Os rumos do turismo regional na visão de guias de turismo

Uma das opções é o passeio de balão em Resende Costa, "que já atrai a atenção de famílias”.


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José Venâncio de Resende0

fotoQueijaria Fazfor-Fazenda Fortaleza em Prados (fotos enviadas por Dalton).

Passada a pandemia, está de volta o turismo de massa no eixo São João del-Rei/Tiradentes/cidades circunvizinhas, no Campo das Vertentes. “No começo da pandemia, o pessoal criou uma coisa mais intimista… A gente percebeu um aumento muito grande de roteiros de Estrada Real, algo assim mais isolado. Agora já descambou para um turismo de massa mesmo, voltou ao que era antes da pandemia; e já veio essa ideia de ser instagramável, de fazer foto bonita etc.”, resume o guia de turismo da Uai Trip, Dalton Vale Cipriani, 41 anos.

Mas cresce a procura por um turismo “mais aconchegante, mais personalizado”, ao estilo de passeios walking tour, city tour a pé, caminhada, bicicleta e quadriciclos. E os passeios gastronômicos (rotas de queijo, cachaça e café) viriam a seguir no interesse do público, revela Dalton. As pessoas “querem uma coisa mais particular, mais restrita, mais aconchegante, familiar e personalizada”. Na verdade, uma tendência que já vem dos últimos 20 anos.

No turismo há mais de 20 anos, ele considera a Uai Trip “uma grande família” da qual fazem parte guias de turismo como Luiz Antônio Sacramento Miranda, Giovanni Antonio de Souza Frigo e Ricardo Couto, “pessoas mais maduras”. “E o nosso foco sempre foi no sentido de manter essa ideia de uma família.” Uma família com uma proposta “de um turismo de maior qualidade e menor quantidade de pessoas”, com “aquela pegada de um turismo mais humanizado”. Mais de 90% dos passeios da Uai Trip são feitos na região de São João del-Rei-Tiradentes, envolvendo municípios como Prados, Coronel Xavier Chaves, Ritápolis e Resende Costa.

Três pilares

Dalton trabalha com a noção de três pilares: social, econômico e ambiental. Mas, primeiro, é preciso “só fazer aquilo em que se acredita”, o que “não é por marketing, mas realmente porque a gente gosta daquilo que propõe”. Aí, sim, é preciso levar em conta “se as pessoas também querem” – é o caso, por exemplo, dos anfitriões nos roteiros de queijo e cachaça, que são diretamente envolvidos. “Não podemos ser invasivos demais. A gente tem que evitar o incômodo, de criar algo que vai causar algum constrangimento ou uma quebra muito grande de rotina de quem vive na roça.” Mas, de nada adianta o passeio ser social e economicamente viável, se ele vai degradar a natureza. Assim, “a elaboração do roteiro tem que levar em conta esses pilares”.

Outro aspecto importante é como ampliar o raio do entorno da visita do turista, ensina Dalton. “O que falta mesmo são atrativos turísticos, propostas que realmente sejam diferenciadas.” Ele cita alguns exemplos ilustrativos. Quem está em Tiradentes,  vai ao Bichinho (Prados) “por osmose”; talvez na segunda visita já se aventura a ir a Prados (cidade), a Coronel Xavier Chaves, a Resende Costa; talvez numa terceira visita já queira conhecer Ritápolis. Aliás, a Fazenda do Pombal é um exemplo: “é sensacional para quem ama história, mas para quem gosta de turismo ela é muito deficiente; ela não tem um atrativo. Imagine se na Fazenda do Pombal tivesse uma venda de souvenirs, uma tirolesa, um paisagismo, uma obra de arte ou algo assim!”. “Então, só os mais entusiasmados e mais bem guiados seguem viagem no sentido dessas cidades mais circunvizinhas.”

Mas a mesma Ritápolis oferece uma atração ímpar que é o Saliya Restaurante, assinala Dalton. Trata-se de um turismo específico que coloca Ritápolis no mapa do turismo de interesse das pessoas, porque é um restaurante sensacional, que tem uma pegada muito interessante, cai no gosto do turista”. O Saliya “não é um restaurante comum, realmente é um atrativo turístico. Faltam mais projetos deste tipo, “que extrapolam aquela coisa muito comum de turismo, que realmente trazem alguma coisa diferencial que você não vai ver em outros lugares”.

Fogão de lenha, queijaria, cachaça…

Mas há outros exemplos. A tendência pode ser mesmo o arroz com feijão”, não apenas literalmente, “desde que seja feito com padrão de qualidade e que realmente ofereça uma experiência, que ofereça uma percepção sensorial, que a pessoa sinta e que faça o coração dela bater mais forte”. É o caso da Angela do Bichinho, “algo muito simples como comer num fogão de lenha de verdade. O restaurante da Angela é simples, ela faz arroz, feijão, abóbora, abobrinha, porco etc. só que ela faz no fogão de lenha. Ela não põe o banho maria ali e joga comida por cima, como a gente vê nos outros 99,9% restaurantes”. Ou o caso do passeio de balão em Resende Costa, “uma coisa que o pessoal vai fazer uma vez só na vida”, ou andar num trem a vapor, que “é algo também muito diferente”.

