Ribeirão de Santo Antônio: História, natureza e mineirice


Conheça o Município

André Eustáquio / Maristela de Oliveira Peluzi0

Capela do Ribeirão

Minas Gerais é um estado arraigado de belezas e peculiaridades conhecidas mundialmente: religiosidade acentuada, paisagens montanhosas a perder de vista, biscoitos caseiros, trilhas verdes para cavalgadas, cachoeiras, entre tantas outras atrações. Sentimos essa “mineiridade” em Resende Costa, uma bela e interessante cidade mineira, que se destaca pelos seus encantos interioranos e pela receptividade calorosa de seu povo.

Resende Costa tem como identidade a simbiose urbano/rural. A história da cidade está intrinsecamente ligada ao desenvolvimento do campo, pecuária e artesanato, que surgiu no meio rural. Nesta reportagem, que tem como objetivo apresentar uma comunidade rural, dentro do projeto “Conheça o nosso Município”, mostraremos um pouco do que há de melhor nos nossos povoados: história, atrações turísticas, curiosidades... Conheça um pouco do Ribeirão de Santo Antônio.

A história do povoado Ribeirão de Santo Antônio está ligada diretamente à formação das grandes fazendas, na segunda metade do século XVIII, com destaque para a fazenda Ribeirão (antigamente chamada de fazenda Ribeirão da Serra), fazenda do Catimbau e fazenda das Éguas.

Falemos um pouco dessas fazendas para entendermos como tudo iniciou.

A fazenda Ribeirão, hoje propriedade do Senhor Plestes, teve na primeira metade do século XIX um número de 72 escravos, um patamar considerado elevado para a comarca do Rio das Mortes. A fazenda possuía muitas benfeitorias e um grande número de gado Vacum, eqüinos e suínos. Tal propriedade conferiu indubitável importância à história da província mineira, a levar-se em conta que grande parte das propriedades rurais das Minas Gerais possuía menos de 10 escravos. Um aspecto importante a se destacar é o fato de a propriedade ter pertencido ao Major Joaquim Pinto de Góes e Lara, personagem de suma importância para o desenvolvimento da região, uma vez que gozava de muito prestígio político na época.

A Fazenda das Éguas situa-se a cerca de 23 quilômetros de Resende Costa. A origem desta fazenda está ligada à distribuição de sesmarias na região, conforme marco de pedra que lá se encontra e hoje ficando como adorno à frente da sede. A fazenda das Éguas chamou-se primeiro Vista Alegre. O nome atual vincula-se à intensa criação de eqüinos em tempos posteriores à sua fundação, que passou a constituir sua principal fonte de renda. Do gado provinha a outra fonte de rendimento, pois mais da metade das terras eram formadas por áreas de campo. Com a finalidade de subsistência cultivavam-se cereais, como o milho e arroz, além de feijão, bem como cana, para a produção de açúcar, rapadura e aguardente, cujas sobras eram comercializadas na circunvizinhança.

Dizem que a Fazenda das Éguas foi construída por Bento Gonçalves. As terras onde ela foi implantada correspondiam a mais de mil alqueires, passando depois para seus filhos Antônio e Manoel de Resende Maia. Manoel Gonçalves Maia é apontado também como tendo sido um de seus ex-proprietários. Mais tarde, a fazenda pertenceu a Manoel Gonçalves Maia (Lilico), casado com Maria Cristina. Depois pertenceu a seu filho Arlindo Resende Maia. Hoje a área dessa propriedade está muito reduzida e pertence ao filho do Sr. Arlindo, Romeu Maia, que ainda reside nela com a sua família.

Os sistemas construtivos adotados, inclusive nos muros que a circundam, evidenciam trabalho pesado, demorado e árduo de escravos. De aparência despretensiosa, sobre porão bastante alto, vem a casa com a estrutura das paredes externas em alvenaria de pedra, compacta, com espessura de 75cm. Essa construção obedeceu às normas de Portugal, conforme se determinava no regimento dado a Tomé de Souza, em 1548, que estabelecia fossem as edificações erguidas como uma fortaleza de pedra e cal, pedra e barro, ou em taipa.

Com objetivos práticos, várias partes da casa tiveram de ser modificadas. Porém, como reminiscência, resta um amplo conjunto arquitetônico característico das fazendas setecentistas. Ainda que grande parte esteja em ruínas, destacam-se: senzala, cômodo no porão da sede que era utilizado para castigar escravos rebeldes, muros de pedra e paiol. A fazenda guarda uma história de talvez mais de dois séculos e meio.

Importante marco para a constituição do povoado Ribeirão de Santo Antônio, a fazenda do Catimbau, propriedade do Senhor Adenor Roberto de Resende, foi erguida por volta de 1800 por Felisberto de Góes e Lara à beira do histórico caminho, chamado pelo senhor José Campos de Resende de A Encruzilhada das Minas Gerais e do Brasil. Fora antiga morada de índios. Daí surgiu Catimbau, que significa “ponto de encontro de pajés”. Foi construído um grande engenho de cana-de-açúcar, onde muitos escravos lidavam com força. Era uma época de glória para os fazendeiros.

O velho casarão construído em 1800 foi demolido, por força do destino, por volta de 1910 (aproximadamente), quando Domiciano Pinto de Resende (Sanico do Catimbau) edificou sua segunda sede ao lado da antiga morada.

