A mãe e a tia, avisadas, mandaram mensageiros para a lavoura, onde o pai e os irmãos estavam na labuta. Os homens voltaram, assustados e prestimosos. Organizaram uma busca dentro do córrego, perto da grande pedra. Nadaram mais para baixo, seguindo a correnteza. E nada de encontrar as desaparecidas.
Depois, decidindo por fazer mais um mergulho, um dos irmãos baixou mais rente da base da pedra e viu uma passagem lá no fundo das águas. Estranho não existir ali um redemoinho! As tranças dos cipós não poderiam inibir a formação do sumidouro, pois elas não seriam suficientes para impedir que as águas tragassem o que estivesse na superfície. Entre um cipó e outro havia brechas, passagens suficientes para dar força de sucção à água. Como podia ser aquilo tudo?!
O rapaz chegou com a cara mais perto daquela abertura e, de repente, foi puxado por mãos bonitas, de unhas compridas e esmaltadas. Saiu do outro lado, num mundo também subaquático e cheio de plantas.
As mãos que o tinham puxado eram de uma linda sereia. E muitas outras sereias iguais a ela nadavam ali. Bustos de mulheres atraentes e caudas de peixe astuto, todas elas davam voltas em torno de um homem com coroa de algas e pedrinhas brilhantes na cabeça. Era majestática a postura daquele homem entre mulheres, rodeado pelas beldades que lhe rendiam graças, que se curvavam ao seu redor. Ele era, sem dúvida, uma importante figura.
O homem de imediato lhe dirigiu a palavra, dizendo ser o rei das iaras e lhe perguntando por que tinha chegado tão perto do portal do seu reino. O rapaz explicou que procurava por suas duas irmãs desaparecidas e as descreveu ao rei com detalhes minuciosos: as roupas que usavam, a cor dos olhos, o tom dos cabelos etc.
O rei ouviu tudo com um sorriso sarcástico no olhar. Depois das explicações do jovem, sua alteza vociferou com autoridade, dizendo que as duas irmãs estavam ali, que já eram suas prisioneiras e que seriam esposas reais. Confiante em seu poder, não mediu as palavras ásperas dirigidas ao moço.
No entanto, o irmão defensor da família reagiu, não obedecendo às hierarquias existentes nesses mundos de nobreza. Ameaçou dizendo que vários homens da sua terra (irmãos, primos e parentes) invadiriam aquele reino e destruiriam tudo, caso o rei não retrocedesse em sua decisão.
O monarca foi esperto e resolveu negociar. Queria ganhar tempo e sabia muito bem que antes vale um pássaro na mão do que dois voando. Tendo considerado a irmã mais velha a mais bonita das duas, decidiu ficar com ela em seu reino. Disse ao rapaz que ele poderia, então, levar somente a irmã do meio naquele momento e que depois poderia voltar, com mais calma, para conversarem sobre um possível casamento entre ele, o rei, e a irmã que ficaria no seu reino.
– Voltarás aqui com teu pai e dialogaremos sobre o que será melhor para a tua irmã. Quero-a como esposa e vos darei meu reino por ela.
O moço acreditou, pegou sua irmã do meio pelas mãos, e ambos voltaram pelo portal onde ele passara.
Qual não foi a felicidade da família – que já esperava aflita –, quando viu irmão e irmã emergindo das águas!
O jovem conversou com todos, explicou o que estava acontecendo e voltou com o pai até a base da pedra para irem ao reino das sereias. Foram-se, esperançosos de que algo poderia ser feito, de que o rei desistiria do seu mau intento.
Só que, chegando os dois ao fundo do córrego, não havia mais nenhum portal. A passagem deixara de existir. E a irmã mais velha nunca mais apareceu. Sabe lá Deus qual tenha sido o seu destino.
O menino caçula acreditava em todas essas palavras da irmã. Mesmo que a ribeira fosse um fiapinho à-toa, pouca água escorrendo entre pedras e areia, ele não duvidava de nada. O medo de afogamento afugentava seus braços e pernas inexperientes. A profundidade daquele corregozinho era um mito, uma verdade não experimentada, um fato inquestionável. Ele também nem desconfiava de que o brilho nos olhos da mana, quando os lábios contavam história tão linda, espelhava o desejo que ela mesma tinha de ser a mulher escolhida pelo rei lá nas profundezas do córrego.