Zé Fagundes, de empresário a peregrino e hospitaleiro (ou voluntário)

O brasileiro, de Sorocaba (SP), está nos Caminhos de Santiago de Compostela desde 2004.


Imigrantes & Empreendedores

José Venâncio de Resende1

Zé Fagundes, hospitaleiro no Hostel Old Village de Ponte de Lima.

Desde 2004, o empresário brasileiro José Fagundes Neto, o Zé Fagundes, vive parte do ano nos Caminhos de Santiago de Compostela, inicialmente como peregrino e nos últimos anos como hospitaleiro (voluntário).

Nascido em 1964 em Sorocaba, Zé Fagundes é filho do comerciante (já falecido) João Fagundes Neto – que atuava no ramo de livraria e papelaria - e de Cleide Silva Fagundes. Assim como o pai, tornou-se empresário naquela cidade do interior paulista. É dono da Fagundes Estamparia, que produz camisetas, desde a confecção até estamparia promocional (escolas, academias e eventos em geral).

Em novembro de 2004, Zé Fagundes decidiu sair da rotina e, acompanhado da então esposa Simone, trilhou pela primeira vez os cerca de 800 km do Caminho Francês de Santiago, desde Saint Jean Pied de Port (Sul da França), que duraram 35 dias. “Eu estava cansado daquela rotina de trabalho duro dentro da empresa durante o dia e de sofá à noite para ver televisão. Naquela época, chegamos a produzir seis mil camisetas por dia em época de campanha política.”

No Caminho Francês

“Foi assustador”, assim se refere Zé Fagundes sobre a primeira vez que percorreu o Caminho Francês de Santiago. “Não foi nada planejado e não existiam as informações que tem hoje na internet. A única coisa que eu tinha era um livro escrito pelo cardiologista Antonio Carlos da Cunha Guerra, que era o médico do meu pai e fez o Caminho em 2000.”

Assim, “cada passo era uma surpresa, em termos de hospedagem (locais, horários, donativo etc.)”, revela Zé Fagundes. “Chegamos a dormir no chão de um clube (sala de jogos) de um povoado, num frio danado e sem aquecimento. Jogamos o saco de dormir no chão e tentamos passar a noite. Eu pensava: ´Só louco para fazer esse Caminho´.”

Foi exatamente esta pergunta que Zé Fagundes fez a uma francesa que conheceu e que acompanhou o casal num trecho do Caminho. “Eu perguntei pra ela: ´Como você aguenta fazer esse Caminho pela segunda vez?´ Ela me respondeu que o Caminho era maravilhoso.”

Bolhas no pé

Tanto era maravilhoso que Zé Fagundes e Simone voltaram no ano seguinte. “Decidi fazer o Caminho pela segunda vez porque não aguentava trabalhar que nem um louco e ficar na frente da TV.”

Para Zé Fagundes, a segunda vez foi mais tranquila devido à primeira experiência. O casal partiu em 13 de dezembro de 2005 e chegou a Santiago de Compostela já em 2006.

Nos dois primeiros anos, “tivemos bolhas nos pés, mas eram pequenas e podiam ser curadas durante a caminhada, sem maiores problemas”, recorda Zé Fagundes.

No final de outubro de 2007, em pleno outono, Zé Fagundes estava de novo no Caminho, pela terceira vez, só que sozinho. “Daí para frente, tive muitas descobertas interiores, porque é você com você mesmo, em meio a montanhas – principalmente nos Pirineus – e muita solidão.”

Em meio ao vento e ao frio das caminhadas anteriores, Zé Fagundes vivenciou em 2008 a crise financeira mundial que atingiu em cheio a Espanha. Era visível a “paradeira geral, tanto em obras nos albergues dos Caminhos de Santiago quanto na construção civil em geral. O pessoal que morava no Caminho (comerciantes de verduras, padarias, restaurantes etc.) reclamava que não vendia nada”.

Novas experiências

Em 2013 e 2014, Zé Fagundes morou em Santiago de Compostela na sequência do Caminho Francês. Retornou ao Brasil e, em outubro/novembro, já estava de volta a Santiago. “Então, peguei o trem (comboio) até a cidade do Porto e fiz o Caminho Português.” Foram 11 dias de caminhada entre o Porto e Santiago de Compostela. “Eu lembro que passei o Natal no Caminho.”

