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Viver emoções

12 de Dezembro de 2017, por Regina Coelho

“Sempre fui muito ligada às artes. Minha mãe é fotógrafa, e meu pai gostava muito de música. Lembro que a primeira vez que chorei de emoção tinha apenas 6 anos. Estava em um concerto com ele, em Brasília, ouvindo a Nona Sinfonia, de Beethoven. Eu disse ‘não estou triste’, preocupada de o meu pai achar que eu não estava gostando. Então ele me explicou o que eu estava sentindo.” É dessa forma que a atriz brasiliense Maeve Jinkings, 41, conta como chegou a experimentar o que talvez tenha sido seu primeiro grande momento de emoção e poder reconhecê-lo como tal com a ajuda do pai. Apenas a título de identificação: Maeve, com atuação frequente e expressiva no cinema e tendo iniciado carreira no teatro, demorou a ingressar na televisão. Sua estreia se deu na novela global A regra do jogo (2015/2016), de João Emanuel Carneiro. Nesse trabalho, deu vida a Domingas, uma mulher que vivia um relacionamento abusivo com o marido.

Falemos das emoções, esses sentimentos aflorados em nós por múltiplas razões. Falemos das emoções alegres, deixando de lado, por exemplo, aquelas em nome das quais se cometem crimes, como prevê a lei: “cometer crime sob o domínio de violenta emoção”. Por hoje também ficam dispensadas as emoções simplesmente tristes.

Momentos naturalmente emocionantes são vividos ao longo de uma vida, não necessariamente relacionados à realização de grandes sonhos ou façanhas. Surpreendentes como a própria vida, eles podem surgir de um pequeno gesto ou de algumas palavras ou ainda de um silêncio que diz tudo. Simples assim.

Como todo mundo, já passei e passo por bons momentos de intensa emoção. Além do plano particular, vivi, como professora, bonitas histórias. Destaco uma entre tantas. Em apresentação de um trabalho de literatura por uma turma de alunos do 3º ano do E.M. da E.E. Assis Resende, o desempenho deles foi espetacular, e a interação entre mim e eles, total. Isso já havia acontecido antes, com outras classes. O que me surpreendeu foi a reação dos alunos ao final da aula: de pé, eles me devolveram com um aplauso tudo o que certamente acharam que eu havia feito por eles. Naquele dia, entendi definitiva e emocionadamente que estava no meu lugar.

Gosto especialmente de duas passagens públicas ligadas à história do Brasil e carregadas de emoção. Cronologicamente, a primeira relaciona-se à inauguração de Brasília em 1960. Nos registros das comemorações de 20 de abril, véspera do dia oficial, consta que faltavam cinco minutos para a meia-noite, quando, aos olhos da multidão presente na Praça dos Três Poderes, o cardeal português dom Manuel Cerejeira, representante do papa João XXIII, deu início à celebração de uma missa solene. Terminada a celebração religiosa, ouviu-se em português uma saudação do Papa diretamente de Roma. Na primeira fila dos convidados, cobrindo o rosto com a mão direita, o presidente JK chorava copiosamente.

Um segundo momento memorável– Em 1997, na segunda visita do papa João Paulo II (hoje São João Paulo II) ao Brasil, Fafá de Belém roubou a cena por alguns instantes ao se apresentar para o Pontífice num Maracanã lotado. Na interpretação da linda Ave-Maria (de Vicente Paiva e Jaime Redondo), a cantora se mostrou inicialmente contida e concentrada. Não por muito tempo, dominada que foi por tudo o que sentia ao cantar. Comovida e provocando comoção aos que acompanhavam sua atuação também pela TV. E arrancando palmas do homenageado (já então debilitado fisicamente). O que veio a seguir foi inesquecível. Visivelmente emocionada e quebrando o rígido protocolo imposto pelo cerimonial daquele encontro, Fafá foi subindo uma escada que a levou até o Papa, abraçando-o, ajoelhando-se diante dele e beijando-lhe as mãos.

Final de 2017. Desejo aos leitores do JL ótimas emoções. Chorar de emoção? Só se for de alegria. Não sendo possível assim, que nos emocionemos também. E, nessa condição, que não nos faltem a força e a vontade para um sempre possível e emocionante recomeço.

Comentários

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    Prezada Regina, e que vivamos as emoções - as alegres e as tristes! Quando Fafá de Belém fez a homenagem ao então papa João Paulo II, eu estava diante da TV também tomado de emoção. Gosto muito da Fafá, principalmente dos trabalhos que ela tão bem desenvolveu na sua carreira até os anos 1990. E que tenhamos emoções, pois a vida é cheia delas! Agora em mais um fim de ano, termino aqui com suas palavras: "E, nessa condição, que não nos faltem a força e a vontade para um sempre possível e emocionante recomeço". Um grande abraço!!


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