dos atributos relacionados ao ser humano, a voz situa-se entre os mais marcantes. Isso porque cada pessoa possui uma voz única e especial. É como se fosse uma impressão digital. É claro que existem vozes parecidas, principalmente entre parentes mais próximos. Cabem aqui os imitadores de vozes de famosos ou de amigos. Nesse caso, a imitação costuma vir acompanhada de todo um trabalho de composição envolvendo gestos, expressão facial, vestuário e, é lógico, a voz. Quando se trata de imitar um artista cantando, isso tudo já foi observado, sem contar o texto pronto, ou melhor, a letra da música decorada, o que parece facilitar as coisas. Mais complicado deve ser “criar” a fala de alguém, com seu discurso característico e suas marcas próprias nem sempre tão óbvias, como a ondulação da voz, a velocidade dela ou a preferência inconsciente por certas expressões. Certo mesmo é que essa habilidade é muito interessante, um dom exercido com maestria por muitos, aqui em Resende Costa também, é claro.
Bem próximo de nós, dando vida ao Jornal das Lajes, o André (nosso editor-chefe), pode ser apontado como um bom imitador. Fazendo dobradinha com ele nas sessões das segundas-feiras promovidas pela Turma do Baú (no sítio do Dr. Luiz), o Duda (meu primo) não deixa por menos. Sei que o Bacarini e o João Magalhães (colega do jornal) são dois dos imitados pela dupla. Segundo o Duda, para compor o, digamos assim, personagem, a inspiração vem na hora e é uma homenagem ao imitado, que muitas vezes não gosta nada dessa brincadeira.
Classificada formalmente como infantil, feminina adulta ou masculina adulta, a voz humana ganha dos próprios falantes outras qualificações bem curiosas. Nesse sentido, há, por exemplo, a voz de taquara rachada (desagradável ao ouvido, desafinada), a esganiçada (estridente, um pouco como o ganido de um cão), a de veludo (macia), a cavernosa (profunda, como se saísse de uma caverna), o vozeirão (muito grave e forte) e a voz sexy ou sensual, entre tantos outros tipos.
A propósito dessa última classificação, há quem afirme ser a voz elemento importante na conquista amorosa. Será verdade? Na minissérie Hilda Furacão, adaptada por Glória Perez do romance homônimo de Roberto Drummond (saudoso escritor mineiro) e exibida pela Globo em 1998, essa situação é mostrada exemplarmente. Os envolvidos são Emecê (Sérgio Loroza) e Gabriela M. (Tereza Seiblitz). Ele, um radialista, deixa a mocinha do interior fascinada pela beleza de sua voz. Julgando-se apaixonada, ela passa a lhe telefonar. Tudo caminha para um encontro amoroso. Emecê, rapaz tímido e gordo, contrata Aramel, o Belo (Thiago Lacerda) para representá-lo. O desenlace dessa história? É melhor conferir o trabalho da autora.
Deixando de lado a ficção e relativizando a importância da voz nas questões amorosas ou ainda desconsiderando-a, o mesmo não se pode dizer em relação a uma parcela significativa da população que depende diretamente da voz para trabalhar. É muita gente ganhando a vida no gogó. São repórteres, apresentadores de TV, cantores, atores, dubladores, professores, operadores de telemarketing, locutores...
Sem perder tempo, destaco nominalmente três representantes dessa turma aí acima: Paulo Goulart, José Wilker e Luciano do Valle. Além do indiscutível talento profissional que os marcou, eles se destacaram também por uma qualidade comum incomparável: a beleza vocal com a qual encantaram nossos ouvidos. Por triste coincidência, quase ao mesmo tempo, recentemente esse trio de vozes personalíssimas se calou para sempre. Ficamos, assim, sem o brilhantismo do Paulo Goulart e do Wilker na narração de documentários em muitas propagandas institucionais. E sem a competência do Luciano na locução inconfundível de inúmeras transmissões esportivas da tevê. Que pena!
Assim é a vida, com suas vozes que continuam a ecoar por todas as partes. Na fala ou no canto, todas elas são legítimas, mas não se pode negar que as vozes que cantam se tornam especiais. Se afinadas e bonitas, tanto melhor. Fica valendo, porém, o direito de todo mundo a soltar a voz. No banheiro, nos canteiros de obras, nos shows, nos estádios, nos cultos, nas festas...
Nesse embalo todo, não posso perder a oportunidade de parabenizar a Elzi, que trabalha para a Aleluia (minha vizinha), pelas vezes que eu a ouvi cantar de forma tão linda. Muito bom também foi escutar, num desses dias perdidos no calendário, o Camilo “Bananeira” cantando com toda segurança a Ave Maria de Gounod, ao passar bem cedo em frente à minha casa. Outro momento interessante é proporcionado pela dupla Lourenço e Leonel. Em programa da Rádio Inconfidentes, eles comandam animada cantoria ao vivo alegrando nossas manhãs de sábado com vozes de verdade, sem truques ou estrelismos tão comuns hoje.