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No reino da criação

16 de Novembro de 2008, por Regina Coelho

Gérson, meia armador da seleção brasileira de futebol que se sagrou tricampeã na Copa do Mundo de 1970, no México, protagonizou em 1976 uma propaganda que veio a lhe render mais tarde muita dor de cabeça. Nela, o ‘‘Canhotinha de Ouro’‘ aparecia anunciando os cigarros ‘‘Vila Rica’‘ e defendendo a marca do produto, que dizia ser melhor e mais barata que as outras. Como arremate, ele afirmava: ‘‘Gosto de levar vantagem em tudo, certo? Por isso fumo Vila Rica. Leve vantagem você também’‘. Gérson, algum tempo depois, confessou arrependimento de ter associado sua imagem ao anúncio, visto que qualquer comportamento pouco ético foi sendo aliado ao seu nome através do que se convencionou chamar ‘‘Lei de Gérson’‘. Em outras palavras, a fala do então jogador virou sinônimo de tirar proveito próprio de todas as situações, sem preocupações morais. O que parecia uma simples propaganda, apesar de ter como personagem central um jogador profissional assumidamente fumante, coisa impensável nos dias de hoje, marcou a biografia de Gérson, que deve ser lembrado muito mais pela excepcional qualidade do futebol que jogou.

Por outras razões, bem mais felizes, diga-se de passagem, a história mais ou menos recente da propaganda brasileira registra peças que também marcaram época, consagraram marcas e elevaram o conceito dos profissionais do setor, como comprovam as premiações até internacionais a que fizeram jus nossos publicitários.

Numa extensa lista de trabalhos inesquecíveis, há aqueles que conquistam também pela música que divulga o anunciante. Muita gente ainda hoje se lembra daquele belo anúncio de Natal do Banco Nacional (que nem existe mais) em que um coral de vozes infantis entoava: ‘‘Quero ver você não chorar, não olhar pra trás, nem se arrepender do que faz...’‘ E aquele da Varig e também anúncio natalino? ‘‘Estrela brasileira no céu azul, iluminando de Norte a Sul...’‘ E o da Vasp?: ‘‘... A Vasp abre suas asas com a ternura, para você ganhar altura, viajar.’‘ O Bamerindus virou HSBC, mas o jingle antigo do banco permanece na memória: ‘‘O tempo passa, o tempo voa, e a poupança Bamerindus continua numa boa’‘. Não dá para esquecer o Guaraná Antarctica, que, fazendo dobradinha com a pizza ou com a pipoca é sempre recomendado: ‘‘Eu não vejo a hora de te cortar, te ver mais uma vez, te saborear... Adoro pizza com guaraná.’‘ ‘‘Pipoca na panela começa a rebentar. Pipoca com sal, que sede que dá. Pipoca e guaraná, que programa legal’‘. Nesses anúncios que aguçam o paladar, nem preciso dizer que as imagens são irresistíveis. E quem esquece as crianças vestidas de bichinhos mamíferos nos comerciais da Parmalat?: ‘‘O elefante é fã de Parmalat...’‘ Garanto também que ficou guardado o seguinte: ‘‘Quem bate? É o frio. Não adianta bater, que eu não deixo você entrar. Nas Casas Pernambucanas é que vou aquecer o meu lar...’‘

Há uma outra categoria de comerciais cujo mérito maior é criar bordões, frases que o povo passa a adotar. Alguns exemplos: ‘‘O importante é ter Charm.’‘ (marca de cigarro). ‘‘Tomou Doril, a dor sumiu.’‘ (analgésico). ‘‘Sempre cabe mais um quando usa Rexona’‘ (desodorante). ‘‘Não basta ser pai, tem que participar.’‘ (Gelol). ‘‘Compre batom. Seu filho merece Batom.’‘ (chocolate). ‘‘Ei, ei , você se lembra da minha voz? Continua a mesma. Mas os meus cabelos, quanta diferença!’‘ (Xampu Colorama).

Pela criatividade e sensibilidade, fica impossível não citar um comercial da Valisère, de 1987, que consagrou a então desconhecida Patrícia Luchesi, incorporando a garota que vê chegar a adolescência. A frase final ‘‘O primeiro sutiã a gente nunca esquece’‘ simboliza exemplarmente esse rito de passagem. Outra garota, a do refrigerante Sukita, em anúncio bem mais recente, entra no elevador e desconcerta o rapaz já maduro que tenta puxar papo com ela (ocupada com seu refri). O clima possível de paquera ou interesse por parte dele é quebrado com um singelo pedido dela: ‘‘Tio, aperta o 21 pra mim?’‘

E há os garotos-propaganda. Um deles é o insuperável garoto Bombril. Carlinhos Moreno está presente no livro dos recordes como o mais antigo garoto-propaganda de uma mesma marca. Foram 26 anos de exclusividade e o surgimento de uma vasta galeria de personagens ligados aos produtos ofertados. Uma história de verdadeiro sucesso. Longe de ser unanimidade, quem não se lembra do ‘‘Quer pagar quanto?’‘ Ou melhor, quem não se lembra do Fabiano Augusto? Para muitos é aquele chato das Casas Bahia. E não pode faltar o cachorrinho Cofap, não exatamente um garoto, mas um cão comprido e de pernas curtas (um Dachshund ou Teckel, segundo minhas pesquisas) defendendo a marca de amortecedores por cujo nome aquele cãozinho esperto dos anos 89 a 93 ficou conhecido.

Sem maiores aprofundamentos, é oportuno dizer ainda que a força de certas marcas faz com que elas, em algum momento, se transformem metonimicamente em sinônimos do próprio produto. Assim, Gillete (= lâmina de barbear), Brahma (= cerveja) e Bombril (= palha de aço). E quem não associa o termo Brastemp ao que há de melhor? Coisas do mundo da propaganda.


PRESENTE PARA RESENDE COSTA

Entregue oficialmente ao público no último dia 31, o novo espaço da Biblioteca Municipal de Resende Costa é um orgulho para a cidade, que há muito reivindicava um local que pudesse abrigar em condições dignas e à altura de uma de suas mais importantes instituições todo o acervo de que ela dispõe. O que se espera é que o imponente prédio recém-construído seja um marco na vida cultural de Resende Costa, aliando a boa tradição que nossa biblioteca representa ao moderno que naturalmente se impõe. Fazer de suas amplas e confortáveis instalações um atuante, dinâmico e adequado centro do saber é o desafio que agora se apresenta. Afinal de contas, bibliotecas são organismos vivos onde a história se constrói diariamente e se conserva para os que nos sucederão.


FESTIVAL DE CULTURA

Em razão do fechamento dessa coluna exatamente na semana do Festival de Cultura/2008, não foi possível comentar sobre o evento na presente edição. É necessário que iniciativas dessa natureza se mantenham. A cidade agradece.

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