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A tragédia em Mariana

17 de Novembro de 2016, por Instituto Rio Santo Antônio

Agora em novembro, mais especificamente na tarde do dia cinco, fez um ano da tragédia em Mariana. O rompimento da barragem de rejeitos de Fundão, da Samarco S/A, causou danos gigantescos ao meio ambiente e à população que vive ao longo do Rio Doce. O evento é considerado o maior desastre socioambiental da história brasileira e o maior do mundo sobre a questão. Mesmo passado um ano do sinistro, a maior parte dos problemas ainda não foi equacionada.

Como os minérios não estão puros na natureza, é necessário separá-los de outros elementos. No beneficiamento geralmente se utiliza água e a sobra (rejeito) vai para barragens, que são, na prática, imensas lagoas de lama, barro e água. Algumas são enormes, maiores até que cidades pequenas, como Resende Costa. Na área da Samarco havia três: Germano, Fundão e, mais abaixo, Santarém. Particularmente, conheci a barragem maior e que não estourou, a de Germano. Literalmente um mar de rejeitos, melhor, de lama.

Em 2014 o preço do ferro havia caído para quase 1/4, a empresa, para compensar, aumentou a produção em três vezes, chegando a 25 milhões de toneladas anuais. Sendo que mais de 60% do que é extraído vira rejeito, dá para se ter uma ideia do tanto de material que era jogado nas barragens e que desceu ao longo do Rio Doce. Como a barragem de Fundão estava ficando sem vida útil, ou seja, cheia de rejeito, ela foi alteada (elevação do aterro para aumentar sua capacidade) várias vezes. Essa foi a principal causa do rompimento. Claro, aliado a outros fatores, como falta de efetiva fiscalização dos órgãos competentes (FEAM e DNPM), omissão de informações técnicas, negligência.

Os danos à biodiversidade ao longo do rio Doce foram enormes. Fala-se que o rio demorará décadas para recuperar seu estado anterior ao desastre, o que já era lastimável. Passei na rodovia ao lado do rio duas semanas antes do evento, o que se via era pouca água, bancos de areia e, certamente, águas poluídas pelo esgoto. O rio que estava doente, com a enxurrada de lama, foi para a UTI.

Em termos socioambientais os danos à região são incalculáveis. Uma questão que não se fala mais na mídia é a influência causada pelo rejeito no mar. A partir da foz do rio, no Espírito Santo, a lama se espalhou 20 km pelo oceano adentro e 40 km em sentido norte. Mesmo os especialistas não sabiam direito qual seriam os impactos do fato, pois nunca na história tanto material havia chegado ao mar tão rápido.

O pior são os transtornos causados à população, dentre outros: paralisação ou problemas no abastecimento de água nas cidades situadas ao longo do rio, falta de trabalho para os antigos pescadores, danos à agropecuária familiar, destruição da comunidade de Bento Rodrigues e de outras casas, duas dezenas de mortos etc. Imagine o lugar onde você, seus pais e avós moram ficar destruído de um dia para outro. E você perder quase tudo: roupas, documentos, fotos antigas, móveis, animais domésticos.

O que mais salta aos olhos é ver que vidas humanas são menos importantes que minérios, que dinheiro, que lucro. Aqui cabe destacar que a Samarco é uma empresa criada pelas duas maiores mineradoras mundiais: a australiana BHP Billiton e a brasileira Vale S/A. Empresas controladas por acionistas (Fundos de pensão, grupos de investimentos, grandes empresários) que só querem o lucro de suas ações no final do ano, custe o que e a quem for. Para se ter uma ideia, em 2014 a Samarco teve um lucro líquido de quase R$ 3 bilhões. Mas, como sempre, o lucro é individualizado e o passivo (impactos socioambientais) é dividido com toda a população.

Passado um ano, o que fora acordado com a empresa vem sendo protelado: recuperação do rio, apoio à população afetada, obras de contenção e de estabilização na área da barragem, multas não pagas. Resultado: o novo período chuvoso está começando e a lama continuará escorrendo pelas veias do Doce.

Segundo o projeto Manuelzão, a tragédia em Mariana “mostrou a insustentabilidade da gestão ambiental demonstrando as falhas no processo de gestão, licenciamento, fiscalização, monitoramento e sistema de emergência.” Por fim, fico com as palavras de Márcio Borges, do Clube da Esquina: “Quem vai pagar pelo que não tem preço”.

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