Especial centenário de nascimento do monsenhor Nelson: Apresentação


Especial centenário de nascimento do monsenhor Nélson

André Eustáquio, Emanuelle Ribeiro e João Magalhães1

Os jornalistas João Magalhães, Emanuelle Ribeiro e André Eustáquio

Neste ano, Resende Costa celebra os 100 anos de nascimento do monsenhor Nélson Rodrigues Ferreira. Em homenagem ao pároco que dedicou sua vida à cidade durante 44 anos, o JL inicia nesta edição uma série de doze reportagens especiais sobre a vida do monsenhor Nélson. A série de reportagens surgiu a partir de um projeto de escrever a biografia do monsenhor, idealizado pelos jornalistas André Eustáquio, Emanuelle Ribeiro e João Magalhães.

Esta série especial de reportagens será elaborada a partir de entrevistas e depoimentos que fizemos com pessoas que conviveram diretamente com o monsenhor Nélson e através de análises de documentos, como cartas, Livro do Tombo da paróquia, fotografias e outros registros. Sobre a sua infância, família e período de seminário, nossas conversas com sua irmã HaydeeFerreira (falecida em maio de 2013, em Piedade do Rio Grande - MG) foram preciosas. Dezinha, como era conhecida, nos revelou uma enorme riqueza de detalhes sobre a vida do menino Nélson, que viveu até os 8 anos de idade no povoado do Paraíso, município de Piedade do Rio Grande. “Padre Nélson foi desde criança um sacerdote completo. Ele gostava de brincar de celebrar missas e sempre estava presente na igreja”, contou Dezinha.

O pároco emérito da catedral basílica de Nossa Senhora do Pilar, em São João del-Rei, monsenhor Raimundo Sebastião Paiva, que há 60 anos se dedica à catedral, se lembra de quando teve o primeiro contato com o padre Nélson, naquela ocasião vigário coadjutor do Pilar: “Conheci o monsenhor Nélson quando eu ainda era criança. Eu morava no Tijuco (bairro de São João del-Rei) e o monsenhor fundou um catecismo lá. Lembro-me que da Ponte do Rosário ele ia tocando uma campainha chamando os meninos, era coisa da época. Final da década de 1930. Quando fui para o seminário, fui até ao monsenhor Nélson pedir minha certidão de batismo. Passei a ele meu nome e outras informações. Quando ele meencontrou fez uma brincadeira comigo: ‘Não estou encontrando sua certidão. Você não foi batizado não, menino’. – ‘Fui sim, seu padre’. – ‘Você não pode ir para o seminário não’. Comecei a querer chorar, aí ele disse: ‘Olha, encontrei. Mas quem vai acreditar, você foi batizado no dia 1º de abril’. Depois de padre, sempre fomos muito amigos, ele vinha aqui, conversávamos”.

O primeiro dos oito filhos do casal José Mendes Ferreira e Maria Madalena Rodrigues Ferreira, monsenhor Nélson nasceu no dia 17 de fevereiro de 1914, na Fazenda do Córrego do Peixe, Emboabas, município de São João del-Rei. Na igreja do povoado de São Sebastião do Paraíso, recebeu a primeira comunhão no dia 14 de abril de 1921. E em 1927, com apenas 13 anos de idade, foi para o tradicional e renomado seminário da Arquidiocese de Mariana, onde realizou os estudos de preparação para o sacerdócio. Eram tempos difíceis. Os seminaristas pouco visitavam os familiares, mesmo em períodos de férias. “Era muito difícil para chegar a Mariana. Os seminaristas tinham férias em dezembro, janeiro e fevereiro. No meio do ano eram férias curtas, permaneciam em Mariana”, disse monsenhor Paiva, que também estudou em Mariana.

Ao longo desta série, detalharemos o longo e dispendioso período em que padre Nélson permaneceu em Mariana. As inúmeras correspondências entre ele e sua mãe revelam situações tensas, como a doença que quase o tirou do seminário de forma definitiva. Dona Mariquinha, como era conhecida sua mãe, assumiu as dificuldades encontradas pelo filho e com isso possibilitou que o grande sonho do menino Nélson enfim se realizasse no dia 4 de abril de 1937. Pela imposição das mãos do arcebispo de Mariana, dom Helvécio Gomes de Oliveira, o diácono Nélson se ordenou sacerdote na igreja de Nossa Senhora das Mercês, em Mariana, na companhia de outros três diáconos. Inicia-se uma brilhante trajetória na Igreja. Após a ordenação, foi nomeado vigário coadjutor de Visconde do Rio Branco (MG), onde permaneceu até 8 de março de 1938, quando foi transferido para a paróquia de Nossa Senhora do Pilar em São João del-Rei, permanecendo como coadjutor até 14 de fevereiro de 1944.

