“Todo mundo elogia e tal, mas a frase mais horrível que existe é: pra sua idade você está muito bem.” Quem disse isso, ainda outro dia, foi a apresentadora Xuxa. Apresento aqui minha solidariedade à rainha dos baixinhos, ao que parece, hoje sem reinado. Sem querer me comparar a ela, apenas tentando captar o sentido de suas palavras, fica claro que aquilo que a princípio parece um elogio deve ter soado para a quase cinquentona Xuxa como um prêmio de consolação. O trecho “pra sua idade” chega a ser cruel. Então a pessoa não pode simplesmente estar muito bem?
Devo dizer que não se trata de nenhum problema com a idade, a questão está na forma disfarçada que muitos usam para insinuar que alguém é velho. Vejamos estas outras pérolas que principalmente certas mulheres maduras ouvem: “você está muito conservada”. Ou uma variação disso: “você não envelhece, até parece que está conservada em formol”. Existem também os eufemismos para os considerados feios: “fulano(a) é tão simpático(a)!” Ou então: “ele(a) é bonitinho(a)”, para muita gente é a versão light do(a) feio(a) com dó. Os gordos não escapam: “mas ele(a) tem um rosto tão bonito!” ou: “você está fortão (fortona ou sacudida)”.
Saindo do âmbito da aparência, constato ainda que certas construções linguísticas são meras formalidades, ainda que ditas muitas vezes de maneira informal. Quando, por exemplo, uma pessoa se dirige a alguém dizendo “olá, como vai?” ou “tudo bem?”, sabe que isso é só um cumprimento, sem precisar obrigatoriamente de uma resposta condizente com a pergunta. Há também uma frase quase inevitável que muita gente utiliza na tentativa de tornar mais descontraído o ambiente em que a conversa tem início. Quem recebe, muitas vezes, se vê praticamente obrigado a dizer àquele que é recebido esta educada frase: “fique à vontade”. O perigo é a pessoa levar isso bem ao pé da letra. Já imaginaram? Ou então ouvir dela, como já vi acontecer em uma festa, querer saber seriamente do anfitrião o que ele queria dizer com aquilo. Uma deselegância isso e uma quase confusão à vista.
Mas engraçado é o que acontece com um casal que conheço bem. Ao levar alguém até sua casa, seja amigo, parente ou cliente, ele costuma simplesmente pedir, logo de cara: “não repare a bagunça!”, por mais que tudo esteja arrumado. E sempre está. Dá para calcular a posterior bronca da mulher diante de tão descabido pedido dele aos que, normalmente, não veem qualquer vestígio de bagunça naquele lugar. É a famosa força do hábito.
Igualmente habitual é chegar a uma loja de roupas e/ou de calçados, mostrar interesse por algum produto e ouvir de quem nos atende a indefectível frase: “pode experimentar”. É lógico que a pessoa pode e deve experimentar o objeto de seu desejo. Dispensável, pois, a “permissão”. E quando a gente acha que a roupa não vai nos cair bem e quem quer nos convencer do contrário dispara: “não vai levar? É a sua cara!” Ou “essa roupa se parece com você”. Verdade seja dita. Nem todos agem assim. Pessoalmente falando, nem posso me queixar da forma como geralmente me tratam.
Situação constrangedora ocorre mesmo naqueles momentos em que cumprimentos formais de pesar são trocados indevidamente por manifestações de felicitação. Sei de gente que, em velório, dirigindo-se a um familiar do falecido, cumprimentou-o de forma desastrada proferindo solenemente “meus parabéns”. Acontece também de a pessoa se apoderar da fala de alguém que lhe deve um agradecimento. Em vez de ouvi-lo, afoitamente, ela diz um “muito obrigado(a)”, não dando tempo ao outro de assim proceder. Constrangimento também é perguntar por alguém julgando-o vivo e saber em seguida que esse alguém já morreu há muito tempo. E não dá para esquecer aqueles terríveis enganos a que estamos todos sujeitos quando confundimos pessoas e/ou seus acompanhantes. É o caso de encontrar, depois de anos, um conhecido, elogiar a beleza da “filha” que o acompanha e descobrir, na hora, que a moça em questão é a nova companheira dele.
Mas, de tudo que tenho ouvido ou falado ultimamente, ando meio cismada com o “no meu tempo” ou “na minha época”. Falar assim dá a impressão de que a gente já viveu o que tinha para viver. Ora, o nosso tempo é hoje. De novo, o tempo, a idade... da loba, do condor (onde dói?). Não tem jeito. É viver e envelhecer ou morrer jovem. Melhor a primeira opção, até para que se tenha tempo (mais uma vez ele) de aprender, entre tantas coisas, que, se “a palavra é prata, o silêncio é ouro”. Eis aí um sábio ditado popular segundo o qual calar é mais valioso do que falar. Dependendo das circunstâncias, no entanto, é omissão. E falar é tão bom, principalmente quando as palavras são usadas com sinceridade para declarar um amor, matar irreprimíveis saudades, pedir perdão, consolar, encorajar ou alegrar alguém. Quanto aos comentários às vezes infelizes, às frases meramente formais ou habituais e às gafes cometidas principalmente naqueles momentos em que o ideal teria sido ficar de boca fechada, é melhor reconhecer que ninguém escapa de dizer certas bobagens, inconveniências, obviedades ou até mesmo indelicadezas.
Nem tão sábias palavras
14 de Maio de 2012, por Regina Coelho