Os exemplos não param aqui. Coronel Xavier Chaves tem atrativos como muitas queijarias, o engenho… “O pessoal do engenho já trabalha com turismo lá há 30 anos; além da turma que quer ver alambique, tem a turma que pedala. Hoje, eu te diria que a cidade com desenvolvimento bem adiantado é Coronel Xavier Chaves; depois de Prados por causa do Bichinho e São João del-Rei que já é uma cidade-polo, eu vejo Coronel Xavier Chaves já como um passinho à frente. E “tem também o lance da distância, Coronel Xavier Chaves, por estar mais perto (de São João del-Rei e Tiradentes),  já absolve mais do turismo que está ali”.

Diferente de Resende Costa. Resende Costa, cujo turismo tem outra característica, “depende muito do turismo de excursão, de lojista, de ônibus etc. E olhe que Resende Costa é lindo, tem coisas, tem cachoeiras etc.” E agora tem também o passeio de balão que “é uma coisa legal, que já atrai a atenção de famílias” - “esse tipo de iniciativa é que vai fazer com que o turismo se distribua aqui na região. Eu não tenho dúvida, eu apostaria todas as minhas fichas nisso aí”.

Ainda nos diferentes estágios de desenvolvimento do turismo na região, Dalton cita o caso de Lagoa  Dourada, “pra mim o lugar mais bonito que tem na Estrada Real - e olhe que tem Parati, tem Cunha, mas a região de Lagoa Dourada é sensacional”. O problema é que Lagoa Dourada não tem lugar de hospedar não cidade, apesar de ter fazendas “muito legais”. Um pouco diferente de São Tiago, onde há “pousada legal”

A região em geral precisa oferecer coisas mais atrativas resume Dalton. “Cada cidade tem o seu prazo; é como o queijo, cada uma está num ponto de maturação, mas a região é sensacional”.  A tendência hoje é o visitante “buscar algo que faça o coração bater mais forte ou, para aqueles que são mais da moda, algo que seja instagramável, alguma experiência sensorial, algo que vai te dar uma foto muito bonita, algo que às vezes não consegue fazer na casa dele e que vai fazer as outras pessoas ficarem com uma pontinha de inveja.” Aqui, ele acrescenta um outro tripé que uma viagem deve ter: satisfação, orçamento e o inusitado, “aquilo que realmente vai ficar na memória deles”.

Nesse ponto, Dalton enfatiza o papel do empreendedorismo, de as pessoas criarem e acreditarem no que elas vêem como um modelo de negócio e apostar nele. “Às vezes dá certo, às vezes não dá. Os grandes negócios vem de boa ideias. Depende muito mesmo das pessoas locais acreditarem e esperar o tempo de maturação.” 

UM OUTRO ENFOQUE

Outra linha de trabalho é desenvolvida desde 2002 pelo guia de turismo Aurélio Santana Detomi. Para além do foco cultural, de igrejas e monumentos, ele atua no turismo de compras e de gastronomia, atendendo demandas de visitas para cidades vizinhas.

Nessa parte, entram as visitas às cachaçarias, doçarias e artesanatos, além de visitas ao Museu do Automóvel (98 veículos antigos em funcionamento) e à Casa Torta (“resgate da infância” por meio de brincadeiras lúdicas), no Bichinho. Outros atrativos, também em Prados, são a Vila Caraça (espaço onde os artesãos construíram seus ateliês para esculpir animais de pequeno e grande porte em madeira, além de peças decorativas) e o artesanato da cidade (peças em madeira e ferro para decoração), bem como loja de antiquário.

Outra cidade no roteiro de Aurélio é Resende Costa, onde costuma levar os turistas em vans, ônibus ou mesmo carro de passeio. “Eles ficam encantados com o artesanato e acham os preços muito em conta.” O guia considera que a construção do CAT (Centro de Apoio ao Turismo) melhorou muito a estrutura e da qualidade no suporte aos turistas. Outra atração é o giro ao Mirante das Lajes para conhecer um pouco da história da cidade e tirar fotos.

Em Coronel Xavier Chaves, os pontos de atração são a igreja Nossa Senhora do Rosário (igrejinha de pedra de 1717) e o alambique Século XVIII (da famosa cachaça Boa Vista), “o único da época em funcionamento no Brasil, segundo a Embratur”. O alambique, onde se pode fazer degustação gratuita, pertence à família de Tiradentes (oitava geração), segundo Aurélio. Outro atrativo de Coronel Xavier Chaves é a visita ao premiado “Catauá” (feito de leite cru), com degustação gratuita do queijo e de vários tipos de geleias.

Nestes passeios, o visitante passa por trechos da Estrada Real, conta Aurélio. Também “já levei turistas à cachoeira do Jaburu, em Ritápolis, que é de propriedade particular, estruturada e que conta com restaurante, área de churrasqueira, banheiro etc.. Tudo isso respeitando a natureza e preservando o meio ambiente”. 
  
     

 

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