Abrindo novos caminhos

Agora, às eleições municipais...

16 de Setembro de 2016, por José Venâncio de Resende 0

O mapa das eleições...

De início, uma nota sobre o quadro político da microrregião do Campo das Vertentes. Com base em reportagem sobre os “prefeitáveis” publicada pelo jornal online Trem de Ler, é interessante verificar os partidos que lideram a cabeça de chapa na eleição para prefeitos. O PSDB está na frente com candidatos em 13 municípios, seguido do PMDB (10). Na terceira e quarta posições, aparecem PT (6) e PSD (5). O DEM tem dois candidatos e com apenas um candidato surgem PDT, PP, PTB, PSL, Rede, PHS e PSTU.

Sem levar em conta as coligações partidárias com indicações de candidatos a vice e a vereadores PSB, por exemplo -, pode-se dizer que, com alguma liberalidade, meia dúzia de partidos se destacam na região. Num país que tem cerca de 35 partidos políticos registrados oficialmente e outras tantas ou mais dezenas aguardando registro, este quadro é bastante didático. Talvez esteja aí a pista para uma reforma que leve à redução no número de partidos.

Definido o processo de impeachment pesa sobre o governo, agora oficialmente de transição, a responsabilidade por fazer as reformas minimamente necessárias para tirar o País do buraco e colocá-lo no caminho da estabilidade política e do crescimento sustentável.

Espera-se também que a operação Lava Jato siga seu curso normal tem muita gente trabalhando para que acabe logo e termine em pizza, principalmente para os políticos envolvidos nos malfeitos. A propósito da operação Lava Jato, é muito elucidativa a condecoração concedida pelo Exército ao juiz Sérgio Moro no dia do soldado fala por si mesma.

Agora, é hora de pensar nas próximas eleições municipais que poderão ter um papel importante nas mudanças que estão por vir. Menos pela vontade dos atores políticos direta e indiretamente envolvidos, mais por conta da decisão do STF (Supremo Tribunal Federal) de proibir doações de empresas a campanhas políticas.

Alguns analistas políticos têm afirmado que estas eleições terão uma característica especial. De um lado, as campanhas terão custo menor porque o tempo foi reduzido e porque não há dinheiro (empresas não poderão fazer doações). De outra parte, alguns acreditam que vão surgir novas formas “criativas” de caixa 2, o chamado dinheiro “sujo”.

Com a proibição de empresas financiarem campanhas e os estragos promovidos pela operação Lava Jato nas contas de políticos e partidos, a tendência é de se acirrar a briga por um pedaço do bolo do fundo partidário. Embora estimado atualmente em mais de 800 milhões de reais, é pouco para sustentar a voracidade dos políticos.

É aí que surge a possibilidade, até então impensável, de uma reforma política meia-boca que force a redução no número de partidos. Assim, haveria menos partidos para disputar fatias maiores dos recursos do fundo partidário, cujo aumento em época de crise não pega bem perante a sociedade. 

Plebiscito

18 de Agosto de 2016, por José Venâncio de Resende 0

Edimburgo, Escócia: novo plebiscito à vista?

A convocação do plebiscito de 23 de julho - que aprovou o Brexit (saída dos britânicos) da União Europeia - é uma dessas tempestades cujos estragos requerem tempo para serem reparados. O ex-primeiro ministro David Cameron subestimou a capacidade dos eurocéticos de vender uma ilusão aos britânicos e mostrou-se sem credibilidade para liderar a campanha pelo remain (permanência), depois de criticar tantas vezes a UE.

Tanto que a nova primeira ministra Theresa May, ao tomar posse, assumiu como um dos seus dois principais compromissos buscar a união do Reino, de olho na possível rebeldia de Escócia e Irlanda do Norte. Um dos principais desafios de May será o de demover as lideranças políticas desses dois países de promover referendos para trocar o Reino Unido pela UE.

Nos Estados Unidos, o plebiscito é uma prática comum nos cenários municipal e regional. Nas eleições de 2014, por exemplo, além de escolher seus candidatos, os norte-americanos votaram 146 referendos sobre assuntos como legalização da maconha, salário mínimo, aborto, rótulos em alimentos transgênicos, porte de arma, instalação de cassinos e aumento de impostos. Os estados de Alaska, Illinois, Nebraska, Dakota do Sul e Arkansas, por exemplo, aprovaram nas urnas o aumento do salário mínimo.*

