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Guerrinha de gerações

19 de Agosto de 2021, por Regina Coelho

basta piscar para uma nova palavra dar as caras, principalmente em algumas redes sociais. Às vezes, nem tão nova assim, mas revestida de um outro significado. E, como aparece, some, porque fica rapidamente batida e cai em desuso. “Lacrou” (mandou bem) e “tombou” (chegou arrasando), só pra ficar nessas duas como exemplos, tiveram um pico de uso em 2016, segundo me informei, e já perderam espaço na linguagem dos jovens, os mais afeitos a essas mudanças linguísticas ditadas por e a cada geração.

Até aí tudo certo. Só que um recente conflito de gerações entre os millennials (também chamados de geração Y), os nascidos entre 1980 e meados dos anos 1990, e a geração Z (quem nasceu entre 1995 e 2015) tem agitado a internet. A cutucada inicial partiu do lado mais jovem, que passou a categorizar certas atitudes dos que nasceram antes como cringe, verbo inglês transformado por eles em substantivo aqui no Brasil para definir hábitos antiquados, cafonas ou vergonhosos. Por um tuíte da publicitária Carol Rocha (1980), a reação veio logo: “Por favor, jovens da geração Z, me contem o que vocês acham um mico nos millennials. Acho que falar mico já passou. É cringe, né?”

À provocação de Carol não faltaram respostas envolvendo até o visual da criatura enquadrada como tal, entre outros pontos, assim vista: toma café da manhã; é viciada em café e cerveja litrão; fala constantemente sobre gatos e sobre pagar boletos; adora a série norte-americana Friends, a novela mexicana A usurpadora e filmes como Harry Potter; acompanha os jornais pela tevê e ouve rock ou pagode dos anos 90; usa sapatilha de bico redondo, calça skinny e cabelo dividido de lado.

Em relação à comunicação pela web, são considerados também comportamentos cringes usar o “rs”, ou “hahaha” na troca de mensagens pelo WhatsApp e outros mensageiros e começar uma frase usando letra maiúscula, utilizar emojis no sentido literal, não ter paciência para acompanhar os vídeos do aplicativo Tik Tok. E mais outros tantos pequenos “delitos” cibernéticos na visão dos nativos digitais.

Lendo e aprendendo. Pertenço à geração Baby Boomers (os nascidos entre 1945 e 1964), portanto uma intrusa nessa atual guerrinha de gerações, ao mesmo tempo, uma interessada no embate em questão. É certo que existe a busca por uma identidade de grupo gerada por pessoas de idades próximas, com tendências típicas de uma época. E ainda. É normal os jovens divergirem da geração anterior, mas é importante considerar que todas elas são indispensáveis, trazendo-os até aqui. E mais. As características de cada geração não são tão estereotipadas assim, podendo transitar entre tempos geracionais diversos.

Sabe-se que, ao longo das décadas, costumes, roupas, calçados (e seus complementos) e até mesmo palavras entram na moda, saem dela e retornam a ela de modo cíclico. O termo “ranço” (sentimento de repúdio, aversão, raiva ou desprezo) voltou com tudo hoje através da expressão “pegar ranço”, que significa ficar entediado(a) ou cansado(a) de alguma coisa, situação ou de alguém. Nesse caso, houve um resgate da palavra, cujo sentido original se manteve. Uma informação: descobri que agora (não sei até quando) não se diz que a pessoa “tá viajando na maionese” (não prestando atenção ao que está acontecendo; fazendo ou dizendo algo sem lógica ou sentido). Ela “tá na Disney”.

Isso posto e, como já cantavam Belchior e também Elis, “o novo sempre vem”, representado, por enquanto, pela geração Z. “São grupos muito mais tolerantes. Desde cedo eles são educados a conviver com o diferente”, diz a psicóloga e consultora da OMS Ilana Pinsky sobre essa turma. No entanto, levando em conta apenas o posicionamento isolado deles relativo aos millenials, permito-me discordar um pouco dela porque defendo a ideia de que gostos, costumes e vocabulário de qualquer geração, em qualquer época, merecem respeito e não são, definitivamente, objeto da vergonha alheia. Em outras “cringes” palavras, “cada um no seu quadrado”.

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