Zé Fagundes partiu para nova experiência, desta vez na Irlanda onde pretendia estudar inglês, “mas fiquei pouco mais de dois meses”. Nessa curta estadia, foi hospitaleiro num Albergue da Juventude, em Dublin. “Aí o Acácio me ligou falando da inauguração do albergue La Morena, em Lédigos (pequeno povoado espanhol, que fica exatamente no meio do Caminho Francês)”.

O novo albergue estava precisando de hospitaleiro (voluntário), e lá foi Zé Fagundes. “Em 2016, foi a primeira vez que eu trabalhei como hospitaleiro no Caminho e fiquei lá durante nove meses.”

No mesmo ano, Zé Fagundes retornou a Santiago de Compostela, comprou passagem de navio e embarcou em Barcelona rumo ao Brasil.
Em setembro de 2017 e de 2018, Zé Fagundes voltou a trabalhar como hospitaleiro no albergue La Morena, no trecho espanhol do Caminho Francês. Como sempre, por três meses (o chamado visto de turista).

Aventura nas Américas

Antes de voltar à Europa, Zé Fagundes aventurou-se numa viagem de moto pelas Américas. Foram quatro meses numa XRE 300 entre Sorocaba (SP) e o Alasca (EUA). “Eu queria desbravar esse mundão que é a América. Fui até a última cidade do Alasca, Prudhoe Bay.”

Zé Fagundes saiu do Brasil em abril de 2018 e atravessou 14 países, entre eles Bolívia, Peru, Equador, Colômbia, os da América Central e Estados Unidos.

As maiores dificuldades encontradas por Zé Fagundes no caminho foram a corrupção nas fronteiras, principalmente da Bolívia (“para tudo se quer dinheiro”); a travessia das estradas no interior da Nicarágua (“tive de pedir permissão a guerrilheiros”); a insegurança na América Central (“não dava para dormir em camping, por exemplo”); e a travessia da Colômbia para o Panamá que durou dez dias (“tive de fazer de barcos”).

Na travessia para o Panamá, foram necessários três barcos. “Cheguei a pagar 800 dólares para as três embarcações. Se não pagasse, o cara não me levava.” Já a travessia mais tranquila foi na fronteira de Novo Laredo (México) com o Texas (Estados Unidos). “Entrei pelo Texas, atravessei a Califórnia inteira até São Francisco, subi pela costa até Vancouver e depois o Alasca.”

Já a volta foi por Tijuana, outra fronteira com o México, relata Zé Fagundes. “Não fiz a travessia de barco. Coloquei a moto num avião cargueiro no Panamá e peguei em Bogotá.”

Caminho Português

A partir de junho de 2019, pela primeira vez, Zé Fagundes tornou-se hospitaleiro no Caminho Português de Santiago. Veio a convite do empresário brasileiro Fernando Braga, um dos proprietários do Hostel Old Village (em sociedade com Rafael Paixão e Acacio Augusto Castro da Paz), em Ponte de Lima.

É hora de fazer um balanço do que aconteceu até aqui. O principal ensinamento que Zé Fagundes tirou dessa experiência é sobre a importância da “humildade em relação à vida e às pessoas”, bem como esta foi uma oportunidade valiosa para o “revigoramento da crença”.

Em setembro, Zé Fagundes retorna ao Brasil para regularizar o seu passaporte, já que acabou de ser aprovada a sua cidadania italiana. Agora que a filha Juliana toca a empresa Fagundes Estamparia, fica tudo mais fácil seguir a vida de peregrino e hospitaleiro.

LINK RELACIONADO: 

As cidades do Caminho Francês de Santiago - http://www.oswaldobuzzo.com.br/artigos/as-cidades-do-caminho

 

 

 

 

Comentários

  • Author

    SAUDADES DE VC MANO, ABRAÇOS E TUDO DE BOM NA SUA VIDA.


Deixe um comentário

Faça o login e deixe seu comentário