Com a demolição da antiga sede da fazenda Catimbau, o altar e a padroeira, Nossa Senhora da Soledade, pertencentes à ermida (capela) localizada na fazenda foram doados para a construção, em 1918, da atual capela do Povoado Ribeirão de Santo Antônio. Pode-se dizer que o povoado “nasceu” a partir da construção dessa capela. Onde outrora apenas tropeiros que se dirigiam a Resende Costa sentavam-se para descansar ao pé de um cruzeiro, hoje está localizada a capela de Nossa Senhora da Soledade, cuja festa acontece no dia 15 de setembro.

O atual Ribeirão de Santo Antônio

As famílias que moraram nas históricas fazendas se proliferaram, povoando as adjacências, para culminar no amontoado de outras tantas propriedades que vemos hoje em dia, como a fazenda do Juá, do senhor José Cupertino de Resende – homem de grande sabedoria, que é admirado por todos, pelo espírito empreendedor e pela disposição para o trabalho. A crença religiosa está presente na vida do sr. José Cupertino, que mandou construir dois cruzeiros nos pontos mais altos da região. Um deles fica de frente para a sua propriedade. De acordo com ele, a construção deste cruzeiro foi uma forma de passar a religiosidade que lhe é vital para os seus descendentes. Os dois cruzeiros são marco na região. No cruzeiro localizado na serra do Catimbau existem as estações da via-sacra que, uma vez no ano, recebe os fiéis para o exercício quaresmal da penitência. Seu Cupertino é pai do senhor João Bosco de Resende, proprietário da fazenda Moreira, que vem se destacando na região pela produção da saborosa cachaça Sanica. Além da Cachaça, João fabrica, desde 1988, melado, açúcar e rapadura. A fazenda oferece aos visitantes um pesque-pague, num ambiente tranqüilo, propício ao descanso e ideal para levar a família. Pela fazenda do João chega-se a uma bela cachoeira de onde se vislumbra um lindo horizonte. Porém, para se chegar até ela tem de caminhar por uma trilha que passa dentro de uma densa mata.

A fazenda Moreira é uma mostra da prosperidade que vive a região do Ribeirão. O povoado tem como principais fontes de renda o milho, feijão (utilizados para fins comerciais e subsistência), leite e carvão. A comunidade se orgulha de ser a primeira a criar o Conselho Comunitário, que possibilitou a aquisição de um telefone público, trator e equipamentos agrícolas, tais como: limpadeira de arroz, batedeira de cereais e engenho. Outro motivo de orgulho do povoado é a Escola Municipal Paula Assis, que vem se consolidando ao longo dos anos como centro de ensino de referência no município.

O artesanato também marcou a história do povoado. A colcha de retalhos, produto característico do artesanato de Resende Costa, era tecida por muitas pessoas no Ribeirão. Ela era produzida no tear comum e, depois, veio a ser tecida no tear duplo. Junto com a colcha, produziam-se tapetes e passadeiras.

Atualmente são poucas as pessoas que tecem no povoado. Ainda há tecelão de colchas, porém o que predomina nos teares atuais são os tapetes e passadeiras. A maioria está trabalhando no corte de retalhos, que são vendidos para tecelões de Resende Costa e do povoado. Como acontece em Resende Costa, a tradição do tear foi passada de pai para filho. Atualmente os mais jovens é que estão se dedicando ao artesanato.            
                                                    
 O povoado é conhecido e freqüentado por pessoas de Resende Costa e região. Atraídos pela festa da colheita, que ocorre no quarto domingo de maio, os visitantes que chegam ao Ribeirão já sabem que podem contar com o bar do Teteu e o bar do Neco, além de poderem se banhar nas deliciosas águas da cachoeira localizada no Ribeirão do Meio.

A festa do Rosário também movimenta o lugar (acontece no dia 31 de outubro). Os grupos de congada do povoado animam a celebração, perpetuando uma tradição dos negros, adaptada ao rito católico. No Ribeirão há o exemplo da boa convivência entre fiéis de igrejas distintas. A Congregação Cristã no Brasil está presente no povoado desde 1970. A hospitalidade e a amizade conferem ao povo do Ribeirão uma qualidade especial.

Rico pelo seu passado, o Ribeirão de Santo Antônio conserva ainda detalhes da vida mineira no interior: religiosidade, bate-papo e causos antigos.  Há um morador de um lugar próximo ao povoado, Jabuticaba, que nos encantou em nossa visita ao local. Trata-se do senhor José Assis Resende, conhecido por todos como Zé da Melina. Dotado de uma memória prodigiosa, o Seu Zé é capaz de contar a história do povoado, detalhadamente, ilustrando-a com versos decorados e causos que foram passados a ele, como o da visão da imagem de um homem à beira do rio que corta o povoado. Sem saber de quem se tratava, o povo o identificou como Santo Antônio; a partir daí, o rio começou a ser conhecido por este nome, como também o povoado.
Foi seguindo as lembranças do seu Zé da Melina, do senhor Cupertino, do sr. César e da dona Zulmira, viúva de Francisco Justino, donos da antiga venda construída na década de 50, que pudemos descobrir como tudo começou por aquelas bandas.

Fazenda das Éguas: texto adaptado e extraído do livro As Fazendas Mineiras, por Adriano Aparecido Magalhães.
Fazenda Catimbau: matéria escrita por Adenor Roberto de Resende para a Coluna “Um olhar sobre Resende Costa”, do Jornal das Lajes.