Fazenda do Andrade: beleza, história e pioneirismo


Conheça o Município

André Eustáquio / Cláudio Luís Resende0

Fazenda do Andrade antes da reforma de 1984

A série “Conheça nosso município”, uma parceria do Jornal das lajes e EMATER – MG, fez, nesta edição, uma pausa nas matérias sobre a história dos povoados da nossa região, para apresentar, a pedido de vários leitores, a Fazenda do Andrade. Para contar a história da fazenda faremos uma adaptação do texto retirado do livro: SEDES DE FAZENDAS MINEIRAS – Campos das Vertentes: séculos XVIII e XIX. Autora: Helena Teixeira Martins.

A sede da Fazenda do Andrade foi erguida nas proximidades do Curralinho dos Paulas, no município de Resende Costa, antigo Arraial da Laje. É banhada pelo Córrego do Andrade. Seu nome original era Capão Fundo. Passou a ser chamada Fazenda do Andrade por ter pertencido a um certo Andrade de Passa Tempo. Suas terras somavam 280 alqueires (mais de 1.355ha). Na época, não tinha ainda casa de morada, mas já estava em construção o engenho, quando morreu o tal Andrade. Como sua viúva não conseguiu meios para pagar o arrolamento, a propriedade foi a leilão e arrematada por João Evangelista de Souza Maia, na segunda metade do século XIX. Foi ele quem construiu a sede, cuja obra foi executada por oficiais levados de Tiradentes. Sua construção e organização contou com requintes que incluem a ermida dentro da casa provida até de harmônio.

Seu sucessor foi o filho de Antônio de Souza Maia, casado com Maria Carolina de Oliveira. Lembram ainda que os Maias importavam roupas finas da Europa, usadas em ocasiões festivas no arraial. Ao herdeiro, Francisco de Souza Oliveira, tocaram 60 alqueires de terras (290ha) de cultura e campo, mais uma casa de vivenda (habitação mais ou menos suntuosa), sede da Fazenda do Andrade. Consta que este herdeiro recebeu a fazenda em estado de conservação precário.

A casa da Fazenda do Andrade foi implantada na base de um morro que termina numa extensa e larga várzea, tendo ao fundo colinas onduladas, descortinando-se, bem distante, uma serra azulada, delimitando a linha do horizonte. A casa fica sobre porão alto. As portas de madeira têm a particularidade de possuírem alguns portais ocos para esconder armas (costume da época).

Soma a casa 17 cômodos, incluindo cozinha, banheiro e pequeno compartimento que antecede o banheiro. O tamanho da casa, entretanto, evidencia ter sido ela edificada para família numerosa com quartos especiais para hóspedes e para outro modo de vida. Embora não se tenha a data precisa de sua construção, suas características revelam as de casa do século XIX. Mesmo assim, numa restauração, encontraram-se telhas com a data de 1650. A cobertura de pedra-sabão em muros da frente, também é de época anterior ao século XIX. Como no inventário de Antônio de Souza Maia Costa consta a existência do Sobrado dos Lopes em ruínas nessa propriedade, levanta-se a hipótese de ter sido construído em século anterior e que elementos tenham sido aproveitados em restauração da sede da Fazenda, que já se encontrava bastante deteriorada na época do inventário, em 1921. Atualmente, está bem cuidada, com boa aparência, e mantém sua autenticidade.

O atual proprietário e o pioneirismo da Fazenda do Andrade

Atualmente, as terras da Fazenda do Andrade, a respectiva sede e benfeitorias pertencem a José Geraldo de Resende, Lalado do Antônio Honório, e sua esposa Alice. Muitas das antigas construções, ditas acima pela historiadora Helena Teixeira Martins, não existem mais na propriedade. Suas terras medem hoje 147ha e a atividade principal da Fazenda gira em torno da cria e recria de gado.

Lalado chegou à Fazenda do Andrade em 1966, quando a alugou de Sebastião Rodrigues Vale. Segundo o atual proprietário, nesta época a fazenda se encontrava em péssimo estado de conservação. A capela já não mais existia, móveis antigos foram vendidos, tendo como destino a cidade do Rio de Janeiro. Em 1968, Lalado se casou e veio a comprar a fazenda, em definitivo, em 1973. “Quando eu comprei em definitivo, a casa estava prestes a cair. Cheguei a vendê-la para um grupo de arquitetos de São Paulo, que ia demoli-la e levar o material. Eu achava que não ia conseguir restaurá-la. Mas, mudei de idéia”, diz Lalado que, com muito esforço e financiamento do Banco do Brasil, restaurou a bela sede da Fazenda do Andrade. “Os problemas eram muitos: engradamento e telhado ruins, a sala já estava escorada e uma parede deslocou-se para fora. A casa estava realmente caindo”. Porém, no final do ano de 1984 a reforma se concluiu, deixando a casa da maneira como a vemos hoje.

