A saga de um homem marca a história de um povoado


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André Eustáquio / Cláudio Luis Resende 0

A região do Tabuado é bela pela sua posição geográfica

O povoado do Tabuado se localiza numa tríplice fronteira envolvendo os municípios de Resende Costa, Entre Rios de Minas e Desterro de Entre Rios, na região Noroeste do nosso município. O seu surgimento, como o da maioria dos povoados rurais, está ligado à divisão de terras de grandes propriedades, bem como ao movimento de famílias que formaram a elite rural da região. Historicamente falando, o Tabuado surgiu de uma grande propriedade, a Fazenda de Cima. A partir dela, a comunidade foi se constituindo até chegar aos dias de hoje.

Das tradicionais famílias que povoaram a região do Tabuado, a história coloca em destaque os “Pacheco”, proprietários da Fazenda Pedra Grande, os “Oliveira” e os “Penas”. Fica difícil precisar uma data que marca o tempo em que os fatos aconteceram (ingratidão da fonte oral), mas ocorreu por aquelas bandas um fenômeno típico de nossos dias, o êxodo rural. Devido à divisão das fazendas, várias famílias migraram para outras regiões, como os Maias, e para outras cidades. Aliado a isso, está o loteamento das grandes propriedades, formando pequenos sítios; hoje, muitos deles são considerados improdutivos. Vários descendentes das famílias supramencionadas estão hoje em Belo Vale, Entre Rios de Minas e Conselheiro Lafaiete.

A origem do nome Tabuado está ligada ao desmatamento da mata dos Pacheco. Conta-se que era uma mata fechada que foi totalmente derrubada para o plantio do café. As árvores que estavam no chão foram sendo serradas, formando pilhas e mais pilhas de tábuas (um tabuado).

População, estrutura fundiária e produção

Originalmente, o povoado se formou a partir de duas grandes fazendas, Fazenda de Cima (Penas) e Fazenda Pedra Grande (Pacheco). Tradicionais no cultivo de café e produção de leite foram desmembradas, sendo que hoje um grande empresário de Belo Horizonte, conhecido por Zé Maria, é proprietário de 2000 hectares de terra na região, compreendendo toda a antiga Fazenda de Cima e outras pequenas propriedades circunvizinhas.

Dentro do povoado estão aproximadamente 130 habitantes, em 52 residências.
 

A terra

Os tipos de solos predominantes são os de média fertilidade, do tipo camgissolos e algumas glebas com solos mais férteis, do tipo litossolos e latossolos. A vegetação que predomina são os campos rupestres, com relevos ondulados e montanhosos, numa altitude média superior a 1000 metros, presenteando o lugar com um mirante espetacular, ideal para vislumbrar, durante noites enluaradas, as cidades de Ouro Branco, Carandaí, Entre Rios de Minas, Desterro de Entre Rios, São Tiago, entre outras.

Exceto a Fazenda Matias e Codaíba, propriedade do Sr. José Maria, o restante da comunidade caracteriza-se pela agricultura familiar (milho, feijão e mandioca), sendo que a mão-de-obra disponível no povoado é absorvida, de forma considerável, na fazenda do Sr. José Maria.

Além da agricultura e do trabalho diário na terra, o povo do Tabuado se dedica ao artesanato. Diferentemente de alguns povoados de Resende Costa, onde ainda existem pessoas que produzem peças artesanais, no Tabuado, as mulheres e os homens têm como ofício o corte do retalho. Na comunidade, o artesanato se resume na atividade de “picadeiras de retalhos”, matéria-prima para a confecção de algumas peças produzidas no tear em Resende Costa. Esta atividade propicia inclusão social, além de contribuir com a permanência dos moradores no lugar, incrementando também a renda de muitos aposentados.
 

Organização da comunidade

O Seu Zé do Tabuado

A história recente do Tabuado se confunde com uma saga que começa em 1987, ano em que o Sr. José Ribeiro de Sousa Filho se aposentou em São Paulo e resolveu voltar para a terra onde nasceu.

Neto de índios, Seu Zé se sente orgulhoso em contar como sua família chegou naquelas terras. Seu pai era um dos moradores mais antigos do povoado; faleceu com 98 anos de idade. Ao lembrar do pai, Seu Zé diz que ele foi um grande contador de causos. “Meu pai conhecia muitas histórias daqui e de outros lugares do município; Jacarandira, Ribeirão, Cajuru... Vocês perderam a oportunidade de saber causos antigos e engraçados”, diz.

