Jesus e Laura. Tia Jusceia e tia Lúcia do João Bosco. Dona Dilma, Regina Azevedo e João Bosco do Zé Mendonça. Tia Turca e Adenorzinho. Dona Aleluia, Ana do Galo e dona Ângela. Cidinha da dona Nita. Dona Eliana, a do Tatita. Fatinha Coelho, Myrian do Cassiano, Maria Moreira, José Antônio, Regininha e Regina Coelho. Elzi, Alvair do Vavá e Maria Lúcia Chaves. Tião Melo e dona Maria da Penha. Ermínio, Eli, Lúcia Resende, Mário Márcio e Doralice da Emater. Dona Ieda Melo, seu Élson, César da Farmácia, Regina Argamim, Maria José, Cláudia do Sandro e Marcos. Camilinho. Tela Coelho, Stela Vale Lara e Ana Cláudia. Dona Inácia.
Isso não é simplesmente uma lista de nomes. São alcunhas que plantam em mim muita memória. Cada palavra aqui escrita foi pronunciada várias vezes em minha vida. Esses nomes com seus especificadores percorreram minha vida afora sempre. Falados e ouvidos, escritos em cartas no Dia dos Pais, no Dia das Mães ou nas capas dos meus cadernos escolares.
Jesus, nome tão bonito e sagrado aos meus ouvidos desde a primeira infância, é nome do filho de Deus, é nome de Deus e é também o nome do meu pai. Conhecido pelas ruas de Resende Costa como Didi do Ribeirão ou Didi Pedreiro, ele é quem me gerou no ventre de minha mãe, quem desde cedo me deu exemplos de vida, de honestidade, de atitudes humanas eivadas de amores e furores. Humano, com seus rompantes de braveza e flores de amor, sempre me ensinou a viver com dignidade e respeito.
Laura, nome com aura em si mesmo colocada, uma coroa de vida engendrada sobre mim. Seu útero deu ao mundo dez filhos. Eu, o oitavo embrião vindo desta mulher amorável e às vezes dura quando necessário. Mulher forte no trato com a vida, como forte sempre foi também meu pai. Os dois progenitores, amando os dois rebentos que se foram muito cedo desta vida, e amando cotidianamente os oito filhos que ainda permanecem na faina de viver. O amor é tanto, que se estende como sombra protetora sobre genros, noras e netos. Amor sem medidas.
Didi e Laura, meus pais, de mãos dadas comigo, me ensinando a construir e a tecer vontades de vida plena. O pedreiro e a tecelã, e lições de tecelagem e construção, tessitura e argamassa, sendo aprendidas por mim. A luta para criar os filhos, a perda de dois deles, colchas e casas sendo construídas porque a vida tem urgência de abrigo, calor e carinho. Genitores de amor, braveza, brados e carícias.
Os demais nomes citados também caminharam comigo. Caminharam e caminham. Nos bancos das escolas Estadual Assis Resende e Conjurados Resende Costa, escutei suas vozes, suas broncas, sua paciência cotidiana no ofício de ensinar, de cobrar lições todos os dias, de demonstrar exemplos de competência e ética. Quase nada me sai da lembrança. As orações subordinadas, a tabela periódica, o relevo brasileiro, a ida do homem à Lua, as equações do segundo grau com duas variáveis, a Citologia, a reprodução da vida, a perestroika e a glasnost, o Capitalismo, o Socialismo, a Guerra Fria. E como era difícil o “What’s your name?” saindo incipiente e torto de nossas bocas aprendizes! O diagrama de Linus Pauling, que não sei se ainda é estudado nas escolas. As palavras denotativas, a sintaxe e o emaranhado de palavras nos livros, em minha cabeça e nas minhas mãos.
Tia Jusceia e tia Lúcia do João Bosco me ajudando nos andaimes rudimentares da linguagem. As primeiras letras. As cartilhas pelas quais eu viajava vendo que a ave voa, a ave do Vavau; vendo a vida que ia, a vida escorrendo de alegria e tempo. Tempo de aprender. A cidadezinha sem poluentes. Os desenhos, os textos, o corpo humano em aprendizagem e vivência. A indomável e importante água nos matando a sede e nos fazendo importantes por sabê-la inodora, incolor e insípida. E uma vontade tamanha de dizer às professoras que não era bem isso, que a água tem gosto de água, tem cor de água, tem cheiro de água. Um cheiro de vida e frescor, uma cor de frio gostoso matando a sede, um gosto de felicidade amainando cansaços. E a água da chuva caindo em nossas vidas pelas ruas de Resende Costa.
Dona Dilma, Regina Azevedo e João Bosco do Zé Mendonça. Nossas corridas debaixo de um grande ipê no pátio da escola, as partidas de queimada e a bola girando alta e forte, batendo em nossos braços e pernas com vontade. Minhas chinelas Havaianas esquecidas debaixo da árvore e sumidas para sempre. Isso no tempo em que muitas crianças pouco tinham para vestir e calçar. Os exercícios no pátio, e suor que não acabava mais.