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Morte e vida com coronavírus

10 de Maio de 2020, por João Bosco Teixeira

Novo coronavírus, causador de mortes. Novo coronavírus, antecipador de vida.

É assim que vou vendo essa terrível epidemia. Terrível, porque causadora de terror. Terrível, pois, ainda não se conhece bem esse minúsculo ser sobre o qual, a cada dia, descobre-se uma novidade. Sabe-se que poucas partículas do vírus são suficientes para infectar uma pessoa.

Sabe-se que ao entrar no corpo o vírus encontra receptores aos quais se conecta e começa a se replicar. Sabe-se que atua em sistema. Sabe-se que as pesquisas são preliminares e muita investigação científica se faz ainda necessária para validar as hipóteses dos pesquisadores. Isto é: sabe-se que não se sabe. Cada dia uma novidade. Cada dia uma incógnita. Cada dia o desafio colocado para quem pretende saber da “vida”: o que é, em que consiste, como se estabelece, onde teve origem. 

Enquanto isso, mata.

Comovem-me todas as mortes. Algumas, porém, em particular. Comovem-me aquelas mortes de quem atende os que podem morrer. Estão lá, lado a lado, com uma segurança discutível, com o cuidado indiscutível, com uma esperança que pode ser contra toda esperança. É dedicação em estado puro. É saber que não vale viver se não for para que outros vivam. É colocar a própria vida em segundo plano, frente à vida do outro. Por isso digo: Bem-aventurados os que morrem pelos que morrem, pois já estão nos braços do Pai comum.

Novo coronavírus, fonte de vida. Vida que nasce da “comunhão”, da união com aqueles que morrem porque não conseguiram vencer o inimigo. Comunhão igualmente com aqueles que morrem para não deixar outros morrerem. Eles estão morrendo por nós, levados pelo compromisso profissional, que, acredito, não se sustenta sem a plena convicção de que é preciso lutar para viver, para não deixar morrer, para não se abater com a derrota frente ao desconhecido. Doam a vida: são mártires, na melhor acepção da palavra. Pois não há maior amor que doar a vida pelo irmão. Por isso, recebem a vida, que vírus algum aniquila.

Temos tido grande oportunidade de experimentar a verdade de que não se vive em vão. Como suportar ver o irmão definhar, ir-se embora, sem colocar nisso um sentido maior? Como, em pleno século vinte e um, marcado por avanços tecnológicos em todas as manifestações de vida, não conseguir controlar esse conhecido coronavírus, na sua atual manifestação de “novo coronavírus”? Não me escape a verdade de que a vida não só é misteriosa na sua origem quanto o é no seu desenrolar, nas suas insondáveis manifestações. E isso é que me leva de volta para onde ela teve origem. Sim, a Covid-19 me está dando a oportunidade de reconhecer o dom da existência, de melhor me conhecer, de entender que ninguém é senhor da vida, exceto aquele que deu origem a ela.

A Covid-19 tem fortalecido em mim o sentido da comunhão. Comunhão na vida: uns pelos outros. Comunhão na morte: todos para a fonte da vida.

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