Mas também há referendos sobre temas bizarros. Em eleições anteriores, a maioria dos eleitores do Arkansas votou para retirar da Constituição estadual a frase “nenhuma pessoa idiota ou maluca pode votar”. Em Massachusetts, 56% dos eleitores decidiram proibir as corridas de cachorros, submetidos a maus-tratos para aumentar a vontade de correr. No mesmo estado, um referendo aprovou por 65% dos votos que andar com até 28 gramas de maconha não dá cadeia, apenas multa de US$ 100 pela internet. Na Califórnia, 63% dos eleitores decidiram que fazendeiros são obrigados a deixar porcos, galinhas e carneiros soltos na propriedade. E no Oregon 56% dos eleitores votaram contra a obrigatoriedade de imigrantes latinos aprenderem inglês, permitindo aulas em espanhol nas escolas públicas.**

Recentemente, porém, há forte tendência, principalmente na Europa, de governantes populistas – ou líderes políticos que querem antecipar-se a estes radicais – convocar referendos para decidir sobre temas polêmicos, como o fechamento das fronteiras de seus países para refugiados e imigrantes, que muitas vezes embutem questões como preconceito e ódio racial. Outro plebiscito que pode ganhar terreno em países europeus (Itália, Portugal etc.), depois do Brexit, é a escolha por permanecer – ou não – na UE, o que dependerá do comportamento dos burocratas de Bruxelas, geralmente acusados de insensíveis e intransigentes.

 

No Brasil

O Brasil não tem o hábito de realizar plebiscitos e, quando os promove, os propósitos e resultados são questionáveis. É o caso do plebiscito que o presidente João Goulart, Jango, convocou em 1963 para acabar com a curta experiência de parlamentarismo que o Brasil experimentava, inicialmente liderado pelo são-joanense Tancredo Neves. Tivesse vingado um sistema parlamentarista aperfeiçoado (eleição de primeiro ministro, voto distrital etc.), talvez o País tivesse seguido outro caminho e se livrado do golpe militar de 64 e deste caos político que vivemos hoje.

Da mesma forma, em 1993, os eleitores foram convocados para um referendo sobre a forma e o sistem de governo do País, fruto de emenda à Constituição de 1988. Os brasileiros deveriam escolher em plebiscito entre os regimes republicano e monarquista, bem como entre sistemas presidencialista e parlamentarista. Mais uma vez, a maioria votou a favor do regime republicano e do sistema presidencialista, mantendo a maneira como o País era governo desde a proclamação da República. Hoje, estamos pagando preço alto por esta opção pelo presidencialismo.

Por fim, é oportuno lembrar que é comum no Brasil a convocação de plebiscito para a criação de novos estados – caso mais recente foi o do Pará. Um detalhe importante: o referendo é regional, mas se vence a proposta de divisão do Estado a conta (nova estrutura administrativa, nova assembleia legislativa etc.) é transferida para todos os brasileiros, inclusive os que não votaram no plebiscito.

 

Engajamento?

Os fãs da democracia direta argumentam que ela engaja os cidadãos, mas os recentes referendos refletem uma ampla difusão da alienação política e da raiva da classe governante. Assim, em vez de estimular o engajamento dos cidadãos, muitos referendos têm se caracterizado por baixa participação. Uma das raras exceções é a Suíça que tem um sistema político ajustado para plebiscitos, além de ter cultura na promoção de referendos.***

Sou um adepto do plebiscito – acho que no Brasil deveríamos desenvolver a cultura do referendo popular, preferencialmente em municípios e estados. Mas referendo pode ser um instrumento perigoso, o que requer cautela.

Alguns cuidados precisam ser levados em conta. Um deles é evitar questões nacionais polêmicas, como a pena de morte ou o fechamento de fronteiras para imigrantes. Ou propostas que representem aumento de gastos para o setor público. Imaginem se o recente referendo da Suíça sobre a adoção da renda mínima nacional (proposta derrotada nas urnas) fosse realizado em país onde predomina o populismo e a desinformação?

Segundo, a proposição deve ser muito clara e dentro do controle do poder público da área de abrangência do referendo; ou seja, não se deve fazer plebiscito para outros (governos ou países) cumprirem o que foi decidido. Terceiro, qualquer referendo sobre aumento de despesas deve ter a contrapartida de aumento de imposto para cobrir o custo. Quarto, é preciso evitar que grupos ou interesses pouco claros ludibriem a sociedade ao usar referendos em seu propósito.

No entanto, o maior desafio está em como compatibilizar o plebiscito com o sistema político de representação do regime democrático, que ainda continua válido apesar de imperfeito.

