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Peixe fresco

15 de Abril de 2015, por Cláudio Ruas

Olhos vivos, pele brilhante, guelras vermelhas, carne firme e cheiro de mar ou de rio (não de peixe!). Esse é o peixe fresco, que consequentemente não pode ter sido pescado há muito tempo nem muito longe, muito menos maltratado no meio do caminho. O peixe e tantas outras criaturas do mar e das águas costumam ser iguarias tão especiais que, se a gente bobear, “a onda leva”.

O Brasil e o mundo vivem hoje um momento delicado no que diz respeito à questão da pesca, da oferta de pescados (cada vez menos frescos) e dos impactos ambientais. Nunca se comeu tanto peixe, o que é muito bom. Porém, a forma como isso tem se dado é preocupante: a pesca indiscriminada tem ameaçado muitas espécies de extinção, enquanto a aquicultura desenfreada também tem trazido prejuízos ambientais, sociais e até culturais (explico adiante).

Como todos sabem – ou deveriam saber – a natureza tem seus ciclos e suas épocas de produção. A manga, por exemplo, costuma dar principalmente entre o fim e o início de ano. Ou seja, se você quiser comer manga o ano inteiro ou você vai ter que “forçá-la” a produzir ou então ir buscá-la longe, lá na China. Com os pescados tem ocorrido a mesma coisa, o que tem comprometido e muito a qualidade do alimento, assim como no exemplo da manga. A colhida no quintal, na época certa, é infinitamente superior àquela que atravessou o mundo e/ou foi forçada a produzir.

Além disso, no caso dos pescados, ainda existe o agravante do impacto ambiental, sobretudo no que diz respeito à ameaça de extinção de muitas espécies em função da pesca indiscriminada, seja nos mares, rios ou lagoas. Falta regulação, fiscalização, educação e consciência, não só de quem pesca, mas também de quem consome “de olhos fechados”.

A dificuldade em capturar os pescados por perto faz com que os pescadores naveguem cada vez mais longe no mar, demorando para retornar. Ou seja, quando aquele barco encosta no porto para descarregar – e você imagina inocentemente que os pescados estão fresquíssimos – às vezes parte deles já foi pescada há mais de uma semana. E ainda tem um longo e tortuoso caminho a percorrer até chegar ao seu prato, passando por atravessadores, entrepostos, caminhões inadequados, estradas, aviões, aeroportos, centros de distribuição, supermercados...ufa!

No Brasil essa cadeia é muito precária, o que não só estraga o produto, mas o encarece também. Diante disso, os mercados estrangeiros nadam de braçada, como o do Chile, da China, do Vietnã e até do Alaska, que vem tomando conta do nosso mercado, das nossas panelas e da nossa cultura. Tudo bem vender um salmão chileno por aqui, mas é uma pena não poder comprar um dourado do Velho Chico, ou uma truta criada logo ali na Serra da Mantiqueira, ou então uma boa traíra pescada ali na rocinha ao lado, conforme nossa tradição cultural. Tudo o mais fresco possível, graças à curta distância a se percorrer e à cadeia produtiva mais inteligente e justa, que ajude e estimule o pequeno produtor. Globalização tem limites.

 

A tilápia vem sendo um peixe muito cultivado e pode ser uma boa alternativa caseira para a falta de peixe fresco, pois é de fácil manejo e bom rendimento, mesmo em pequenos espaços. Tem uma carne branca e suave, ideal para se fazer o “ceviche”, prato típico do Peru e do Chile, que caiu no gosto do lado de cá da Cordilheira dos Andes também. É delicioso e facílimo de se fazer: basta picar o peixe em cubos e adicioná-lo a uma mistura de suco de limão, sal, azeite, cebola roxa picada finamente, coentro/salsinha e dedo de moça picadinha. Misture e leve à geladeira por vinte minutos, tempo suficiente para que os ácidos do limão e da cebola, juntamente com o sal, “cozinhem” o peixe sem necessidade de ir ao fogo. Sirva em uma taça individual ou cumbuca, acompanhado de mandioca frita. O pré-requisito básico e essencial para essa receita é que o peixe seja fresco, o que também deveria ser a regra de consumo para tantos outros preparos. Definitivamente, isso não é frescura.

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