Quando o Sr. José se aposentou em São Paulo, depois de 40 anos de trabalho, teve a certeza de que não queria mais viver naquele lugar. Tratou logo de arrumar as malas e partir para a terra de onde saiu para fazer a vida. “Chegando aqui tive uma decepção. Pois tinha planos de fazer alguma coisa; inicialmente, era algo para mim, mas, a realidade era outra. Aí pensei: o que vou fazer aqui? Voltar para São Paulo, eu não vou; então comecei a conhecer o pessoal, construí minha casa e comecei a trabalhar”. E foi um trabalho digno de louvor. Seu Zé poderia muito bem ter, depois de uma vida inteira de trabalho, gozado a sua aposentadoria tranqüilamente, sem se preocupar com nada. Mas fez diferente. Percebendo a situação de apatia que se abatera sobre o povo, dispô-se a reuni-los em sua própria casa. Com carisma, vontade e idealismo, tornou-se um grande incentivador, empreendedor e o maior responsável pelo desenvolvimento da comunidade do Tabuado.


O Conselho Comunitário

Das inúmeras conquistas do Seu Zé para o povoado, a maior delas é, sem dúvida alguma, a criação do Conselho Comunitário do Tabuado, em 1993. “Eu já trabalhava antes na questão da melhoria pública: lutamos pela estrada, linha de ônibus, escola, atendimento médico (as primeiras consultas médicas aconteceram na residência do Seu Zé), entre outras coisas”. Com a criação do conselho, tudo se viabilizou: hoje, o povoado é dotado de um centro comunitário; um prédio onde funciona a Escola Municipal do Tabuado, atendendo de 1ª a 4ª série; campo de futebol; posto de saúde, uma fábrica de farinha de mandioca; um trator agrícola com implementos e uma igreja (obra do Sr. Zé Maria, proprietário da fazenda Codaíba). A população conta também com atendimento médico semanal e linha de ônibus, com destino a Resende Costa, toda quarta-feira.

A criação do Conselho não se deu facilmente. Seu Zé encontrou grandes desafios, e, o principal deles foi conseguir agrupar as pessoas. “O desafio era agrupar o pessoal e fazer alguma coisa a partir deles mesmos. Comecei a ir à casa de cada um. Inicialmente, consegui agrupar seis famílias. Dessas seis, comecei a fazer alguma coisa. Foi difícil, mas eu consegui colocar na cabeça do pessoal que era importante para eles a associação. O trabalho foi longo, mas, em 1993 fundamos o Conselho Comunitário do Tabuado”.
 

Um exemplo para muitas gerações

Ouvir o Sr. José Ribeiro de Sousa filho contar a sua saga, renasce em nós o idealismo, que anda tão esquecido. Atualmente, as pessoas não se comprometem com causa nenhuma, vivem pragmaticamente, não se responsabilizam com as coisas que acontecem em seu redor. Queremos achar as coisas prontas; o nosso objetivo é apenas usufruir. É a filosofia do ter pelo ter. Sem falar no individualismo, na ganância pelo acúmulo. O espírito comunitário há muito se afastou. O homem pós-moderno não se preocupa com o bem-estar do outro. Enfim, está se tornando, cada vez mais ríspido, mesquinho e escravo da sua própria individualidade.

O Seu Zé do Tabuado é um paradigma da vontade coletiva, do despojamento e do idealismo. Ao dedicar o tempo mais precioso da sua vida em prol do desenvolvimento de um pequeno povoado, ele mostrou tudo aquilo que falta a muitos jovens: coragem, crença num ideal, compromisso com uma causa e vontade.
 

Cultura e turismo

A comunidade do Tabuado entrou no circuito Resende-costense de turismo rural, além da belíssima paisagem, pela cachoeira, que corre nos fundos da residência do Seu Zé. De acordo com os moradores, a presença de pessoas de Resende Costa é, ainda, fraca. Turistas de Entre Rios de Minas e Conselheiro Lafaiete predominam.

Essencialmente religiosa, a comunidade tem como padroeiro São José (é bom lembrar que não tem nada a ver com o Sr. José Ribeiro). A escolha foi em homenagem ao riacho São José, que corta o povoado. A construção da igreja se deu recentemente. Antes, o povo se reunia no cruzeiro. Mas, há mais tempo ainda, “onde houvesse um metro de grama, o pessoal se reunia para rezar”, disse um morador.

As tradicionais festas juninas animavam a comunidade nas noites frias do mês de junho e julho. Leilões festivos também eram realizados com o objetivo de angariar renda para o povoado. Contudo, a mais famosa era a Festa da Primavera. Realizada no dia 20 de setembro, a festa mexia com os ânimos do povo: shows, sonorização e banda de música floriam o fim de semana. Com o passar do tempo, a festa perdeu seu vigor e acabou. Segundo o Seu Zé a festa da primavera chegou ao fim devido à falta de segurança e apoio financeiro por parte do poder público.