou verdade. Quando me disseram, afirmaram, com todas as letras que a palavra há de ter, terem ouvido tudo dele, da boca dele, que um dia a terra há de comer! Eu também não fui atrás para confirmar se sim ou se não.
Certa feita o Toninho ia pela estrada dirigindo tranquilamente quando viu uma roda de carro rolando sozinha pela estrada, à sua esquerda e a ultrapassá-lo. E a roda ia mesmo passar na frente do seu carro quando ele resolveu acelerar “onde já se viu uma roda me ultrapassar?” – pensou. E afundou o pé no acelerador até que a roda, alguns quilômetros e curvas adiante, foi diminuindo a velocidade até tombar no asfalto. Toninho então parou ao lado da roda e sentiu seu carro também derribar ligeiramente para a esquerda, no chão. Desceu do carro e “uai, não é que a roda é a do meu carro!” – espantou-se.
De outra, dirigindo por uma estrada de terra, viu no meio da estrada uma cobra de um tamanho e uma grossura tão grande que não soube nem dimensionar. Disse que sentiu um baque quando passou em cima dela “pior que passar chutado por quebra-molas”. Contou que sua cabeça bateu no teto do carro, tal a violência do impacto. Afirmou que olhou de esguelha, mas não conseguiu ver mais a cobra pelo retrovisor “eu é que não vou parar pra ver!” Algum tempo depois sentiu o carro meio desestabilizado e a direção tremer, assim feito carro desalinhado e desbalanceado. Resolveu parar “e não era que o pneu estava vazio e com dois furos feitos pelas presas da cobra!” – contou.
E teve o dia em que o carro dele quebrou na estrada, lá pros lados onde Judas perdeu as botas. Todas, mas todas as marchas para a frente pararam de funcionar! Toninho não se fez de rogado, engatou a ré “pois num é que eu não vou ficar parado nessa estrada esperando o Daniel do Laudinor chegar sei lá quando, nem morto!”. E de ré veio de lá de onde estava até Resende Costa. E a certa altura “afundei o pé no acelerador” tanto, tanto que o velocímetro marcou 120 km por hora “foi num instantinho que eu cheguei.”
Mentira? Que isso!? Eu sou apenas um modesto intermediário dos casos que me contaram! Jamais diria que é mentira, ainda mais num veículo público e notório como este Jornal das Lajes. Deixo a cargo de cada um investigar e confirmar se quiser, ou não, essas histórias. Creio até que ele, se procurado, terá a maior boa vontade de explicar e esclarecer tudo isso, nos mínimos detalhes.
Afinal, outro dia, estava eu vagueando sozinho e Deus pelos campos lá na minha roça, bem pra lá de onde a vista alcança a minha casinha, quando começaram a cair uns pingos de chuva. Eu desembestei morro abaixo num ziguezague desvairado para desviar da chuva e a chuva caindo... Não é que quando eu me dei conta de mim, estirado na varanda, ainda com meu cigarrinho de palha no canto da boca – aceso, diga-se –, mais ofegante que corredor de maratona em final de corrida, a chuva caindo feito dilúvio e passei os olhos pela minha roupa, percebi que não tinha caído nem uma gota nela: tava mais seca que roupa estendida em varal no deserto do Atacama.
E tenho Deus por testemunha!
Deus é testemunha!
13 de Julho de 2009, por Rafael Chaves