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Gastronomia e pandemia

15 de Julho de 2021, por Cláudio Ruas

Voltando a aparecer por aqui após um período meio sumida, essa coluna não poderia deixar de falar dessa tale pandemia. Que tomou as rédeas do mundo e rumou prum caminho de muita dor, prejuízo e mudanças, para tudo e todos, inclusive para a gastronomia e nossos hábitos alimentares.

Do dia pra noite, fecha tudo na cidade, todo mundo pra dentro de casa, sem boteco, sem restaurante, sem festas e eventos. E aí vai o povo (principalmente da cidade) ter que cozinhar mais ou então pedir pelo delívere. Durante um longo período. Baita mudança, né?! Entender os reflexos disso tudo pra valer vai levar tempo, até porque a pandemia ainda está aí. Porém, já podemos perceber um bocado de coisa nesse novo capítulo da história da alimentação.

É bom não esquecer que já vínhamos num processo de mudança de hábitos alimentares, com as pessoas cozinhando e bebendo mais em casa, buscando produtos melhores, valorizando as coisas artesanais, locais e os pequenos produtores – e se aproximando mais deles, inclusive. Uma tendência do mundo e que já tinha apeado por aqui em Resende Costa. Aí chegou esse pandemônio e deu um empurrão, daqueles bem fortes e inesperados. Vaapo!

Parece bizarro falar em lado positivo numa coisa tão terrível como essa doença, que está levando a vida de muitos e trazendo dor e destruição para tantos outros. Mas é inegável que certas mudanças que ela vem proporcionando podem, sim, ser vistas positivamente. A volta ou aumento do simples ato de cozinhar, que, infelizmente foi se perdendo em parte da sociedade, é algo a se comemorar. Até porque existe muita coisa por trás disso, desde a questão de saúde até os aspectos culturais, sociais, afetivos e políticos. Reunir-se em volta do alimento é algo sublime, ancestral e necessário. Foi a partir desse ato que nos transformamos, ainda lá no tempo dos povos das cavernas, quando controlamos o fogo e começamos a cozinhar, criar e cultivar os alimentos. Ali nos tornamos humanos.

Quando nos aproximamos mais da cozinha, nos aproximamos também dos ingredientes e produtos. Com isso, vamos dando mais atenção às suas características, conteúdo e procedência. Aí o cabôco prova um trem diferente, começa a entender melhor da coisa e passa a ter mais acesso e opções, inclusive podendo se aproximar mais do artesanal e de quem o produz. Mesmo estando trancado em casa, o sistema evoluiu e se adaptou. E, para aqueles que ainda têm condições econômicas em meio a essa enorme crise, com apenas alguns cliques a pessoa adquire um produto diretamente duma roça a milhares de quilômetros de distância dele. Ou logo ali do lado mesmo, que ele nem sabia que existia. Uma grande vantagem também para os pequenos produtores rurais, heróis anônimos que sempre estiveram à margem da sociedade, alimentando o mundo, mas sem ter nenhum reconhecimento à altura desse trabalho tão duro e importante. Juntamente com essa valorização, vem aí uma nova e grande onda de turismo local, e nosso município precisa se preparar melhor para aproveitar essa oportunidade.

Por outro lado, a pandemia vem causando um estrago gigantesco no setor de bares e restaurantes. Tiveram que se adaptar na marra, com regras de funcionamento, abre e fecha repentinos e também com o serviço de entrega, que parece fácil... mas não é. Sem apoio algum do estado e com os impiedosos boletos e encargos do mesmo jeito de outrora. Já que realmente as medidas de restrições e fechamento são necessárias e óbvias, é preciso que haja uma contrapartida do poder público, como tem ocorrido em outros países (essa é uma das funções dele, ?!). Nós também, como consumidores e cidadãos, podemos fazer a nossa parte e ajudar esses estabelecimentos tradicionais da nossa cidade, consumindo seus produtos por delívere ou indo lá buscar (você tem feito isso?).

Essa tale pandemia também nos mostrou que precisamos evoluir muito como civilização, principalmente no Brasil. A carência de políticas eficazes de enfrentamento do problema, a falta de vacina, de máscara boa (e vergonha) na cara, juntamente com a total ausência de empatia e responsabilidade de parte da população, mataram e destruíram milhares de vidas (você mesmo fazendo a sua parte?). Mas ainda temos a oportunidade de tentar mudar nossas condutas, inclusive na cozinha. Inclusive, lembrando todos os dias que, sim, “comer é um ato político”.

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