Muita gente deve ter visto veiculada em nossa mídia a bela peça publicitária da Nestlé a propósito dos seus 90 anos no Brasil. Na telinha, as imagens mostradas são mesmo um show de beleza. A escolha de “Emoções”, como trilha sonora, uma das músicas mais marcantes de Roberto Carlos, não poderia ser mais feliz. No embalo da voz do Rei, artista símbolo do país, emoção brasileira é, de fato, o que não falta ao comercial, entremeado de cenas do cotidiano e importantes momentos históricos ligados ao Brasil. Ponto para o reconhecido talento da propaganda brasileira! Ponto para a Nestlé!
Paralelamente às comemorações nacionais, Minas Gerais recebe um conjunto de ações desenvolvido pela empresa suíça com exclusividade para os mineiros. Com o tema “A cozinha está no coração dos mineiros e é na cozinha que a gente se encontra”, a campanha em curso faz uma verdadeira homenagem à cultura de Minas.
Tamanha consideração ao nosso estado se deve, provavelmente, ao fato de Minas Gerais ser um dos principais polos de captação de leite para a Nestlé no Brasil. Sabe-se também que a região está entre as maiores exportadoras de café para a empresa no mundo. E mais, ela opera no solo mineiro com cinco fábricas instaladas em Ibiá, Ituiutaba, Montes Claros (onde é fabricado o tradicionalíssimo Leite Moça), Teófilo Otoni e São Lourenço.
“A conversa ainda não chegou na cozinha” diz a sabedoria popular, mas é lá que eu quero chegar. A história já comprovou a importância desse local da casa no dia a dia das pessoas, dos mineiros, principalmente. Nesse lugar de cores quentes, de temperos, de cheiros e sabores acontecem as prosas e as reuniões de família em torno do fogão e da culinária. Ah, as velhas cozinhas de Minas, com seus fogões de lenha, cascas de laranja secas penduradas para acender o fogo, bule de café sobre a chapa, lenha crepitando no fogo, o cheiro da fumaça, rostos vermelhos. Colheres de pau, xícaras esmaltadas, coador de pano, panelas de pedra (e de ferro) e a garantia de uma refeição pra lá de gostosa. Do lado de fora da casa, sobre o telhado, a imponente chaminé soltando fumaça, sinal de vida, de lida com o fogão de lenha.
Segundo o escritor Rubem Alves (tinha que ser mineiro), “quando a gente revela qual é o lugar mais importante da casa, a gente revela também o lugar preferido da alma”. E continua “nas Minas Gerais onde nasci o lugar mais importante era a cozinha. Não era o mais chique e nem o mais arrumado. Lugar chique e arrumado era a sala de visitas, com bibelôs, retratos ovais nas paredes, espelhos e tapetes no chão. Na sala de visitas as crianças se comportavam bem (...). Na cozinha era diferente: a gente era a gente mesmo, fogo, fome e alegria”.
São belas e verdadeiras as palavras do nosso mineiro de Boa Esperança. Cozinha é intimidade, lugar onde a gente recebe só os mais amigos, a família se confraterniza e a conversa costuma não ter hora para acabar. Dispensável dizer que tudo isso acontece ao redor da mesa de jantar, seja ela farta ou modesta, quase sempre o ponto onde convergem os mais variados assuntos. Quase porque às vezes a prosa acontece em volta do próprio fogão.
Até um tempo atrás, a cozinha era separada das outras partes da casa, onde era comum existir também a despensa, um cômodo anexo que abrigava o sortimento a ser usado nas refeições. Atualmente, a integração da cozinha com a sala de jantar ou mesmo de estar é uma tendência. A gastronomia ganha cada vez mais status entre os apreciadores da boa mesa. E eis que surgem os espaços gourmet, ou melhor, são assim batizadas as cozinhas de hoje. Quanta mudança! Forno para fazer pizza, micro ondas, churrasqueira, fogão de lenha (tem que ser bonito), coifa, cooktop (novidade no setor de fogões), cafeteira, panelas e facas elétricas. E uma infinidade de utensílios feitos de cobre, de inox e até de silicone. Isso tudo e muito mais a serviço dos que praticam a arte culinária por obrigação pessoal ou profissional e (por que não?) por diversão.
Seja lá como for, tradicional ou moderna, simples ou sofisticada, fato é que “a cozinha está no coração dos mineiros e é na cozinha que a gente se encontra”. Aliás, ela é o próprio coração da casa. A propósito, não é sem razão que afirmamos ser um amigo muito próximo de nós da cozinha lá de casa.
Da cozinha lá de casa
14 de Fevereiro de 2011, por Regina Coelho