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Cidade limpa

17 de Agosto de 2011, por Regina Coelho

“O povo de fora parabeniza o povo de Resende Costa pela limpeza, mas ainda há gente que joga as coisas na rua”. Quem afirma isso é Hélio da Silva Resende, o Hélio do Nhonhô, 51 anos, há oito na função de gari da prefeitura, onde ingressou mediante concurso público há quase 18 anos. Para a falta de educação dos que jogam lixo no chão ele sugere lixeiras (hoje instaladas pela cidade), mas reconhece que as pessoas põem entulho nelas.

Pela manhã em caminhada habitual, sempre vejo com sua vassoura o Hélio cumprindo uma jornada de trabalho que começa bem cedo, às 4 horas. Certo dia, resolvi conversar com ele, precisamente depois de ouvi-lo comentar sobre os problemas de saúde (artrose nos joelhos e complicações nos tendões dos pés) que o afastaram, a contragosto, do serviço no caminhão de coleta de lixo.

Segundo Hélio, o trecho compreendido entre a casa do Lulu (filho do Antônio Magalhães) até o cruzeiro (do bairro Nova Brasília) e as praças da Rodoviária e da Várzea estão sob sua responsabilidade, sem contar o dia reservado aos cuidados com o campo do Expedicionários. Nesse trajeto diário, as luvas e as botinas são equipamento de proteção indispensável, no entanto, atualmente, ele usa tênis por considerar esse tipo de calçado mais leve. “Dá mais proteção”, afirma. Quando lhe pergunto sobre algum eventual acidente de trabalho, ele se lembra de ter batido com a cabeça numa grade de certa casa, pois teve que se esticar todo para pegar o lixo. Isso se deu nos tempos de serviço no caminhão. E já se cortou também com caco de vidro. O gari que elege a segunda-feira como o dia mais difícil de varrição pelo acúmulo natural de lixo revela nunca ter encontrado qualquer coisa valiosa ou curiosa no meio do que recolhe. Acha que o pior na sua atividade é pegar bicho morto, afirmando ser comum achar muito cachorro cheirando mal. “O resto tudo é bom porque a gente faz o serviço com amor”, ressalta ele sem deixar de afirmar que as pessoas, de um modo geral, valorizam seu trabalho e sentem sua falta no caminhão.

Um assunto puxa outro, não é mesmo? Assim, fica impossível não lembrar agora um episódio envolvendo a infeliz participação do jornalista Boris Casoy. Recordando. Num intervalo do Jornal da Band, edição do réveillon de 2009, foi levado ao ar um vídeo de dois garis desejando a todos boas festas. Casoy não havia percebido que o áudio ainda estava aberto e fez os seguintes comentários sobre os dois: “que merda... dois lixeiros desejando felicidades do alto de suas vassouras... dois lixeiros ... o mais baixo da escala do trabalho”. Falou besteira o jornalista. Isso sim é uma vergonha.

Voltando a falar do Hélio e, por extensão, da categoria que ele representa, é preciso dizer que, na verdade, esses trabalhadores nem sempre são respeitados pelo que fazem. Apesar de imprescindíveis para a manutenção da limpeza nas cidades, eles costumam parecer invisíveis aos olhos da sociedade, que muitas vezes consegue enxergá-los somente quando a sujeira se acumula nas ruas.

Papel de bala, bituca de cigarro, palito de fósforo e de picolé, anúncios, sacola plástica, chicletes, folhas secas... A exceção disso tudo fica com as folhas, que caem no chão naturalmente, mas o resto alguém simplesmente joga fora... das lixeiras, o que é lamentável. Entra em ação a turma da faxina para deixar a cidade com aspecto saudável, com o jeito que deve ter a casa da gente. E se somos de fato conhecidos por manter limpas nossas vias públicas, façamos todos por merecer tal distinção.

Para concluir, vai aqui uma curiosidade ou um pouco de cultura inútil, como queiram: o nome gari é uma homenagem ao francês Aleixo Gary, empresário que se destacou na organização do serviço de limpeza no Rio de Janeiro pelos idos de 1876. Vencido o contrato com o francês, os cariocas, acostumados com a limpeza das ruas após a passagem dos cavalos, mandavam chamar a turma do Gary. Aos poucos o nome se generalizou e até hoje esses profissionais são assim chamados.

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