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Sala de aula (Final)

13 de Setembro de 2013, por Regina Coelho

Vista sob a ótica de quem conduzia as aulas, a vida de estudante era um capítulo à parte, com variadas formas de comprometimento em relação às atividades escolares e às responsabilidades delas decorrentes. Nesse sentido, havia quem fizesse “corpo mole” ou estivesse só de “corpo presente” na sala de aula ou tirasse o “corpo fora” dos compromissos estudantis. Em compensação, havia os que se empenhavam nos estudos de “corpo e alma”. Dia de prova quase sempre era sinônimo de tensão: o roer das unhas, santinhos colocados estrategicamente sobre as mesas de trabalho, orações piedosas, promessas em busca de uma boa nota ou de aprovação e, às vezes, o choro incontido por toda aquela situação. Na falta de estudo podia sobrar a malandragem dos que viam a “cola” como um recurso válido para um desempenho melhor. Não faltavam outras artimanhas também para a obtenção dos necessários pontos para a média. Isso da parte de alguns, é verdade, os espertinhos de sempre. Da parte de muitos, é preciso dizer, estudar era realmente a prioridade. Estudantes de nome ou de fato, isso pouco importa, numa determinada época, eu e eles estivemos juntos por uma bela causa: o ensino e a aprendizagem.

Hoje os tempos são outros. Em minhas andanças pela cidade, continuo a ver inúmeros dos agora meus ex-alunos. Há também os distantes fisicamente. Por onde andarão? Há aqueles que se tornaram colegas e/ou amigos. E ainda os falecidos, de muitos anos já passados, quando se foram tão adolescentes, e aqueles ausentes dos anos de agora.

Naqueles tempos de entusiasmo estudantil, fui testemunha em sala de aula e fora dela de grandes sonhos acalentados para quando a vida adulta chegasse. E então formamos boas parcerias de trabalho. Sem qualquer intenção de ser original, recorro a Guimarães Rosa com o propósito de reafirmar que “o mestre é aquele que de repente aprende”. E assim foi. Da convivência e da experiência no cotidiano escolar, recebi e aprendi importantes lições de vida.

P.S. Dedico essa matéria, iniciada na edição anterior, a todos os meus ex-alunos, personagens com os quais construí minha história como profissional da educação.

  

Maratona intelectual

 

“Felicidade!/ Passei no vestibular/ Mas a faculdade/ É particular.” Os versos iniciais de “O pequeno burguês”, composição de Martinho da Vila gravada pelo próprio no longínquo 1969, sintetizam com perfeição duas realidades vividas por muitos numa determinada fase da vida. De fato, é mesmo um acontecimento bastante feliz a aprovação ao vestibular, concurso instituído no Brasil em 1911 pela Reforma Rivadávia Correa. Para uma significativa parcela dos aprovados, no entanto, passada a euforia pela vitória, vem a preocupação decorrente do pagamento das mensalidades (entre outras despesas) cobradas pelas escolas particulares de ensino superior no país.

Quarenta e quatro anos depois do lançamento da música em questão, a situação nela retratada continua atual, ainda que se leve em conta a presente adoção de políticas públicas de apoio aos estudantes menos favorecidos economicamente. Acontece que, para as boas instituições de ensino superior, sejam elas públicas ou privadas, a concorrência hoje é brutal. E pior, é desleal, quando se sabe que não são oferecidas as mesmas condições de estudo para todos. Em outras palavras, em grande parte das escolas públicas brasileiras, falta ainda uma qualificação melhor no ensino de base. E a barreira a ser transposta atende pelo nome de vestibular, ou melhor, pelo Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM).

Momento decisivo na vida de milhões de estudantes brasileiros, o tradicional vestibular já há alguns anos vem perdendo força com a crescente utilização de outros processos seletivos para o ingresso à faculdade. A “bola da vez” é o ENEM, superconcurso com impressionantes 7,17 milhões de inscritos em 2013, a ser realizado em 26 e 27 de outubro. Abrangendo todo o território nacional, o exame é constituído de quatro provas objetivas, cada uma com 45 questões de múltipla escolha e tratando de áreas de conhecimento do Ensino Médio. Com peso de ouro, a temida redação é exigência quase prioritária. Sobre seu sistema de correção, houve três mudanças: a proibição do deboche, a exigência do domínio da norma culta para recebimento da nota máxima e a redução da discrepância (diferença) nas notas de dois corretores para uma mesma redação. A intenção é evitar piadas e gracinhas nos textos (vide receita de “miojo” e letra do hino do Palmeiras no ENEM 2012), redações nota 1000 com erros de ortografia como “enchergar”, “rasoavel” e/ou de concordância verbal, acentuação gráfica e pontuação (em 2012 também). E haverá agora uma observância maior quanto à interpretação subjetiva dos responsáveis pela nota final de cada produção de texto. Havendo necessidade, a opção é pela média aritmética. Grosso modo, é isso.

 

Como se vê, está em curso uma verdadeira maratona intelectual no Brasil. Uma boa preparação a todos e que vençam os melhores.

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