A preocupação do proprietário é com o futuro: “Será que vão restar somente fotografias? Enquanto eu estiver vivo, mantenho a casa”. A manutenção e conservação de um imóvel como a sede da Fazenda do Andrade é um desafio para qualquer fazendeiro que utiliza as atividades rurais para sobreviver. A fazenda foi erguida numa época de grande prosperidade no campo. A riqueza estava concentrada praticamente nas mãos da elite rural. Era comum casa com piano na sala, ermidas, enfim belas vivendas.

Desafios

Atualmente a realidade é outra. Conservar o que sobrou da época dos barões e coronéis se tornou difícil. Quantas fazendas antigas de nossa cidade já não existem mais?! E tantas outras estão condenadas a somente ficar na memória daqueles que tiveram o privilégio de conhecê-las.

Propriedades que marcaram a história do nosso município foram por terra, devido ao abandono e falta de dinheiro: Fazenda da Laje e dos Campos gerais são exemplos claros.

Da Fazenda dos Campos gerais restou somente o alicerce que está escondido sob o mato. Da memória de nosso ilustre inconfidente não sobrou pedra sobre pedra. Já que a fazenda caiu, restando apenas o alicerce, por que não conservar o que sobrou, incentivando visitas ao local? Quantas gerações de alunos e demais Resende-costenses não sabem da história da propriedade do Capitão José de Resende Costa?! Precisamos assumir o compromisso de resgatar a nossa história.

Um outro desafio é encontrar fazendeiros que possuem consciência do valor histórico de suas propriedades e se dispõem a conservá-las. Muitos derrubam, descaracterizam, vendem para pessoas alheias à preservação. Felizmente a Fazenda do Andrade não corre esse risco. Além de ser um grande administrador e pioneiro do município em técnicas agrícolas, Lalado tem consciência do valor histórico da sua propriedade.

A Fazenda do Andrade, conduzida pelo Lalado Honório, sempre foi palco de difusão de tecnologia e grande incentivadora do desenvolvimento rural do Povoado do Andrade e região. A Fazenda é um dos berços da raça Gir Leiteiro da região, além de ser uma das primeiras a criar búfalos no município. Marca também seu pioneirismo em construção de silos, utilizados para armazenamento de forrageiras picadas, a serem utilizadas na época da seca para alimentação do rebanho. Foi importante difusora na implantação do capim Mombaça, estrela, braquiária e outras gramíneas, tendo sido já grande produtora de aveia e soja perene.

A Fazenda já promoveu dias de campo e outros eventos agropecuários que, em parceria com a EMATER-MG, contribuíram para divulgar e incentivar  a adoção de novas tecnologias.

Atualmente, funciona na propriedade uma fábrica de laticínios e criação de peixes, conduzidos eficientemente pelo Tulinho e sua esposa Adriana. A piscicultura desenvolvida na Fazenda é considerada uma das melhores da região, visto o volume de pescado produzido e comercializado nos pesque-pagues da região. Na Fazenda existe hoje uma recria de gado Gir leiteiro, predominando a bovinocultura mista, com  recria de tourinhos para comercialização.

Um ponto que merece ser destacado também é o fato do Sr. Lalado ter começado desde cedo na lida da roça, visto que foi emancipado pelo seu pai, Sr. Antônio Honório, para operar com a carteira de crédito rural na região, em 1961, ou seja, há 44 anos atrás, aliado ao fato que o mesmo sempre foi um dos principais tomadores de recursos de crédito rural, utilizando-os para adquirir equipamentos e máquinas agrícolas e custear suas lavouras.  Lalado, orgulhosamente, relembra seus momentos de dificuldades e superação, sendo o produtor com maior número de contratos de credito rural assinados no município de Resende Costa.

Em época de grande especulação do turismo rural em nossa cidade, a preservação das fazendas antigas deveria ser prioridade. Não há dúvida de que a beleza natural é um grande atrativo. Porém, as antigas fazendas são referências em qualquer roteiro turístico do país. E pensar que as poucas que ainda existem em nossa cidade correm risco de desabar, como falar de turismo rural organizado?
A fazenda do Andrade, devido a sua localização, estilo e arquitetura é um cartão postal do município. Preservá-la é um compromisso do atual proprietário. Visitá-la é um roteiro certo para quem deseja conhecer o nosso município.