‘Sabemos que será um jogo muito difícil, mas confio muito no nosso grupo e faremos de tudo para sair com a vitória.’
‘Nada está decidido. É assim que temos de pensar, pois temos de estar mais concentrados do que nunca.’
‘Sei do meu potencial e, se o Professor precisar de mim, estou pronto para jogar.’
‘Vamos voltar para o segundo tempo com força total e reverter esse placar.’
‘Nós até que conseguimos marcar bem, mas falhamos em duas jogadas de bola parada.’
‘Eu juntamente com meus companheiros...’.
Essas e outras falas parecidas são construções lingüísticas largamente utilizadas pelos nossos atletas do futebol, respectivos treinadores e dirigentes no exercício de seu trabalho junto à imprensa. Indagados sobre o porquê de dizerem as mesmas coisas, muitos jogadores, os verdadeiros astros do esporte, por isso mesmo os mais visados, costumam se defender, dizendo que as perguntas são as mesmas, daí... Sobrou para os repórteres, mas a fama de falar coisas, digamos assim, óbvias, é do pessoal que faz a festa nos gramados brasileiros. E para nós é isso que interessa. Queremos é ver gols, belas jogadas e títulos, é claro, de preferência para o nosso time. É exigir muito que esses profissionais dominem o vernáculo. Como isso é possível se a grande maioria abandona cedo os bancos da escola para correr atrás de uma bola e do sonho de fazer a vida como jogador de futebol? Deles queremos que se revelem craques da bola e façam a alegria das torcidas, cumprindo bem o papel que lhes é reservado, o de donos do espetáculo.
Dito isso, devo admitir, no entanto, que não resisto a repassar algumas frases famosas pertencentes ao lado folclórico do esporte mais popular do país. Vamos a elas:
‘Somente três coisas param no ar: o beija-flor, o helicóptero e o Dadá.’
‘É Deus no céu, o Papa no Vaticano e o Dadá na grande área.’
‘Não me venham com a problemática que eu tenho a solucionática.’
(Dadá Maravilha, um dos grandes ídolos do Atlético)
‘Clássico é clássico e vice-versa.’ (Jardel, ex-atacante, do Grêmio)
‘Quem nunca agrediu uma mulher?’ (Josimar, ex-lateral do Botafogo)
‘Graças a Deus tive sucesso tanto na minha vida futebolística quanto na minha vida humana.’ (Nunes, ex-centroavante do Flamengo)
O mesmo Josimar, agora em situação mais amena, ao ser perguntado sobre o que achou de um certo jogo, saiu-se com esta:
-Bom, eu não achei nada, mas o meu companheiro ali achou uma correntinha, acho que é de ouro, dá para ele vender.
De uma outra vez, indagado pelo repórter de campo sobre o que faria com o Motorádio que iria receber como o melhor jogador em campo, disparou:
- A moto eu vou vender e o rádio vou dar para minha tia.
Já Claudiomiro, do Internacional, chegando a Belém (PA) para enfrentar o Paissandu, em 1972, teria dito:
- Tenho o maior orgulho de jogar na terra onde Jesus nasceu.
Surpreendente é este comunicado de Mengálvio, ex-meia do Santos, em telegrama mandado à família, quando em excursão à Europa:
- Chegarei de surpresa dia 15, às 2 da tarde, vôo 619, da VARIG.
E tem aquela do Ivair, ex-centroavante da Portuguesa, entrevistado por um daqueles repórteres de beira de gramado:
-Muita gente, muita chuva, muito obrigado!
E o Elivélton, um dos ciganos do futebol, aquele de quem os cruzeirenses se lembram bem, falando sobre a quantidade de faculdades existentes em sua cidade natal:
-Realmente, minha cidade é muito facultativa.
E tem ainda o Vladimir, ex-lateral do Corinthians, em entrevista à Rádio Record:
- Eu disconcordo de você.
Esta é mais recente. O zagueiro Fabão, ao ser contratado pelo Flamengo, não vacilou:
- A partir de agora, meu coração só tem uma cor: é rubro-negro.
Contam também que Pelé, perdido em meio a inúmeros garotos amontoados à sua volta tentando conseguir autógrafos do rei, ouviu esta de um colega:
-Isto aqui até parece um cardume de abelhas.
Fazer confusão com as palavras pode ser mesmo um perigo. Comprovem.
O volante Mingão, do Noroeste de Bauru, candidatou-se a vereador e, em um comício, tascou, empolgado:
-Se eleito, prometo apedrejar todas as ruas da cidade.
Outra do Nunes (lembram-se dele?) deixando o campo, contundido. O repórter pergunta se a contusão é grave. Ele simplesmente responde:
-Não, meu estado não inspira gravidez, não.
E outra do Jardel falando de sua preferência por partidas decisivas:
-Quando o jogo está a mil, minha naftalina sobe.
E tome mais troca de palavras. Um certo Luciano, jogador do juvenil da Portuguesa Santista, reclamando com o juiz sobre um gol anulado por impedimento, garantiu:
-Seu juiz, eu juro que o gol foi legível.
E também um certo Celinho, jogador do interior paulista, não deixou por menos:
-Nosso time é experiente, cheio de jogadores carimbados.
Um primor também foi o que disse Camilo (quem?), ex-zagueiro do Santos, deixando o campo e apertando fortemente a coxa:
-Estou sentindo uma figada na pantuvilha.
Não poderia faltar uma contribuição portuguesa, com certeza, ou melhor, duas, vindas do atleta João Pinto, antigo jogador da seleção de Portugal. A primeira:
-Não foi nada especial, só chutei com o pé que estava mais à mão.
A outra:
-Bem, a equipe estava à beira do abismo. Agora, graças a Deus, deu um passo adiante.
Pois é. Poupei os treinadores, os cartolas, juizes e mesmo os repórteres, por enquanto, só por enquanto. Afinal, ninguém está livre de produzir uma daquelas pérolas memoráveis. E vou ficando por aqui lembrando uma frase genial do artilheiro Dadá: NÃO EXISTE GOL FEIO, FEIO É NÃO FAZER GOL. Concordo com ele em gênero e número igual , ops!, em gênero, número e grau.
Microfones a postos
07 de Dezembro de 2008, por Regina Coelho