 

CORREÇÃO: O título correto do artigo publicado nesta página, na edição impressa de Julho/2016, é "Um governo de transição", e não “Golpe constitucional ou reforma política?". No quinto parágrafo do mesmo artigo, leia-se "...o governo interino de Michel Temer", e não "...o governo de transição de Michel Temer", como foi publicado.

*http://www.oab.org.br/noticia/27800/eua-realizaram-146-plebiscitos-e-referendos-nas-eleicoes-desta-semana

**http://super.abril.com.br/comportamento/os-eua-e-seus-plebiscitos-malucos

***The Economist (21/05/2016)

Um governo de transição

14 de Julho de 2016, por José Venâncio de Resende 0

Da transitoriedade para a transição (foto: jornalopcao.com.br)

O Brasil terá um governo de transição até as eleições de 2018, qualquer que seja o resultado do impeachment. A menos que aconteça um fato novo como a cassação da chapa Dilma-Temer pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE). 

Em entrevista à TV Brasil, recentemente, Dilma Rousseff defendeu a convocação, ainda este ano, de um plebiscito sobre eleições presidenciais extemporâneas, se o impeachment for barrado. Uma proposta que não convenceu nem o PT nem o ex-presidente Lula.

Dona Dilma entendeu o recado. Em outra entrevista, desta vez para um grupo de jornalistas mulheres na Agência Brasil, afirmou: “Eu farei basicamente um governo de transição porque é um governo que vai ter dois anos; e o que nós temos de garantir neste momento é a qualidade da democracia no Brasil, o que vai ocorrer em 2018”. E descartou o compromisso de chamar um plebiscito: “Não, não está em discussão isso. Não há um consenso”. Mas insistiu na possibilidade de uma reforma política: “Acho que cabe a discussão de uma reforma política no Brasil, sem dúvidas”.

A ser verdade que o ex-presidente Lula considere seu maior equívoco a escolha de dona Dilma como candidata a presidente, segundo teria confidenciado o ex-senador José Sarney, citado em delação premiada do ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado, que interesses movem os defensores da volta de dona Dilma à presidência, para além da recuperação de cargos e privilégios perdidos? Não é cumprir o mandato até 2018; sabem que dificilmente ela teria condições políticas para governar.

E governar nestes tempos bicudos não tem sido fácil pra ninguém, principalmente num país como o Brasil onde a estabilidade política tem o nome de “instabilidade permanente”. O mar não está pra peixe para o governo provisório de Michel Temer, que já perdeu três ministros, vítimas de delações premiadas, e as surpresas podem não parar por aí. Na presidência, o PMDB de vários caciques passou a dividir com o PT do mensalão e do petrolão a exposição às operações da Lava Jato e os holofotes dos vazamentos seletivos. 

E por que deveremos conviver, ainda que a contragosto, com um governo de transição? Primeiro, a operação Lava Jato está deixando os políticos, inclusive candidatáveis, sob suspeição e há o clamor da sociedade de que a apuração dos malfeitos vá até o fim, mesmo que deixe uma situação de terra arrasada no cenário político-partidário. Segundo, só a cassação da chapa Dilma-Temer pelo STF, em decorrência de irregularidades nos gastos de campanha eleitoral, deveria interromper este governo antes de 2018, seja qual for o resultado do impeachment.

É preciso que nós brasileiros pulguemos os nossos pecados, não apenas pela eleição deste governo mas principalmente por não termos clareza – e coragem – de entender que este modelo político é inviável, aliás desde o início da República. Até quando a República  brasileira vai continuar ao sabor de golpes, sejam eles militares, “constitucionais” ou de qualquer outro tipo?

Assim, o mais sensato seria manter a situação atual até 2018, dando tempo à competente equipe econômica de plantão para colocar a casa em ordem. E, em paralelo, convocar uma assembleia nacional constituinte autônoma – formada por especialistas – para propor uma reforma política que possa colocar esta República nos trilhos da estabilidade política de longo prazo.  Não há remendos que possam consertar o que está aí (texto final: 29 de de junho).  

Poupança, juros e crise, na Europa e no nosso cotidiano...

16 de Junho de 2016, por José Venâncio de Resende 0

Chanceler alemã Ângela Merkel: símbolo da austeridade.

Na Holanda e na Alemanha, a palavra dívida significa “culpa”.* A tendência de holandeses e alemães por poupar e sua aversão por crédito ajuda a explicar porque seus cidadãos têm uma montanha de dinheiro na poupança. E continuam levando uma vida frugal.

Não é muito diferente com os seus governos. Os dois países – com elevados superávits em conta corrente – são emprestadores líquidos devido em parte aos hábitos de poupança. Isto explica porque, com as taxas de juros negativas na Eurozona, os maiores poupadores da Europa estão indignados. O vilão do momento é o Banco Central Europeu (BCE), dirigido pelo italiano Mário Draghi.

