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“Todo o poder emana do povo”

21 de Setembro de 2022, por Regina Coelho

Como ato político, o voto surgiu no Brasil ainda no período da colonização, mas o nosso sistema eleitoral, como o que temos hoje, veio passando, compreensivelmente, por significativas mudanças. Em 1894, por exemplo, com a República proclamada, a consequente queda da Monarquia e a adoção do Presidencialismo, realizou-se no país a primeira eleição direta para presidente do executivo federal. Uma conquista, diga-se de passagem, sem ser ainda, no entanto, o voto um direito de todos. Nesse sentido, com tantas restrições, eram impedidos de votar menores de 21 anos, mulheres, analfabetos, mendigos, soldados rasos, indígenas e integrantes do clero.

Bem mais adiante, outro momento relevante se deu em 1932 com a instituição do voto feminino e do voto secreto e a criação do Tribunal Superior Eleitoral e dos Tribunais Regionais Eleitorais, tornando mais amplo, idôneo e transparente nosso processo de eleição.

Registre-se oportunamente aqui o nome da paulista Bertha Lutz (1894-1976), cientista, líder política e feminista. Bertha foi uma das pioneiras na luta pela conquista do voto da mulher e pela igualdade de direitos entre homens e mulheres. Em suas pregações, era enfática ao afirmar que “recusar à mulher igualdade de direitos do sexo é negar justiça à metade da população”.

Na vigência do Estado Novo (1937 a 1945), regime ditatorial também conhecido como o último momento da Era Vargas, nossas instituições democráticas foram duramente atingidas com a aplicação de medidas de repressão, tais como a extinção dos partidos políticos e o fechamento do Congresso Nacional, das assembleias estaduais e câmaras municipais. Nesse contexto de desequilíbrio, coube ao Executivo o controle efetivo sobre as demais instâncias do poder, ainda que tenha sido preservado o Judiciário.

Em 1945, como resultado do fim desses anos de autoritarismo, instituiu-se uma reforma constitucional que aprovava a realização de eleições em todo o país. Daqui até 1964. E então, a partir daí, teve início um longo e infeliz período de nossa história até 1985, e já com um novo processo de redemocratização do Brasil em curso. Nesses tempos de gradual abertura política, situa-se a Proposta de Emenda à Constituição nº 5, de 1983. Popularmente conhecida como Emenda Dante de Oliveira – seu autor, deputado federal – MT, falecido em 2006 aos 54 anos –, propunha a volta das eleições diretas para presidente. Em torno dessa PEC surgiu o “Diretas Já”, que se tornou um dos maiores movimentos populares ao mobilizar milhões de brasileiros pelas ruas das nossas maiores cidades. A junção de partidos políticos, representantes da sociedade civil, artistas e intelectuais de peso em favor das “Diretas Já” (ainda que elas só tenham ocorrido a partir de 1989) propiciou memoráveis espetáculos de cidadania em comícios e passeatas marcados por grande, espontâneo e indiscutível apelo popular.

“Nós queremos que se restaure no Brasil o preceito do artigo primeiro, parágrafo primeiro da Constituição Federal (de 1967, então em vigor): ‘Todo poder emana do povo e em seu nome deve ser exercido’. Esta é a minha mensagem. Este é o meu desejo. Este é o meu propósito”, assegurou o jurista Sobral Pinto (1893 - 1991), 90 anos, em discurso para o histórico comício de 10 de abril de 1984 e dizendo querer falar à nação brasileira através da multidão presente na Candelária (Rio de Janeiro), tomada por um milhão de pessoas.

Hoje, com a proximidade das eleições 2022, fica claro que vivemos outros tempos, com votações frequentes, confiáveis e garantidas pela lei. Evidente também que a democracia não se faz somente pelo voto, símbolo mais visível da soberania popular, mas sem ele e toda uma conjuntura que o mantenha ela não existe.

Finalizando, cito Margareth Thatcher (1925-2013), ex-primeira-ministra do Reino Unido, para quem “a democracia não é um sistema para garantir que os melhores sejam eleitos, mas, sim, para impedir que os ruins fiquem para sempre”.

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