Pouco depois de completar 30 anos de idade, foi nomeado pároco de Nossa Senhora da Penha de França, em Resende Costa, no dia 15 de março de 1944. O jovem sacerdote inicia uma nova e definitiva etapa em sua vida. Resende Costa, por sua vez, acolhe um homem que a toma como mãe e por ela dedica integralmente sua vida e missão. É o início de um paroquiato longo e profícuo. Resende Costa poderia ser considerada uma pequena vila nos idos dos anos 1940. A cidade não dispunha de serviços hoje considerados básicos, como água tratada, hospital, meios de transporte eficientes e muito menos veículos de comunicação. A atual igreja matriz de Nossa Senhora da Penha estava inacabada em 1944. O ex-pároco, padre Heitor de Assis, havia demolido a antiga matriz com o objetivo de construir um novo templo que pudesse acolher uma população que crescia. Mas as contingências daquele momento não permitiram que padre Heitor inaugurasse a nova matriz. Tarefa que coube ao novo pároco. Dar continuidade a uma obra de tamanho vulto para Resende Costa dos anos 40 foi a primeira missão do jovem padre, que a cumpriu com esforço, dedicação e bom-gosto. Em 11 de dezembro de 1955, padre Nélson entrega à cidade a igreja matriz pronta, com os altares cuidadosamente talhados, pinturas e vitrais condizentes com a dignidade do templo e com a fé do povo.

Conforme demonstraremos no decorrer desta série, o trabalho do monsenhor Néelson frente à paróquia de Resende Costa foi marcado por sua inquestionável dedicação à missão que lhe fora confiada pela Igreja. “Ele era um padre sério, levava a sério o sacerdócio e se identificou com Resende Costa. Ele apresentava muito bem a cidade a todos nós, contava vantagem, amava o lugar. Brincava nas reuniões, nas rodas de conversa. Ele foi admirável. Merece todas as homenagens, pois deu sua vida por Resende Costa”, disse monsenhor Paiva que, além de colega no clero, foi amigo pessoal do monsenhor Nelson.

 

Além da sacristia

 

A missão do monsenhor Nelson não se limitou apenas às obras materiais e espirituais na igreja de Resende Costa. A cidade encontrou no pároco virtuoso e trabalhador um dos homens que mais se dedicaram para o seu desenvolvimento. Seu empenho foi decisivo para a educação no município. O monsenhor foi um dos fundadores do Ginásio Nossa Senhora da Penha, onde fora professor e diretor entre os anos 1960 a 1977. Seus ex-alunos de História e Geografia testemunham a grande capacidade intelectual e didática do padre professor, bem como sua rigidez nas avaliações e na disciplina.

Sua influência entre políticos da época foi decisiva para melhorias fundamentais no município. Entre elas a construção do acesso asfáltico de Resende Costa à rodovia Belo Horizonte/São João del-Rei – conquista importante para o desenvolvimento da cidade. Essa foi uma obra, entre tantas, de benefício à cidade que tiveram a participação direta e a bênção do monsenhor Nélson.

Padre, professor e também homem público, monsenhor Nélson esteve à frente da prefeitura de Resende Costa durante breve tempo: de 28 de novembro de 1945 a 2 de dezembro do mesmo ano, quando houve nova eleição que elegeu prefeito o doutor José Vilela Costa Pinto.

Monsenhor Nélson destacou-se também por defender a moral católica. Sacerdote virtuoso, homem culto e de sólidas convicções, formou uma geração de famílias resende-costenses na fé, na cultura e na observância da moral.

Enquanto teve saúde e forças, monsenhor Nélson acompanhou cada passo dado pela cidade. Era comum vê-lo visitar obras, quer sejam públicas ou particulares. Ele observava, dava sugestões, conversava. Seus interlocutores se lembram do papo agradável, da vasta cultura, do humor inteligente e do sorriso afável. Os passos de Resende Costa, de 1944 a 1988, estão minuciosamente registrados no Livro do Tombo da paróquia: uma preciosidade onde o pároco escreveu, além do que era de praxe, suas opiniões sobre os acontecimentos na Igreja, na cidade, no país e no mundo. Nada escapou do olhar aguçado e da reflexão instigante do monsenhor Nélson. “Eu ficava impressionado em ver o Livro de Tombo que ele fazia. Riqueza de detalhes. Eu não fiz o Livro de Tombo assim não. Tem aí (na paróquia do Pilar) mais de 40 volumes com programas e notícias de jornais com relação à paróquia, mas escrever como ele escreveu eu nunca vi. Maravilhoso. Ele era um estudioso”, recorda monsenhor Paiva.

 

Na noite do dia 18 de março de 1988, Resende Costa ficava órfã. Os sinos dobravam em sinal de luto e os autofalantes da matriz anunciavam a morte do monsenhor Nélson. Após alguns dias de internação no Hospital das Mercês, em São João del-Rei, ele faleceu. “Ele pressentiu que ia morrer naquele dia, suas pernas estavam muito roxas, ele recusou o café. Seu último pedido, feito ao Tadeu do Cici, foi pedir que buscasse em Resende Costa a sua batina roxa, de monsenhor”, disse sua irmã Dezinha. O velório comoveu Resende Costa. Jamais se viu, até aquela ocasião, tamanha multidão em um cortejo fúnebre na cidade. A cidade chorava ao se despedir para sempre do seu querido pároco, benfeitor e amigo. “Acompanhei o fim da vida dele. Quando morreu o levei a Resende Costa. Lembro-me do sino tocando. Foi muito comovedor. Senti muito a morte dele”, conclui monsenhor Paiva.

Comentários

  • Author

    PARABÉNS! BELA REPORTAGEM! Fiquei orgulhoso pela homenagem ao meu Tio Padrinho Padre Nelson, do qual levo o nome completo. Abraços e até o dia 17/02.
    Nelson Rodrigues Ferreira Sobrinho.


Deixe um comentário

Faça o login e deixe seu comentário