Mas os verdadeiros “culpados”, na ótica dos alemães, são os países do sul da Europa (Espanha, Portugal, Grécia e Itália), gastadores contumazes que se endividaram e levaram a Eurozona à crise dos últimos anos. Por esta visão, a política de juros negativos e de expansão monetária (aumento da oferta de dinheiro por meio da aquisição de títulos no mercado) do BCE seria injusta por distribuir a poupança dos povos do norte aos endividados do sul, resultando em perdas principalmente aos idosos.

Essa medida é vista como a última tentativa do BCE no sentido de trazer de volta o crescimento e os empregos, a exemplo do que fizeram os Estados Unidos nos últimos anos. A Europa não cresce e os países membros da União Europeia mais ao Sul convivem com a dura crise social, fruto de desemprego elevado, baixos salários e cortes na carne do setor público. Não satisfeita, a Alemanha – locomotiva da Europa – continua cobrando austeridade, enquanto seus cidadãos e o próprio governo mantém os cofres cheios.

No entanto, a Alemanha, segundo seus críticos, nada tem feito para ajudar a zona do euro a sair do impasse de baixo crescimento e inflação próxima de zero. Com a elevada poupança interna (pública e dos cidadãos), o governo alemão nem mesmo investe na infraestrutura (ferrovias, rodovias etc.) do país que se deteriora ao longo dos anos de uso.

Do outro lado do Atlântico, o Brasil vive a contradição do déficit de crescimento econômico e de oferta de empregos com desequilíbrio nas contas públicas (estima-se um rombo de mais de R$ 170,5 bilhões este ano) e excesso de inflação e de juros. Desarmar esta bomba é o desafio do “novo” governo cuja competência da equipe econômica, liderada por Henrique Meirelles, não se discute.

Porém, no horizonte de longo prazo, a tarefa será mais árdua. Os governos, principalmente os últimos, optaram por estimular o consumismo movido a crédito, em outras palavras, a gastar o que não se tem. A máquina pública, inclusive as empresas estatais e os governos estaduais, é um saco sem fundo, restringindo a capacidade de geração de poupança por parte tanto do governo quanto da sociedade. O sistema de aposentadoria, cuja reforma os governos relutam em enfrentar, é insustentável nas condições atuais.

O Brasil parece predestinado a conviver com uma poupança interna insuficiente, dependendo dos recursos de outras partes do mundo para cobrir esta diferença, o que é incerto e tem custo. Assim, continuamos carentes de investimentos em infraestrutura básica (transportes, energia, saneamento etc.) e nas plantas industriais (modernização da capacidade produtiva, maior competição internacional, geração de empregos de melhor qualidade, aumento na receita de impostos etc.).

Mesmo que este governo – que tem vida curta - faça tudo certo, corremos o risco, mais uma vez, de superar a crise mais aguda sem, contudo, criar as condições para o crescimento sustentável. Ou seja, poderemos mais uma vez estar trocando um crescimento de longo prazo pelo chamado “voo de galinha”, que tem sido a marca da economia brasileira ao longo de anos e décadas.

A Alemanha tem estratégia, erra pouco, sabe o que quer. O Brasil simplesmente vive um dia depois do outro, vai, de erro em erro, empurrando com a barriga.

 

 

*The Economist, 30/04/2016  

O voto distrital e o fortalecimento dos municípios

12 de Maio de 2016, por José Venâncio de Resende 0

Defesa do voto distrital durante o lançamento do livro "A política em municípios dos campos das Vertentes"

Por ocasião do lançamento do livro “Política em Municípios das Vertentes” (Coleção Lageana), dia 9 de abril em Resende Costa, fiz uma breve reflexão sobre o sistema político-partidário municipal e nacional, que gostaria de retomar neste espaço. Nos 16 municípios visitados para este trabalho, constatei a existência de um quadro partidário “enxuto”.

No período entre a ditadura Vargas e o golpe militar de 1964, prevalecia no cenário municipal o bipartidarismo (PSD e UDN), com o PTB às vezes compondo o cenário político. O regime militar trocou estes partidos por MDB e ARENA, divididos em sublegendas para acomodar diferentes grupos políticos locais e regionais. Posteriormente, foram substituídos por PMDB e PDS (depois PFL). E assim caminhava a vida política nos municípios, não muito diferente do que ocorria no cenário nacional.

O multipartidarismo que surgiu na transição da ditadura militar para a Nova República pouco alterou a disputa eleitoral nos municípios. Dois ou três partidos mais representativos (PMDB, PSDB e eventualmente PT) dominam a cena, com outras legendas – três, quatro no máximo - atuando complementarmente em um ou outro município, tais como PSD, Democratas, PP, PDT e PSB.

Essa situação dos municípios da nossa região – acredito que da maioria do País - contrasta gritantemente com o cenário nacional, onde figuram mais de 30 partidos – que poderão passar da centena, se todos os pedidos forem aceitos. Uma das aberrações deste sistema é o chamado “governo de coalizão” que resultou na criação de quase 40 ministérios para acomodar os interesses de todo mundo. O desfecho nós já sabemos.

O atual sistema político-partidário tornou o Brasil um país ingovernável. Combinado com o modelo de gestão centralizado, em grande parte favorecido pela Constituição de 1988, e temos um quadro explosivo que nos levou a um presente caótico e um futuro incerto. Qualquer que seja o resultado final do impeachment, o Brasil não sairá tão fácil desta balbúrdia encalacrada.

Sair desta situação significa construir bases sólidas para pavimentar o caminho da estabilidade política e do crescimento econômico sustentável. No campo político, com a adoção de um sistema mais representativo e aderente às aspirações e exigências dos cidadãos.

Nas áreas administrativa e econômica, a atualização da Constituição de 1988, de maneira a tornar o setor público minimamente governável e a abrir espaço para uma agenda de reformas que levem ao aumento da produtividade e redução da desigualdade, como democratização da inovação tecnológica, mais investimentos na qualificação de mão-de-obra (para atender às novas necessidades do mercado) e na geração de empregos de qualidade e melhor remunerados, bem como a eliminação de gargalos que travam a eficiência produtiva e a manutenção da inflação em níveis civilizados.

Cabe às elites deste País – no sentido mais amplo – entenderem que é preciso começar pela racionalização do sistema político, a fim de colocar um paradeiro nesta pulverização de partidos e de milhares de candidatos, o que dificulta a vida dos eleitores.

Em artigo recente, os professores Alexandre Schneider, Carlos Melo e Rubens Glezer* defenderam que “É hora de construir a transição. É hora de pensar no dia seguinte, depois de amanhã, quando continuaremos a existir como um só país, com ou sem Dilma”.

Neste artigo, eles defendem que – primeiro passo – “a Operação Lava Jato vá até o fim: que se varra tudo o que houver de podre, que não seja abrupta e cinicamente interrompida”. E – segundo passo – que se reestruture “a casa que hoje parece ruir. Uma reforma política, sobretudo da Política, é urgente”.

E prosseguem: “Pelos vícios do atual sistema, não há como fazer essa reforma com o Congresso que temos hoje e tende a se favorecer de novas regras que ele mesmo vier a estabelecer”.

Por isso, esses professores defendem que “A constituinte exclusiva para a reforma política, por mais polêmica que seja, faz-se necessária. Para esse fim, seus membros devem ser novos e exclusivos; candidatos avulsos – desvinculados dos atuais partidos -, impedidos de disputar novos mandatos, teriam maiores condições de reorganizar o jogo sem advogar em causa própria”.

Concordo plenamente com os autores do artigo. E vou além. Acredito que está mais do que na hora de implantar o voto distrital, que traria inúmeras vantagens. Trata-se do tipo de votação em que cada Estado seria dividido em vários distritos, e cada distrito elegeria um deputado (de um partido) por maioria simples (50% dos votos mais um) – venceria o candidato mais votado.

O sistema de voto distrital aproximaria o quadro partidário nacional da realidade municipal – principalmente das pequenas e médias cidades -, na medida em que reduziria de imediato o número de partidos políticos, colocando certa ordem na casa. Além disso, reduziria os custos das campanhas eleitorais, que estão na raiz do sistema corrupto e podre desnudado pela Operação Lava Jato, e melhoraria a qualidade dos representantes no Congresso Nacional. Mas, principalmente, tornaria os parlamentares (federais e estaduais) atados aos seus eleitores - como aliás já acontece com prefeitos e vereadores – e devolveria parte do poder central para os municípios.

Quem sabe esta seria uma oportunidade de ouro para reconstruir o Brasil, a partir dos municípios, de baixo para cima! Afinal, chega de Brasília ditar as regras a partir do seu pedestal. A um custo exorbitante, diga-se de passagem, que é transferido aos cidadãos que moram nos municípios.

 

 

*O dia depois de amanhã, jornal O Estado de S. Paulo, 24/03/2016.